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25/Jul/2025

Agro e as tarifas dos EUA: riscos e oportunidades

Quando o agro exporta, o mundo importa. E quando o mundo impõe tarifas, o agro sente. Sente de imediato. As tarifas anunciadas pelos Estados Unidos no dia 9 de julho ao Brasil não são apenas medidas técnicas. Elas carregam um claro conteúdo político, estratégico e, para quem acompanha os sinais, eram previsíveis. Abaixo, seguem dados concretos, impactos diretos para o agro e onde ainda é possível virar o jogo.

- Comércio Brasil-Estados Unidos em 2024

Os Estados Unidos seguem sendo o segundo maior parceiro comercial do Brasil, atrás apenas da China. Em 2024, o comércio bilateral atingiu aproximadamente US$ 92 bilhões. As exportações brasileiras aos EUA somaram US$ 42,3 bilhões. As importações dos EUA chegaram a US$ 49,7 bilhões, gerando saldo comercial deficitário ao Brasil de US$ 7,4 bilhões.

- O Agro brasileiro no centro da disputa

O café brasileiro movimentou em 2024 US$ 2 bilhões em exportações para os EUA. A carne bovina cresceu 85% em relação ao ano anterior. O suco de laranja somou US$ 1,3 bilhão, com os Estados Unidos absorvendo cerca de 42% do total exportado. Além desses, frango, açúcar, etanol, tabaco, madeira e celulose, frutas também são cadeias relevantes na pauta exportadora e, agora, estão expostos a um cenário mais hostil. A competitividade do agro brasileiro cai drasticamente quando o produto chega mais caro ao mercado de destino. E isso já está acontecendo.

- Impactos Imediatos

Redução de margem: as tarifas elevam o custo no destino e pressionam os lucros.

Escoamento comprometido: parte da produção pode simplesmente não encontrar comprador. O conceito de replacement, ou substituição de origem, até existe, mas não acompanha o mesmo volume e ritmo do mercado que foi perdido.

Pressão sobre os preços internos: o aumento da oferta doméstica gera desvalorização. Para o consumidor pode parecer vantagem no curto prazo, mas esse efeito é passageiro. O mercado se ajusta automaticamente e as famílias produtoras são como origem da cadeia os primeiros a sentir.

Risco sistêmico: contratos futuros, planejamento logístico, estoques e crédito rural entram em zona de incerteza.

Freio nos investimentos: com os números apertados, poucos se arriscam a expandir estrutura, contratar ou investir em inovação. O setor perde atratividade para o capital externo.

Medidas extremas: fechamento de linhas, férias coletivas e demissões já começam a surgir como resposta do próprio mercado.

- E onde estão as oportunidades?

Mesmo com o cenário adverso, existem caminhos para quem age com visão, estratégia e de forma coletiva.

1. Diversificação de destinos

Durante a guerra comercial entre Estados Unidos e China iniciada em 2018 e que durou 22 meses, vimos entidades norte-americanas imediatamente "irem a campo" ou naquele caso saírem do campo, em busca de novos mercados. Não esperaram ação do governo. Fizeram por conta própria. O Brasil deveria estar fazendo o mesmo. E em minha fala sempre motivei que isso se iniciasse lá atrás e recentemente desde a reeleição de Donald Trump. União Europeia, Oriente Médio, Sudeste Asiático e Norte da África são mercados que precisam ser ampliados. Mas também é hora de abrir novos mercados e resgatar a imagem junto a parceiros que nos enxergam com resistência. A Índia e a própria Europa, no contexto de relevância populacional e econômica e acordo com o Mercosul, respectivamente, merecem atenção. Delegações técnicas, missões empresariais e aproximação institucional devem ser prioridade. E isso tudo deve ser feito claro, sem repelir os atuais compradores dos nossos produtos. A dependência da China, que hoje responde por mais da metade das nossas exportações de soja e carne, também é um ponto de alerta. Qualquer interrupção abrupta por decisão sanitária ou política seria desastrosa. Especialista em mitigação de risco penso sempre que diversificar é proteger os riscos das operações e neste caso diplomacia técnica e comercial é uma ferramenta de peso.

2. Fortalecer a imagem internacional do Agro

Estamos avançando em rastreabilidade, protocolos sanitários e somos referência em boas práticas ambientais e mesmo sem consciência global somos case de sustentabilidade em todos os pilares, mas, infelizmente, ainda falhamos em comunicar isso de forma robusta e estratégica. Certificações e acesso a mercados premium devem ser prioridade. É hora de ampliar a fala que todos que estão no agro conhecem de cor e salteado e começar massivamente para o mundo.

3. Gestão de risco como cultura

Gestão de risco não é apenas proteger preços e garantir performance lucrativa. É desenvolver leitura de cenário, estruturar inteligência de mercado e criar protocolos colaborativos entre diversos players, como cooperativas, indústrias, exportadores e canais de distribuição e a gama de instituições e associações do setor.

- Diplomacia como Pilar de Desenvolvimento

Na esfera pública, é preciso que o Itamaraty deixe de ser um observador e passe a atuar como ferramenta de desenvolvimento econômico. A diplomacia deve apoiar ações privadas e abrir caminhos para o setor produtivo. Não se trata de ideologia, e sim de interesse nacional. Diplomacia é estratégia. E o Brasil precisa dela com urgência. Cobremos, afinal o cenário internacional mudou. Tarifas, protecionismo, eleições, conflitos e mudanças climáticas estão moldando o novo comércio global e ter um bom produto já não basta e alimentar o mundo e nutrir com carinho o discurso de segurança alimentar. É preciso estar bem-posicionado comercial e politicamente.

Como especialista em comercialização e risco no agro, acredito que semear estratégia é o único caminho para colher soberania. E isso precisa ser feito com urgência. Fonte: Andrea Cordeiro. Broadcast Agro.