16/Jul/2025
A Eurásia avalia que não há uma solução rápida nem fácil para a ameaça tarifária de 50% a produtos importados do Brasil pelos Estados Unidos, mas o melhor cenário seria ter mais tempo para negociar. O motivo da carta do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, ao Brasil se deu principalmente por três gatilhos: reunião do Brics; o contexto de que já estava enviando cartas tarifárias a outros países; e as falas do ex-presidente Jair Bolsonaro e deputado federal, Eduardo Bolsonaro. Sendo assim, motivos ligados à política. "Quando a família Bolsonaro vai até o presidente Trump e diz que o Brasil está vivendo um regime de censura, particularmente em um contexto em que redes sociais como o X enfrentam ações legais pelo Supremo Tribunal Federal, isso ecoa no movimento Make America Great Again (MAGA) e no presidente Trump em si. E o Brasil estava sediando a cúpula do Brics, que tem um pouco de inclinação para a China. Então a tempestade perfeita estava solta para uma relação bilateral fraca.
O presidente Lula não poderia resolver questões políticas envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro, que é réu em um processo por tentativa de golpe de Estado, e as redes sociais nem mesmo se quisessem, por estar no lado do Legislativo. Neste contexto, o anúncio de tarifas de 50% não foi totalmente surpreendente, mas um pouco. Principalmente considerando que no Liberation Day (2 de abril de 2025), Brasil não estava no foco de Trump. Do lado dos Estados Unidos, provavelmente há alguns itens que, por interesse próprio, o país desejaria que não fizessem parte da política tarifária de taxar produtos brasileiros em 50%. Provavelmente poderia isentar petróleo, minerais críticos, e alguns itens que consumidores dependem fortemente. 30% do café vem do Brasil, então pode ser que haja um processo de negociações para tirar alguns produtos dos 50% de tarifas. Por ora, a maioria dos bancos calcula um impacto de 0,2% a 0,3% no Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil pela política tarifária. Há risco de que Trump não se restrinja apenas a tarifas para penalizar o Brasil.
O ex-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento (NBD), o banco do Brics, Marcos Troyjo, considera que haverá mais engajamento da alta administração do governo Luiz Inácio Lula da Silva para aproximar as tarifas dos Estados Unidos para mais próximo do nível de 30%, que foi o colocado pela maior economia do mundo tanto para a União Europeia quanto para o México. O cenário atual é uma oportunidade interessante para o Brasil diversificar suas parcerias comerciais, considerando que agora a cada US$ 2,00 que o Brasil exporta, US$ 1,00 vai para a Ásia e a cada US$ 100,00 que o Brasil exporta, US$ 33,00 vai para a China e US$ 12,00 aos Estados Unidos. Ainda assim, a expectativa é de que Brasil e os EUA voltem a ter o relacionamento anterior, pois é uma perda de tempo e energia. O ex-secretário de Comércio Exterior e sócio-fundador da BMJ Consultoria, Welber Barral, avalia que o prazo para a adoção de tarifa de 50% dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros de 1º de agosto é "muito curto" para uma negociação substantiva entre os países. O que pode ocorrer é a postergação da medida, como foi com a China, ou concessão parcial.
Os Estados Unidos já firmaram acordos com Reino Unido, com China e com Vietnã para concessões ou prorrogações de medidas. Até agora, o Brasil tem a tarifa mais alta aplicada pelos Estados Unidos. Do ponto de vista negocial, o prazo é muito curto. A melhor opção para o Brasil é o que aconteceu com China e Coreia do Sul: suspensão de tarifas e prazo de 90 dias para negociação. Provavelmente haverá processo judicial movido pelos importadores norte-americanos, mas tende a ser um processo moroso em virtude das várias instâncias envolvidas. Mesmo que o Brasil tenha legalmente razão e os importadores de produtos brasileiros entrem na Justiça norte-americana, a solução é de médio e longo prazo. Barral lembrou também que os Estados Unidos têm superávit comercial com o Brasil há 15 anos. Ele destacou que as justificativas apresentadas por Trump foram a perseguição ao ex-presidente Jair Bolsonaro, o efeito do discurso Sul-Sul, os ataques à liberdade de expressão e uma argumentada relação comercial injusta. A maioria dos setores são afetados: café, frutas, carne e celulose, petroleiro, maquinário, carros e autopeças.
Welber Barral, afirmou que a tarifa de 50% dos Estados Unidos sobre produtos brasileiros a partir de 1º de agosto será de abrangência federal. A manifestação ocorre em meio ao movimento de alguns governadores de buscar tratativas isoladas com o governo norte-americano, a fim de negociar tratamentos especiais para seus Estados. A aplica-se contra a origem. Não tem como diferenciar a taxação entre Estados já que se trata de medidas adotadas contra o Brasil. Ele lembrou que a província de Ontário, no Canadá, tentou um movimento semelhante, que não avançou. Eles tentaram invocar essa possibilidade de exceção ao Estado, mas não foi levado adiante. Para Estados, há possibilidade de exceção apenas em medidas sanitárias e não tarifárias. Os governadores têm atuação mais limitada do que o governo federal. O governo federal tem muitos instrumentos que os Estados não têm, como acesso a dados da Receita Federal, dados dos importadores, informações da inteligência e da Embaixada. Os Estados não vão ter esse tipo de informação. É momento que deve haver união nacional, se não enfraquece a posição brasileira.
Welber Barral, destaca que a adoção de tarifa de 50% pelos Estados Unidos depende ainda de publicação de ato executivo da Presidência dos Estados Unidos. O Brasil provavelmente vai priorizar as negociações até 1º de agosto, um prazo muito curto, no qual evidentemente o Brasil pedirá concessões. Para que haja a medida contra o Brasil tem de haver o ato executivo da Presidência dos Estados Unidos que deve sair até 1º de agosto, normalmente valendo a partir da meia-noite do dia indicado, esclareceu. Barral citou as possibilidades das ações brasileiras em reação aos Estados Unidos durante o processo negocial. Entre eles apontou a insistência nas negociações e concessões; a retaliação pela lei de reciprocidade, podendo ser suspensão de direito de propriedade intelectual, restrição às importações e serviços e acordos internacionais; a busca pela diversificação de mercados; a aceleração de negociações comerciais e o acionamento da Organização Mundial do Comércio (OMC), que está com atuação inativa. O Brasil terá de fazer gestos ao governo norte-americano para prosseguir com a negociação. Um dos gestos é tarifas e acesso a mercados. Outro caso é de liberdade de expressão.
Segundo ele, as big techs podem estar por trás de muitas dessas medidas. A dinâmica dessas negociações comerciais sob a gestão do presidente Trump é "bem diferente" do usual. É uma negociação particularmente difícil porque envolve conotações pessoais do presidente Trump. Vários temas não estão sendo envolvidos e a palavra final tem sido do Trump. Há aposta do mercado financeiro norte-americano que ele vai ‘amarelar’ quando chegar 1º de agosto, porque o impacto inflacionário pode ser muito grande. Neste sentido, Barral observou que vários setores já foram excluídos das tarifas por pressão interna dos importadores, como automotivo e eletrônicos que receberam tratamento especial nas medidas. Houve movimento de empresas norte-americanas, o que levou à exclusão dos setores das ações tarifárias. É difícil saber como Trump toma decisão, pois são decisões muito erráticas ou por lobby de grupos específicos ou por percepções pessoais. Uma das medidas mais eficientes do governo brasileiro em resposta aos Estados Unidos é a ameaça de quebra de direitos de propriedade intelectual e de patentes, mas ao mesmo tempo é a mais perigosa.
Ameaça sobre propriedade intelectual é efetiva, mas é uma bomba atômica. Isso funcionou muito bem no contencioso do algodão (disputa que se estendeu de 2002 a 2014) quando Brasil mostrou que estava disposto a aplicar a suspensão dos direitos de propriedade, mas em contexto de um presidente imprevisível, como é Donald Trump, o Brasil tem de tomar cuidado com essa ameaça. A proteção à propriedade intelectual é um dos poucos direitos previstos na Constituição norte-americana e, por isso, tema sensível ao país. A palavra final é do Trump. É perigoso haver uma reação emocional nesse tema, ao mesmo tempo que o Brasil não tem onde negociar porque Trump está apontando uma situação do ex-presidente Jair Bolsonaro com jurisprudência do Judiciário. Barral, que liderou pelo lado do governo brasileiro as negociações do contencioso do algodão entre Brasil e Estados Unidos, afirmou que, na ocasião, o governo norte-americano se sentou para conversar com o governo brasileiro somente com a ameaça da quebra de patentes em 2009. É uma medida muito grave, que pode gerar um contencioso no Brasil, pode gerar mais retaliações e há risco de afastar investimentos ao Brasil.
Por outro lado, o Brasil não tem muito espaço para negociação a não ser em serviços e patentes. Esse precedente brasileiro pode gerar também a aposta para outros mercados em desenvolvimento. É uma medida muito perigosa, mas o Brasil não tem muitas alternativas porque retaliar em importação de bens de consumo pode elevar o custo para a indústria local. O governo avalia entre as respostas aos Estados Unidos antecipar o fim do período em que há direito de patentes dos fabricantes, sobretudo em patentes farmacêuticas, de medicamentos. No caso dos remédios, muitas vezes há direitos exclusivos concedidos a empresas que desenvolvem algumas substâncias e protegem seus produtos por algum tempo determinado, impedindo que terceiros façam a fabricação, a venda ou a distribuição da fórmula sem autorização. Há percepção de que a ameaça em patentes farmacêuticas é algo que possa ter um efeito muito grande. A indústria farmacêutica é o maior grupo de lobistas em Washington, com 800 lobistas.
O secretário de Assuntos Econômicos e Financeiros do Ministério das Relações Exteriores, Philip Fox, afirmou nesta terça-feira (15/07), que a Pasta seguirá a orientação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para buscar um entendimento com os Estados Unidos sobre as tarifas anunciadas por Donald Trump a produtos brasileiros. Porém, as ações seguirão a defesa da soberania e do interesse do Brasil. O presidente Lula já confirmou que o Brasil segue disposto a buscar um entendimento no campo econômico, pautado pela defesa da soberania e no interesse dos brasileiros. Esse objetivo seguirá orientando as ações do Itamaraty, do governo brasileiro como um todo, no relacionamento com os Estados Unidos. O Brasil e os Estados Unidos mantiveram conversas técnicas ao longo do ano, a fim de mitigar as tarifas de 10% anunciadas em março. As conversas foram mantidas até poucos dias antes do novo anúncio de 50%, feito na semana passada. O anúncio de Trump tem um inegável componente político. O Brasil tem alta atenção à relação comercial com os Estados Unidos, que têm levado vantagem no saldo de comércio com o Brasil. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.