11/Jul/2025
A imposição de tarifa de 50% sobre produtos brasileiros pelos Estados Unidos a partir de agosto pode deixar um excedente de carne bovina no mercado interno e pressionar os preços pagos aos pecuaristas, afirma o sócio-diretor da Cogo Inteligência em Agronegócio, Carlos Cogo. O impacto é potencializado pelo fato de que mais de 70% dos embarques da proteína ao mercado americano já superam a cota de 65 mil toneladas e enfrentam tarifa de 26,4%. Com o novo adicional, o custo por tonelada pode aumentar em até US$ 2.866, tornando inviável economicamente as exportações. A consultoria alerta que o volume redirecionado tende a ser negociado com menor rentabilidade e que a capacidade de substituição de mercado no curto prazo é limitada.
O Brasil exportou 181,5 mil toneladas de carne bovina para os EUA no primeiro semestre, o que representa cerca de 17% da receita agropecuária brasileira com o país no período. Cogo observa que esse deslocamento deve pressionar cotações internas e comprometer o escoamento nos Estados com perfil mais exportador. "O excedente no mercado doméstico pode derrubar preços", destaca o relatório, ressaltando que "o Brasil representa 60% das importações norte-americanas de carne bovina". A medida atinge o segundo maior destino da proteína nacional, já que os Estados Unidos consomem 13 milhões de toneladas anuais, mas produzem apenas 12,3 milhões, não sendo mais autossuficientes no abastecimento.
Produto Florestal
O relatório avalia que os impactos não se restringem à cadeia da carne. Produtos florestais, que lideraram as exportações agropecuárias do Brasil aos Estados Unidos em 2024 com US$ 3,72 bilhões, devem "perder competitividade imediatamente frente a Canadá, Chile e Europa", por causa do acréscimo de 50% no preço final. Madeira, celulose, papel e molduras de pinus correm risco de substituição nos contratos com a construção civil americana. "Empresas terão de intensificar esforços de diversificação de destinos, mirando Ásia, Europa e outros países da América Latina", projeta o documento. Empresas como Suzano, Klabin e Arauco podem ser forçadas a absorver parte do custo extra ou reduzir produção e investimentos, com impacto em empregos e renda nas Regiões Sul e Sudeste. A região Sul, responsável por 86,5% das exportações florestais para os Estados Unidos, pode sofrer "redução na produção, suspensão de investimentos e replanejamento logístico para outros mercados".
Setor Sucroenergético
A tarifa também atinge diretamente o setor sucroenergético. O etanol brasileiro poderá ficar até US$ 250 por mil litros mais caro, o que anula sua competitividade nos Estados Unidos, inclusive em programas estaduais de baixo carbono como o da Califórnia. "A tarifa de 50% pode representar um acréscimo de US$ 200 a US$ 250 por mil litros, tornando o etanol brasileiro praticamente não competitivo no mercado americano", aponta o relatório. O açúcar, mesmo dentro das cotas tarifárias, passará a enfrentar sobretaxa, o que ameaça o volume embarcado por unidades do Nordeste.
Café
Na cadeia do café, o aumento da alíquota de 10% para 50% compromete o fluxo de vendas ao principal mercado consumidor do mundo. O Brasil responde por mais de 30% das importações norte-americanas, e "a nova tarifa ameaça essa relação estratégica e pode encarecer o produto ao consumidor final". O novo custo pode ser repassado ao consumidor ou gerar perda de espaço para concorrentes como Colômbia e Honduras. "Os Estados Unidos são o maior mercado consumidor de café do mundo, com 24 milhões de sacas de 60 Kg anuais", destaca a análise.
Suco de laranja
A cadeia citrícola também terá impacto. A tarifa sobre o suco de laranja pode elevar o custo por tonelada para até US$ 2.260,00 contra os atuais US$ 723,00. Em 2024, o Brasil exportou 1,326 milhão de toneladas de sucos para os Estados Unidos, gerando US$ 1,193 bilhão. "O setor teme que a medida afete não apenas os exportadores brasileiros, mas também a indústria de sucos dos próprios Estados Unidos, que depende do Brasil como principal fornecedor", alerta o documento.
Além das tarifas, o relatório destaca a abertura da investigação comercial contra o Brasil com base na Seção 301 da Lei de Comércio de 1974. O procedimento permite aos Estados Unidos aplicarem sanções unilaterais, inclusive suspensão de benefícios comerciais e proibição de importações. "Se constatadas práticas injustificáveis ou que restringem o comércio americano, o governo pode impor sanções unilaterais", explica a análise. O processo deve durar até 12 meses, prorrogáveis, e envolve audiências públicas, consultas ao governo brasileiro e possível tramitação na OMC.
A medida contraria o argumento de Trump sobre "déficits comerciais insustentáveis", uma vez que "o Brasil só teve superávit comercial com os norte-americanos nos primeiros oito anos deste século, entre 2001 e 2008. A partir de então, são 17 anos consecutivos de saldo negativo nas trocas de mercadorias". A decisão é "amplamente interpretada como um gesto político, não comercial", motivada por tensões diplomáticas crescentes, incluindo críticas à atuação da Justiça brasileira contra Jair Bolsonaro e irritação com declarações de Lula sobre moedas locais durante a cúpula do Brics.
Cogo conclui que a ofensiva dos Estados Unidos contra o Brasil impõe "risco sistêmico à estrutura de exportação do agronegócio brasileiro". "O cenário demanda mobilização coordenada do governo e do setor privado para minimizar os efeitos adversos e buscar alternativas de negociação e cooperação internacional, protegendo a sustentabilidade das cadeias produtivas brasileiras e sua inserção global", recomenda o relatório. Fonte: Broadcast Agro.