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11/Jul/2025

Brasil vai precisar redirecionar suas exportações

A imposição de uma tarifa adicional de 50% sobre todos os produtos brasileiros exportados aos Estados Unidos, anunciada pelo presidente norte-americano Donald Trump, deve afetar diretamente a oferta e o destino da carne bovina, do suco de laranja e do café, os três principais produtos agropecuários vendidos pelo Brasil ao mercado norte-americano. Setores e analistas preveem perdas expressivas de receita, redirecionamento forçado de cargas e até inviabilidade das vendas ao principal destino de consumo desses alimentos. No mercado de café, o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) avalia que a medida afeta diretamente os consumidores e a própria economia dos Estados Unidos, o maior mercado mundial da bebida, com cerca de 24 milhões de sacas por ano. O Brasil é o principal fornecedor, com mais de 30% de participação. Quem vai ser onerado é o consumidor norte-americano.

De acordo com o último levantamento mensal do Cecafé, os Estados Unidos lideraram as importações do produto brasileiro de janeiro a maio, com 2.874.250 sacas de 60 quilos, o equivalente a 17,1% de todo o volume embarcado pelo País. O café é a bebida mais consumida nos Estados Unidos hoje, com 76% da população tomando café regularmente. A nova tarifa rompe a isonomia antes praticada entre exportadores como Brasil, Colômbia e Honduras (todos taxados em 10%), enquanto países como Vietnã, Indonésia e Nicarágua pagavam de 18% a 30%. Na avaliação do Rabobank, o aumento da tarifa também pode resultar em perda de espaço para concorrentes. O café brasileiro perde competitividade no mercado norte-americano, uma vez que o aumento de custos para os importadores tende a favorecer outros produtores. Países como Colômbia, Honduras, Etiópia e Vietnã devem se beneficiar da nova configuração, especialmente em um contexto de estoques globais apertados.

Apesar do impacto imediato, o Brasil exportou café para 107 países de janeiro a maio, o que pode facilitar a redistribuição de parte dos volumes caso o acesso ao mercado dos Estados Unidos permaneça restrito. No caso da carne bovina, a consultoria Agrifatto avalia que a nova tarifa torna "praticamente inviável" a exportação do produto aos Estados Unidos, elevando a carga tarifária total para cerca de 76%. A carne, vendida em média a US$ 5.727,00 por tonelada passaria a custar aproximadamente US$ 8.590,00 por tonelada. Os Estados Unidos foram o segundo principal destino da carne brasileira no primeiro semestre, com 181 mil toneladas embarcadas e US$ 1,04 bilhão em receita. O redirecionamento das exportações deve se concentrar em mercados como Argélia, China e Chile, mas há risco de excesso de oferta no mercado interno, pressionando o preço do boi gordo. A Austrália surge como a principal candidata a ocupar o espaço deixado pelo Brasil; exportou 202,8 mil toneladas aos Estados Unidos no primeiro semestre.

A Associação Brasileira das Indústrias Exportadoras de Carnes (Abiec), que representa os principais frigoríficos do País, classificou a medida como um entrave ao comércio internacional que pode comprometer o abastecimento global. Questões geopolíticas não devem se transformar em barreiras ao abastecimento. A consultoria Cogo Inteligência em Agronegócio também projeta excedente no mercado interno e queda nos preços pagos ao produtor. "O excedente no mercado doméstico pode derrubar preços", afirmou em relatório, acrescentando que haverá dificuldade de escoamento, especialmente nos Estados com perfil mais exportador. A Agrifatto corrobora: "os efeitos devem ser sentidos já a partir desta quinta-feira (10/07), tanto no mercado físico quanto no futuro, com pressão negativa sobre os preços." No setor de suco de laranja, a Associação Nacional dos Exportadores de Sucos Cítricos (CitrusBR) estima que a nova tarifa (somada à já existente de US$ 415,00 por tonelada) representa um aumento de 533% na tributação total, podendo consumir até 72% do valor do suco concentrado, com base na cotação de US$ 3.600,00 por tonelada.

Os Estados Unidos responderam por 41,7% dos embarques da safra 2024/25, que geraram US$ 1,31 bilhão em receita. Trata-se de uma condição insustentável para o setor, que não possui margem para absorver esse tipo de impacto. As consequências são graves: colheitas são interrompidas, o fluxo das fábricas é desorganizado e o comércio é paralisado diante da incerteza. Embora a União Europeia siga como o principal destino das exportações brasileiras, com 52% de participação na safra 2024/2025-, a CitrusBR avalia que o continente dificilmente conseguirá absorver os excedentes do mercado americano sem causar "grave deterioração de valor" para todo o setor. Na safra recém-encerrada, os embarques ao Japão recuaram 30%, para 19,3 mil toneladas, enquanto as exportações para a China despencaram 63,2%, totalizando 30,1 mil toneladas.

A tarifa de 50% vai impor a muitos exportadores brasileiros a dura missão de procurar mercados alternativos no exterior. É uma dor de cabeça que as empresas não tinham até quarta-feira (09/07). Pelo contrário: existia até uma perspectiva otimista de o tarifaço ajudar o Brasil na briga pelo mercado norte-americano contra concorrentes que pagariam tarifas mais altas, entre eles China e México. Para muitos exportadores do Brasil, a tarifa significa riscar os Estados Unidos do mapa e buscar novos consumidores. A China é um destino óbvio para os produtores de commodities, mas não para as fábricas de produtos manufaturados, que têm pouco a oferecer a uma indústria que produz de tudo e lida com excesso de capacidade por conta da crise imobiliária que já há anos assola o gigante asiático. A tendência é que as atenções se voltem ao Mercosul, assim como aos mercados com quem o bloco sul-americano tem ou costura acordos comerciais que permitiriam acesso privilegiado aos produtos brasileiros.

A lista inclui vizinhos da América Latina, como México, Chile, Colômbia e Peru, além da Índia, os países da Associação Europeia de Livre Comércio (Efta), Suíça, Noruega, Islândia e Liechtenstein, com quem o Mercosul concluiu negociações de livre comércio há uma semana, e claro, a União Europeia, cujo acordo está sendo finalizado. Mas não é uma substituição fácil. As dificuldades são de ordem tanto técnica quanto econômica. É preciso estabelecer novas relações, desbancar concorrentes, conquistar clientes e adaptar linhas de produção para atender especificidades de cada mercado. Em paralelo, a briga por clientes vai acontecer quando todos os outros parceiros comerciais dos Estados Unidos, incluindo a própria China, buscam mercados alternativos ao norte-americano. Nesse contexto de excesso de produção, será difícil para a indústria brasileira se manter no páreo sem enfrentar o custo Brasil, representado por juros e impostos altos, além de deficiências de infraestrutura.

Como muitas empresas brasileiras têm operações nos Estados Unidos ou são filiais de multinacionais norte-americanas, boa parte do comércio bilateral é intercompany, ou seja, entre companhias de um mesmo grupo, e complementar. Isso confere estabilidade e alguma resiliência às tarifas de Trump. Segundo o escritório Hondatar, a relação comercial, em alguns casos, não vai deixar de existir, só vai ficar mais cara. É possível que muitos exportadores decidam antecipar embarques. Ainda assim, a elevação tarifária representa um custo que dificilmente as empresas conseguirão repassar aos preços ou amortecer nas margens. Não à toa, a retomada das negociações entre os países em busca de um acordo para reverter a tarifa foi o caminho defendido por instituições como Fiesp, Amcham e Confederação Nacional da Indústria (CNI). A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) diz que a barreira de Trump chega em um momento em que o setor vinha trabalhando para aumentar a presença nos Estados Unidos. Com esse 'tarifaço', haverá um quadro de dificuldade de preservar o que foi conquistado e, obviamente, ao plano de expansão, que, se nada mudar, fica extremamente prejudicado. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.