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08/Jul/2025

Desmate zero exige cortar o crédito dos infratores

Frear o desmatamento, sobretudo na Amazônia, é prioridade do Brasil na luta climática global. O trabalho dos fiscais em campo é importante, mas especialistas defendem sufocar o problema na origem: cortar o dinheiro que financia o desmatador, com restrição de crédito rural e cobrança de altas indenizações nos tribunais. Para isso, o esforço conjunto deve mobilizar outros agentes, como gerentes de bancos, promotores e juízes. A cada ano, a vegetação nativa que vira pasto e lavoura representa quase metade das emissões nacionais de gases de efeito estufa. O desafio é fazer com que o avanço da agropecuária, um dos motores da economia brasileira, esteja baseado em práticas sustentáveis e na recuperação de áreas degradadas. O Brasil prevê zerar o desmatamento ilegal em todos os biomas até 2030, conforme a meta do governo federal no Acordo de Paris, pacto global contra o aquecimento do planeta.

Segundo o Instituto Talanoa, nos últimos meses, as taxas de destruição da Amazônia apresentaram tendência de alta. O controle do desmatamento é o fator mais decisivo para que o Brasil cumpra sua NDC (meta climática). Em novembro, Belém (PA) recebe a Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP30), em meio a dificuldades para obter consenso entre os países na agenda ambiental. Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o governo está na fase de acertar “o controle do ilegal” e “separar o que é legal e ilegal”. Essa distinção é um desafio principalmente no Cerrado, onde predominam terras privadas e não há controle centralizado das autorizações de desmate dadas pelos governos locais. Isso leva a um volume expressivo de desmates com aparente legalidade, mas que são, na verdade, ilegais. A meta climática do Brasil cita a necessidade “de incentivos econômicos positivos” para preservar as florestas em propriedades rurais privadas.

Um próximo passo é estimular mecanismos como linhas de crédito mais atrativas para produtores rurais que conservem acima do que é exigido por lei em suas propriedades, projetos de crédito de carbono e outros. O Ministério do Meio Ambiente diz ainda atuar na fiscalização direta, principalmente por meio de embargos, e na articulação com os governos locais. Novas normas miram ainda tornar mais rigorosa a concessão dessas autorizações, exigindo que o Cadastro Ambiental Rural (CAR) esteja regularizado, e obrigam seu lançamento no sistema federal, o Sinaflor. Para o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), é crucial que a agenda sustentável não se limite ao Ministério do Meio Ambiente, mas inclua outras alas do governo, como o Ministério da Agricultura, que está subsidiando a transformação de pasto em soja, não só na Amazônia, como no Cerrado.

O Ministério da Agricultura e Pecuária afirmou que a concessão do crédito está subordinada ao cumprimento de exigências legais, inclusive ambientais, e não subsidia práticas ilegais. No Plano Safra, lançado na semana passada, o Ministério da Agricultura incluiu incentivos financeiros para produtores que usam bioinsumos, conservem o solo, entre outras boas práticas. O Conselho Monetário Nacional adota, desde 2024, normas para restringir acesso a crédito para quem derruba árvores ilegalmente. Antes válida para proprietários de áreas embargadas pelo Ibama na Amazônia, a restrição agora se estende aos embargos estaduais, em todos os biomas, como Cerrado e Mata Atlântica. Tem muito mais gerente de banco que opera crédito rural no Brasil do que fiscal do Ibama. Então, todos precisam perguntar: ‘Tem desmatamento? Embargo? Se tem desmatamento, é preciso solicitar a autorização.

Desde 2023, o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) diz ter evitado que R$ 806,3 milhões de financiamento fossem para donos de propriedades rurais com indícios de desmate ilegal. A restrição também é adotada pelos bancos privados, em que o crédito rural tem subsídios do governo. A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) diz que o setor aplica as regras do Banco Central e assume compromissos voluntários. Segundo a entidade, o risco ambiental e climático é discutido há bastante tempo no setor bancário, porque se transforma em risco financeiro. Na verificação do cadastro ambiental rural, o banco avalia uma série de pré-requisitos do solicitante de crédito: se há embargo de áreas desmatadas ilegalmente; sobreposição com unidades de conservação, terras indígenas e quilombos; e autuação por trabalho análogo à escravidão. Se tem, a operação nem vai adiante.

A Febraban também destaca um protocolo especial para clientes da cadeia da carne, como matadouros e frigoríficos. É exigido que até o fim deste ano haja garantia de que o gado não venha de áreas de desmate ilegal. Esses compromissos são monitorados pela entidade e, se os bancos não cumprirem o prometido, estão sujeitos a investigações e sanções, como multas. Além das negativas de crédito rural, uma estratégia é aplicar sanções mais duras para grandes desmatadores reincidentes, como o bloqueio de bens e multas milionárias em ações judiciais, que calculam dano climático resultante da destruição. A estratégia, encabeçada desde 2023 pela Advocacia-Geral da União (AGU), busca não só desencorajar a derrubada, como financiar a restauração em larga escala de áreas devastadas por meio das indenizações. Em parceria com Ibama e ICMBio (órgão federal que cuida das unidades de conservação), a AGU prioriza propor ações civis públicas contra os maiores infratores, em todos os biomas, escolhendo alvos específicos em vez de atuar de forma massiva.

Segundo a Procuradoria Nacional de Defesa do Clima e do Meio Ambiente, percebeu-se que, com o bloqueio de bens, é possível de fato paralisar a atividade ilegal de maneira mais efetiva. Há ao menos duas ações do tipo em andamento. A primeira mira o pecuarista Dirceu Kruger, acusado de desmate ilegal de cerca de 5,6 mil hectares de floresta, em uma área em Boca do Acre e Lábrea, no Amazonas, de 2003 a 2016. Segundo a estimativa contida na ação, a derrubada com uso de fogo emitiu 901,6 mil toneladas de carbono na atmosfera. A Justiça Federal do Amazonas condenou o pecuarista em novembro de 2023 a reparar o dano estimado em R$ 292 milhões, e determinou bloqueio de seus bens nesse valor. O cálculo foi feito com base no custo social do carbono, índice estipulado pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) que precifica o impacto coletivo de cada tonelada adicional de gás carbônico despejada na atmosfera.

Outra ação em curso mira a reparação de sucessivas infrações ambientais que resultaram na perda de 7.075 hectares de vegetação na Floresta Nacional do Jamanxim, no Pará, uma das unidades de conservação mais desmatadas do País. O nome do infrator não foi divulgado. A quantidade de emissões provocada pela degradação na área foi estimada em 1.139.075 toneladas de carbono e os custos da reparação ambiental fixados em R$ 635 milhões. Foi a primeira ação por danos climáticos movida pelo ICMBio, sob representação da AGU. Agora, o desafio da AGU é garantir a implementação das decisões, trabalhando para que o dinheiro coletado “seja transformado em árvores”. Não adianta só entrar na Justiça, é preciso fechar o ciclo e implementar as medidas de restauração florestal. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.