08/Jul/2025
O estado do Pará lançou um novo modelo de concessão florestal para recuperar parte de uma área protegida convertida em pasto. A iniciativa será viabilizada pela venda de créditos de carbono e promete gerar emprego e renda para a população local. O projeto está inserido na Área de Proteção Ambiental (APA) Triunfo do Xingu, unidade de conservação mais desmatada da Amazônia Legal, entre as cidades de Altamira e São Félix do Xingu. A devastação é por grilagem de terra, avanço da pecuária, extração de madeira ilegal e, mais recentemente, fogo. Até 2024, a reserva estadual tinha perdido cerca de 48% de sua cobertura florestal original, segundo o monitoramento federal por satélites. A APA não é caso isolado: sede da Cúpula do Clima das Nações Unidas (COP30) em novembro, o Pará foi o 2º Estado que mais desmatou em 2024, apesar de redução de 15% em um ano, segundo o Mapbiomas.
A concessão de parte da reserva à iniciativa privada para reflorestamento, permitindo exploração de créditos de carbono e manejo sustentável das espécies, foi uma resposta estratégica ao avanço da grilagem e do desmatamento ilegal na região, diz a Secretaria Estadual de Meio Ambiente do Pará. A parcela destinada ao projeto ganhou o nome de Unidade de Recuperação Triunfo do Xingu (URTX) e foi concedida em março à empresa Systemica, que atua na região desde 2022, à frente de outro projeto de conservação. Uma das características interessantes das soluções baseadas na natureza é ter um negócio multireceita (apoiado) não só no crédito de carbono, como também na exploração sustentável de produtos como castanha, cacau e madeira, afirmou a Systemica. O governo estadual afirma ainda que fortaleceu a gestão ambiental da APA, com fiscalização, regularização fundiária e elaboração do plano de manejo da unidade.
Com prazo de até 40 anos, o projeto prevê recuperar 10,2 mil hectares de floresta (10 mil campos de futebol). Estima-se que a restauração deve capturar 3,7 milhões de toneladas de carbono, o que permite a venda de créditos. Eles garantem a rentabilidade para os investidores e a remuneração do poder público, que recebe R$ 150 mil na assinatura do contrato e pagamento variável de 6% da receita operacional bruta anual da concessão. O investimento privado foi estimado em R$ 258 milhões ao longo da concessão, e a expectativa de receita foi projetada em R$ 869 milhões. A Systemica identifica a oportunidade, estuda, estrutura e toma risco junto com investidores, vai até a comercialização do crédito carbono ou de um produto. Criada em 2006 entre o sul e o sudoeste do Pará, na região da Terra do Meio, a APA Triunfo do Xingu é uma das maiores do País, com cerca de 1,6 milhão de hectares.
Fica em um dos corredores ecológicos mais importantes da Amazônia, um mosaico de unidades de conservação e terras indígenas, que vêm sofrendo grande pressão do desmatamento e outros tipos de atividade ilegal ao longo das décadas. São Félix do Xingu, que tem 66% da área da APA, foi o epicentro das queimadas em 2024, além de ser o município com maior rebanho bovino do País. Altamira, onde fica a unidade de recuperação, esteve entre os que registraram maior desmate até 2022, e um dos municípios mais afetados pelo fogo em 2024. Segundo o Instituto Socioambiental, que atua na identificação de pressões e ameaças na Bacia do Xingu, a APA reflete fortemente o uso pecuário do território. A área concedida foi grilada e desmatada ilegalmente de 2017 a 2022, e depois reintegrada pelo poder público na Justiça.
Conforme a Secretaria de Meio Ambiente do Pará, a escolha do território como “piloto” foi baseada em critérios técnicos: alto grau de degradação, riscos de continuidade da perda florestal, viabilidade de restauração e importância ecológica da reserva. A Pasta afirma que fez o projeto com ampla participação: audiências públicas nos dois municípios em agosto de 2024, que tiveram participação de líderes comunitários, cooperativas, sindicatos de trabalhadores e produtores rurais. Segundo o governo estadual, duas novas concessões estão em estruturação, com previsão de alcançar 30 mil hectares restaurados. Após a assinatura do contrato, a concessionária tem prazo de 12 meses para apresentar um plano de restauração ao órgão responsável, o Instituto de Desenvolvimento Florestal e da Biodiversidade do Estado do Pará (Ideflor-Bio).
O documento vai detalhar as técnicas e espécies utilizadas e precisa ser aprovado pelo poder concedente para que os investimentos comecem. Segundo a Systemica, o plano vai combinar restauração passiva (em áreas onde a mata já está regenerando, usando técnicas para ajudar a natureza) e plantio direto, inclusive com uso de drone para enriquecimento do solo e dispersão de sementes. A infraestrutura necessária para o projeto será construída no ano que vem e a capacitação e contratação de mão de obra local para atuar nas cadeias produtivas florestais sustentáveis e dar início ao plantio será em 2027. O projeto promete criar até 2 mil empregos e, segundo o governo do Pará, a empresa deverá cumprir condicionantes sociais obrigatórias e manter diálogo permanente com as comunidades do entorno. A política de restauração por concessão também prevê participação da população local na receita gerada pela venda de créditos de carbono e serviços ambientais.
Conforme a empresa, parte do dinheiro vai para um fundo destinado a investir em ações desenvolvidas junto com a comunidade. O projeto está dentro de uma área pública que tem pequenos e grandes produtores rurais, populações tradicionais, indígenas, quilombolas e ribeirinhas ao redor. A ideia, na medida do possível, é trabalhar com essas comunidades, construindo com eles uma nova trajetória nesse território. O modelo de concessão florestal surgiu no País com a lei de gestão de florestas públicas, em 2006. Uma alteração na lei em 2023, porém, passou a permitir a concessão de áreas degradadas para a restauração florestal. Abriu a possibilidade de se instalar projetos de carbono em áreas de concessões florestais. Segundo o Imaflora, isso abre oportunidade tanto para conservação como para restauração florestal. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.