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07/Jul/2025

Agronegócio e o desenvolvimento socioeconômico

Nesse texto, discute-se brevemente o potencial do agronegócio como instrumento para o desenvolvimento socioeconômico do Brasil, focando na contribuição efetiva do setor nos últimos anos ou décadas. A visão clássica de desenvolvimento, que colocava o papel da agropecuária meramente como de um setor pilar para o crescimento industrial, tem sido questionada e ampliada, à medida que novos desafios globais se impuseram e que os próprios objetivos do desenvolvimento mudaram, passando para uma agenda multidimensional. Nesse contexto, o papel da agropecuária apenas como pilar para o crescimento industrial torna-se uma enorme subutilização de potencial, e a sociedade passa a esperar que esse setor contribua com diversas outras dimensões, como com a redução da pobreza e a segurança alimentar (e com a segurança dos alimentos); com o crescimento do PIB em regiões em estágios mais iniciais de desenvolvimento; com o uso eficiente dos recursos, liberando recursos escassos para uso por outros setores e para a preservação; com a prestação de diversos serviços ecossistêmicos; entre outros.

Antes de avançar com essa discussão, também deve-se considerar que uma frequente consequência do desenvolvimento dos países é um processo de transformação estrutural na economia em que a agropecuária perde dimensão relativamente, mas o agronegócio como um todo se expande, isso, no contexto em que os consumidores urbanos e com rendas maiores passam a demandar alimentos mais ricos em proteínas e produtos processados e mais convenientes, e em que o consumo alimentar se distancia espacialmente do local de produção. Esse processo foi marcante na história brasileira. Focando em um período mais recente, em 1950, o PIB agropecuário respondia por mais de 20% do PIB nacional; essa taxa declinou rapidamente entre 1950 e os anos 1990, tendo se estabilizado em cerca de 5,5%, em média, desde os anos 2000, conforme dados das Contas Nacionais do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

Pela perspectiva do emprego, de forma similar, dados dos Censos Agropecuários do IBGE apontam que 23,4 milhões de pessoas trabalhavam na agropecuária em 1985, 17,9 milhões em 1995, 16,5 milhões em 2006 e 15,1 milhões em 2017, com o setor perdendo espaço relativamente como empregador na economia. Em 2024, os dados do IBGE mostram que o PIB agropecuário representou 6,5% do nacional e que as ocupações na agropecuária representaram 8% do total de ocupações no Brasil. Para referência, a agropecuária representou 4,3% do PIB e 26% do emprego no mundo em 2022, conforme dados do Banco Mundial. Como esperado, o potencial de geração de PIB e empregos aumenta expressivamente quando considerado o agronegócio como um todo, a partir de dados do Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea), da Esalq/USP, e da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA). Usando esse conceito, se visa dimensionar o que é amplamente conhecido e explícito no caso do Brasil, de que a geração de renda e emprego pela agropecuária não se restringe ao que ocorre no campo.

Dados Cepea/CNA, consolidados para 2024, mostram que o PIB do agronegócio alcançou R$ 2,76 trilhões e que o setor gerou 28,2 milhões de empregos. Com isso, o agronegócio respondeu por 23,5% do PIB e 26% das ocupações do Brasil. Tem-se que, para cada R$ 1,00 de PIB agregado pela agropecuária, R$ 2,8 adicionais foram agregados fora da porteira por atividades industriais e de serviços vinculadas à agropecuária; e para cada emprego gerado no campo, outro 1,2 emprego foi gerado fora da porteira por essas atividades. Essa é uma medida do efeito multiplicador da agropecuária na nossa economia por uma perspectiva restrita às relações de encadeamento técnico que existem ao longo dos processos produtivos nas cadeias agropecuárias do agronegócio. Esses números supramencionados evidenciam o potencial do agronegócio no desenvolvimento socioeconômico no Brasil por uma perspectiva mais direta e agregada. Porém, outras dimensões relevantes devem ser consideradas.

Os próximos parágrafos abordam um aspecto acerca do papel do agronegócio: na interiorização do desenvolvimento socioeconômico. Em relação ao primeiro ponto, sabe-se que o PIB brasileiro é extremamente concentrado regionalmente. Dados das Contas Regionais do IBGE mostram que, em 2022, 30% do PIB nacional estava no estado de São Paulo e quase 70% do PIB nacional estava em apenas seis Estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Paraná, Rio Grande de Sul e Santa Catarina. Como já mencionado, a agropecuária atualmente representa uma parcela pequena do PIB brasileiro quando analisada isoladamente, o que limita em alguma medida o seu potencial de impulsionar o crescimento econômico brasileiro como um todo. Contudo, há enorme potencial de impulsionar o crescimento em algumas regiões, algo que tem ocorrido intensamente nas últimas décadas.

A partir de dados das Contas Regionais do IBGE, foi observada uma importante correlação entre o desempenho econômico regional e estadual e a contribuição da agropecuária para esse desempenho. De 2002 a 2022, entre os 11 Estados com maiores avanços no PIB, apenas em dois, Amazonas e Amapá, não houve um impulso relevante no PIB vindo da agropecuária. Tomando-se Mato Grosso como exemplo: esse Estado ainda têm uma economia embasada na agropecuária. E, considerando o avanço de 325,8% no PIB agropecuário do Estado, o PIB total desse Estado pôde crescer expressivos 146,1% no período, quase três vezes o crescimento médio do PIB brasileiro, que foi de 50,4%. 48,2% do crescimento do PIB de Mato Grosso foi atribuído diretamente ao crescimento da agropecuária: entre 2002 e 2022, o PIB total do Estado, em volume, cresceu R$ 137 bilhões (a preços de 2022); no mesmo período e mesma medida, o PIB agropecuário do estado cresceu R$ 66 bilhões, ou seja, quase metade de todo o crescimento econômico do estado no período veio diretamente da agropecuária.

Nota-se que a contribuição da agropecuária foi determinante para grande parte dos Estados que tiveram melhor desempenho econômico no período analisado. Além desse efeito direto, o crescimento e dinamismo da agropecuária no interior do Brasil podem ainda desencadear ciclos virtuosos. Isso porque, produções agropecuárias dinâmicas influenciam o nível de integração dessa produção com os segmentos a montante e a jusante, proporcionando um estímulo para o desenvolvimento local, principalmente, mas não exclusivamente, de indústrias de insumos agrícolas, agroindústrias e atividades de agrosserviços por meio da geração de emprego e renda. As indústrias processadoras de alimentos, por exemplo, apresentam potencial interessante de geração de empregos no interior, pois, além de serem intensivas em trabalho, há incentivos, do ponto de vista logístico, para que essas se localizem mais proximamente às áreas rurais dada a dependência das matérias primas agropecuárias e, portanto, sejam espacialmente dispersas e alcancem os locais mais pobres dos países.

Utilizando a definição Cepea/CNA de agroindústria, e dados de emprego formal da Relação Anual de Informações Sociais (RAIS) do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), dados que permitem desagregação municipal, tem-se que as agroindústrias geraram 4,1 milhões de empregos formais em 2023. O crescimento frente a 2006 foi de 31%, com destaque para a Região Centro-Oeste: nessa região, o número de empregos formais agroindustriais cresceu 60% no período, passando de 307 mil para 490,8 mil trabalhadores. Trata-se de um importante exemplo do impacto do dinamismo da agropecuária regional na geração de empregos fora da porteira, favorecendo a interiorização do desenvolvimento. Embora os empregos agroindustriais ainda sejam concentrados espacialmente nas Regiões Sudeste e Sul do País (38,1% e 31,5% do total em 2023, respectivamente), essa concentração regional é menor que a observada na indústria de transformação não agropecuária.

No caso da indústria de transformação sem base agropecuária, 52,5% dos empregos estão concentrados na Região Sudeste, ao passo que os empregos agroindustriais estão relativamente mais dispersos espacialmente. Também chama a atenção que, embora no agregado brasileiro a agroindústria represente 37% dos empregos da indústria de transformação, essa taxa chega a 60% no Centro-Oeste e a 45% na Região Norte. Esses dados contribuem para demonstrar a importância do agronegócio para interiorização do desenvolvimento econômico no Brasil e, então, para uma distribuição mais equilibrada das oportunidades de crescimento pelo vasto território nacional. Esse efeito se dá pelo próprio dinamismo da agropecuária, mas também pelo efeito multiplicador relacionado aos encadeamentos produtivos do agronegócio. Fonte: Nicole Rennó Castro. Cepea.