28/Apr/2025
Entre enfrentar as tarifas recíprocas ou ceder às demandas do governo Donald Trump, alguns países tentam uma terceira alternativa: ampliar acordos bilaterais ou multilaterais para mitigar as novas políticas dos Estados Unidos. Na visão de analistas do Brasil e do exterior, tanto acordos comerciais já em discussão quanto novas parcerias devem ganhar mais tração ao redor do globo em reação ao tarifaço dos Estados Unidos. O presidente da China, Xi Jinping, afirmou que está disposto a trabalhar com outras nações para defender as regras do comércio internacional, a imparcialidade e a justiça, em referência velada às políticas norte-americanas. Ele tem dito que não há vencedores em guerras tarifárias e comerciais em seu tour pelo Sudeste Asiático ao reforçar laços com o Vietnã, Indonésia e outros países da região. O líder chinês também reiterou compromisso de cooperação com a África. Os comentários demonstram a postura da China de combater diretamente as tentativas dos Estados Unidos de isolar a potência asiática e buscar uma aproximação com outros países.
O Ministério do Comércio da China emitiu um alerta na semana passada para que todos os países evitem acordos comerciais "às custas dos interesses" do China, prometendo responder com determinação e medidas recíprocas, em postura que fez lembrar as ameaças recentes de Donald Trump. O governo de Xi também anunciou medidas para estimular o comércio exterior e acelerar a economia. O Instituto de Finanças Internacionais (IIF) acredita que as novas políticas comerciais forçam o mundo a ser mais integrado. O que a política de Donald Trump está fazendo é ajudar os países a se acharem, então, no fundo, os Estados Unidos estão dando um passo atrás na integração, e no ponto tarifa, estão forçando o mundo a ser mais integrado entre si, o que é muito ruim para a economia norte-americana. A União Europeia, por exemplo, corre para fechar o acordo com o Mercosul. Para especialistas, a bagunça comercial deflagrada pelos Estados Unidos aumenta o ímpeto principalmente para que a União Europeia vença a resistência francesa e finalize de forma mais rápida o acordo com o Mercosul.
Na última semana, o comissário europeu de Economia e Indústria, Valdis Dombrovskis, e o dirigente do Banco Central Europeu (BCE) Olli Rehn defenderam que a ratificação do acordo com o Mercosul deve ser o próximo passo da Europa e que deve ser concluído em breve. O BCE lembrou que os Estados Unidos são um importante parceiro comercial da Europa, mas "não o único". A China ofereceu retirar sanções contra a União Europeia para retomar acordo de investimentos e mercado aberto. O ministro das Relações Exteriores da China, Wang Yi, também reafirmou o compromisso em acelerar a atualização do acordo de livre-comércio com a Suíça. O aprofundamento das relações entre a China e outros países asiáticos, incluindo Japão e Coreia do Sul, e o início de negociações com a Europa não teriam acontecido em outro cenário. Possíveis parcerias que podem ser aceleradas pelo tarifaço de Trump ficaram em evidência nas reuniões de Primavera do Fundo Monetário Internacional (FMI) e do Banco Mundial, realizadas em Washington, na semana passada.
A BRCG Consultoria vê a movimentação por novos acordos comerciais como uma "reorganização do tabuleiro global", que pode transformar e regionalizar as relações entre os países. Não é o fim do multilateralismo ou uma promoção dele, é algo diferente. O Deutsche Bank explica que o objetivo dos acordos é minimizar perdas, melhorar a posição de negociação e aumentar a resiliência de cadeias de oferta, e não atingir diretamente os Estados Unidos. Por outro lado, um isolamento comercial pode ser prejudicial para a economia norte-americana no futuro por retirar o poder de barganha dos Estados Unidos. A ministra das Finanças do Reino Unido, Rachel Reeves, admitiu que "nem sempre concorda com as políticas" dos Estados Unidos, mas busca alcançar um acordo que reduza a barreira entre os dois países. O país também negocia um acordo de livre comércio com a Índia e busca reaproximação com a China e com a União Europeia. Rachel Reeves afirmou que os laços comerciais do Reino Unido com a União Europeia são "ainda mais importantes" do que os com os Estados Unidos em meio a tensões globais sobre tarifas.
Apesar do foco nas negociações tarifárias com os Estados Unidos, Reeves enfatizou a importância da relação com a Europa: "Teremos uma cúpula Reino Unido-UE no mês que vem, resultado do trabalho para reconstruir a confiança". Ela mencionou reuniões recentes com ministros da França, Alemanha e outros países europeus, sinalizando uma reaproximação pragmática. Em meio à turbulência global, o Reino Unido pode oferecer estabilidade política, financeira e fiscal. Questionada sobre as tarifas de 10% impostas pelos Estados Unidos a produtos britânicos, incluindo aço e automóveis, Reeves ponderou que Donald Trump foi eleito com um mandato para aumentar tarifas. Agora, é preciso tentar reduzir essas barreiras. Ela destacou que o comércio bilateral é equilibrado e que as medidas norte-americanas são "desnecessárias". Para o Banco Inter, a tendência de países se afastarem de uma postura protecionista em benefício de acordos mais vantajosos deve persistir mesmo que Donald Trump retire todas as tarifas. Mas, os danos causados pelo comportamento errático do republicano nas relações internacionais levarão tempo para serem reparados.
Em jantar do G20 na semana passada, o secretário do Tesouro dos Estados Unidos, Scott Bessent, ouviu uma série de reclamações sobre as novas políticas norte-americanas que o fez deixar a reunião antes de acabar. O mesmo aconteceu em um encontro com investidores organizado pelo JPMorgan. Apesar de ter recuado nas tarifas, com a pausa de 90 dias, Donald Trump tem reforçado a convicção de que as medidas são necessárias para reposicionar os Estados Unidos no comércio global e reverter "injustiças" de anos. Em entrevista à revista Time, afirmou que será uma "vitória total" se as tarifas médias sobre produtos importados pelos Estados Unidos forem de 50% daqui um ano. Ainda assim, seria o dobro da alíquota atual, estimada em cerca de 25%. Ainda, a Fitch avalia que a postura protecionista dos Estados Unidos muito mais agressiva do que o esperado anteriormente altera as premissas macroeconômicas e reformula o ambiente de risco de crédito global. Os riscos de recessão, estagflação e volatilidade do mercado de capitais nos Estados Unidos se tornaram mais agudos.
O cenário traz incógnitas para a capacidade de gerenciamento pelas empresas de interrupções nas cadeias de suprimentos globais. Outro desafio é quanto à manutenção de margens com custos de insumos mais altos. As implicações dos efeitos inflacionários na demanda e os efeitos nas condições de financiamento decorrentes do enfraquecimento da confiança dos investidores também são outras mudanças. A incerteza em torno da política comercial dos Estados Unidos, dadas as isenções e retiradas de medidas anunciadas inicialmente, também prejudicará o investimento e pesará sobre o crescimento e o apetite ao risco dos investidores. Os mercados emergentes enfrentam uma confluência de riscos dos efeitos diretos das tarifas e dos efeitos indiretos da desaceleração do crescimento global. A queda nos preços das commodities, o aperto das condições de financiamento e a redução dos orçamentos de ajuda externa aumentarão os desafios. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.