04/Apr/2025
De Wall Street a Faria Lima, bancos e consultorias receberam com alívio as tarifas recíprocas de 10% que serão impostas pelo governo norte-americano a produtos brasileiros. A leitura, praticamente generalizada, é a de que "poderia ser pior", considerando que outras economias, em especial, China, União Europeia e Japão, vão ter de pagar bem mais para colocar seus produtos nos Estados Unidos. Assim, é possível que o Brasil até ganhe competitividade e consiga movimentar algumas peças a seu favor no novo xadrez do comércio internacional, que ganhou mais um capítulo com o "tarifaço" anunciado pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. Essa percepção positiva dos analistas não foi abraçada, porém, nem pelo governo nem por parte do setor produtivo. Os posicionamentos divulgados após o anúncio expressaram preocupação e lamentação. Em nota conjunta do Itamaraty e do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), o Brasil julgou que Donald Trump violou os compromissos assumidos pelos Estados Unidos perante a Organização Mundial do Comércio (OMC), a quem o governo brasileiro não descarta recorrer.
Além de defender que o Brasil insista no diálogo com o governo norte-americano, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) informou que uma missão de empresários do setor visitará os Estados Unidos na primeira quinzena de maio, com o objetivo de estreitar laços e buscar soluções de interesse comum. Ao ser taxado em 10%, o Brasil integrou o grupo dos países menos afetados pelo tarifaço. Estão ao seu lado economias como a do Reino Unido, Chile, Austrália, Colômbia, Turquia, Argentina, Peru, dentre outros. As novas alíquotas entram em vigor no sábado, dia 5 de abril. A percepção é de que funcionou a aproximação do vice-presidente e ministro da Indústria, Geraldo Alckmin, ao secretário de Comércio dos Estados Unidos, Howard Lutnick. Foi um mérito do governo, principalmente do Alckmin, que teve duas reuniões com o Howard Lutnick. Os Estados Unidos falavam muito sobre taxar o etanol. Então, para o Brasil acabou saindo menos ruim do que podia ser.
O escritório Arnold & Porter considera que 10% são um percentual "bastante baixo". Os Estados Unidos estão propondo um rearranjo do comércio internacional bastante significativo, o que pode beneficiar o Brasil. O Brasil pode se beneficiar em mercados em que concorre com os Estados Unidos, uma vez que os países atingidos vão impor tarifas retaliatórias, como, por exemplo, na agricultura. Outro movimento que pode ser positivo para o País vem da reorganização das cadeias de suprimentos globais, com o Brasil atraindo empresas por ter uma alíquota menor que outras nações, como, por exemplo, a China, taxada em 34%. O Brasil vai eventualmente conquistar mercados novos ou ampliar a sua atuação. Isso já aconteceu no passado: o Brasil aumentou a participação em proteína animal, e deve acontecer de novo, o que pode ser benéfico para o Brasil. De acordo com o Barclays, o Brasil pode sofrer mais pelo impacto de tarifas recíprocas a outros países na economia mundial. Talvez, o efeito indireto seja maior do que o direto no sentido da desaceleração da economia global, principalmente da China.
Isso pode vir a machucar mais o Brasil. Depois de semanas de apreensão, o anúncio das tarifas dos Estados Unidos sobre importações acabou sendo recebido com alívio no Brasil. A associação das empresas que realizam comércio exterior, seja com exportações ou importações, por exemplo, considerou, de certa forma, positivo o anúncio de que o Brasil ficou no piso das tarifas recíprocas. A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) afirmou estar aliviada, porque o percentual veio menor do que o imaginado, ainda que maior do que seria adequado. Diante das tarifas mais altas a concorrentes, é possível que o “tarifaço” de Donald Trump melhore a competitividade dos produtos brasileiros no mercado norte-americano. Uma das possibilidades é as matrizes dos Estados Unidos importarem mais de suas filiais do Brasil, dentro das operações comerciais “intercompany”. No entanto, é preciso reduzir o custo de produção no Brasil para que isso se torne uma realidade para um maior número de produtos da indústria de transformação, os manufaturados.
Teoricamente, ajuda na competitividade, mas o problema não é nos Estados Unidos, e sim no Brasil. O “custo Brasil” é muito alto, o que prejudica a competitividade. Na avaliação do ex-secretário de Comércio Exterior Welber Barral, eventuais ganhos de competitividade do Brasil nos Estados Unidos, em razão da maior alíquota sobre grandes concorrentes, terão de ser analisados produto a produto. Ele coloca como contraponto o fato de aço e alumínio, dois itens que têm grande participação nas exportações destinada aos Estados Unidos, terem recebido tarifas de 25%, na primeira ação da política comercial de Donald Trump que atingiu o Brasil. Então, é preciso fazer uma análise caso a caso para saber se o Brasil pode ganhar em algum mercado, principalmente nos que concorre com a Europa e Japão. O Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE) também considerou que a taxação de 10% para as exportações brasileiras foi até um certo alívio. Não deve haver grandes impactos para o setor de petróleo no País, já que há algum tempo os Estados Unidos deixaram de ser o grande comprador do petróleo brasileiro.
Segundo a Federação do Comércio, Bens, Serviços e Turismo do Estado de São Paulo (FecomercioSP), a taxação em 10%, média de produtos brasileiros que se propuserem a disputar o mercado consumidor dos Estados Unidos não deixa de ser lamentável do ponto de vista global, mas deve beneficiar a inserção global brasileira. Para o Brasil, as notícias não são tão ruins já que muitas nações terão dificuldades em levar seus produtos aos Estados Unidos. O governo brasileiro deve se valer da conjuntura tarifária vinda dos Estados unidos para assinar acordos bilaterais, diminuir tarifas e facilitar mecanismos aduaneiros. A Fecomércio considera que o Brasil deveria aproveitar o momento para ampliar suas relações comerciais, sobretudo, no Japão, na China e na União Europeia. A elevação das tarifas sobre bens básicos, por exemplo, deve desencadear uma inflação generalizada nos preços do mercado interno dos Estados Unidos, enquanto as medidas sobre as importações de aço impactarão toda a cadeia dependente dessa matéria-prima. Sem contar algumas commodities essenciais que, mais caras, vão afetar diretamente o orçamento das famílias de baixa renda.
Segundo o Centro Insper Agro Global, se as tarifas anunciadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, forem cumulativas, tornará os Estados Unidos uma das economias mais fechadas do mundo. Será uma mudança de paradigma. Até agora, era um dos países com economia mais aberta, com tarifa média de importação de 2,5% para todos os produtos. Havia alguns produtos sobretaxados e que podem agora ter tarifas adicionais. Ainda há dúvidas, porém, no setor agropecuário brasileiro, se as tarifas serão cumulativas sobre as já existentes ou não. A forte taxação da China deve fazer com que o gigante asiático retalie os Estados Unidos, o que pode beneficiar o Brasil, a depender dos produtos selecionados pelos chineses nesta guerra comercial. Atualmente, a tarifa aplicada pelos Estados Unidos à China é de 20%. Caso a taxação anunciada for cumulativa, vai para mais de 50%.
Se a China retaliar, tarifando a carne bovina dos Estados Unidos, por exemplo, pode vir buscar mais carne no Brasil. A China vai escolher alguns produtos e aplicar o mesmo tipo de tarifa aos Estados Unidos, e isso pode abrir mercado para o Brasil, que vai ganhar espaço. Porém, a China não deve aplicar tarifas retaliatórias sobre todas as importações dos Estados Unidos. No geral, ela deve escolher alguns setores. Ainda em relação à carne bovina, o setor pecuário nos Estados Unidos está no pior momento dos últimos 60 anos em relação ao volume de abates. Mesmo que a ideia de Donald Trump, ao aplicar as tarifas, seja estimular a reindustrialização do país, isso não vai mudar a situação da pecuária tão cedo. E uma tarifa adicional de 10% sobre a carne brasileira vai tornar o produto mais caro nos Estados Unidos, pelo menos por enquanto.
A XP considerou as novas tarifas recíprocas, anunciadas pelos Estados Unidos como negativas em termos absolutos, mas potencialmente positivas para o Brasil, já que setores exportadores de commodities, como o agronegócio, podem se beneficiar de uma guerra comercial, além de haver uma expectativa de aumento nos investimentos chineses em infraestrutura no Brasil e na América Latina. A tarifa imposta ao Brasil foi mais branda do que as direcionadas a outros países. No entanto, permanecem riscos relevantes, como a tarifa base de 10% sobre todas as importações, que pode afetar importantes produtos exportados para os Estados Unidos. Há risco de barreiras comerciais derivadas do fortalecimento da relação estratégica entre Brasil e China, além da possibilidade de que uma guerra comercial prolongada gere uma desaceleração mais aguda da economia norte-americana e global, o que seria um fator negativo para ativos de risco em geral, inclusive os brasileiros.
Esse contexto favorece a produção baseada nos Estados Unidos, proteções contra inflação, exposição a exportadoras (caso o excepcionalismo norte-americano persista) e a certos exportadores de grãos. Entre 2018 e 2020, durante a guerra comercial com a China, a demanda chinesa por commodities migrou dos Estados Unidos para o Brasil, favorecendo produtos como soja e milho. Além disso, desde 2000, a China aumentou significativamente seu investimento estrangeiro direto na região, com taxa de crescimento anual composta de 16,3% em 20 anos, e com US$ 73,3 bi em investimentos em infraestrutura no Brasil entre 2007 e 2023, segundo o Conselho Empresarial Brasil-China. Para o BTG Pactual, as tarifas anunciadas pelos Estados Unidos podem provocar uma guerra comercial com efeitos negativos sobre a economia global, mas o Brasil deve ser menos prejudicado que os outros países.
A taxa-base de 10% ficou abaixo do que foi imposto a diversos outros países. Para o Brasil, é um cenário menos desfavorável do que muitos temiam. Alguns produtos brasileiros podem perder competitividade nos Estados Unidos em função das tarifas, mas em alguns casos a política tarifária americana pode beneficiar os produtos do Brasil. Como as tarifas para outros países tiveram aumento maior, determinados segmentos do Brasil podem ganhar competitividade relativa. Além disso, setores de commodities podem se beneficiar se conquistarem parte de mercados que os Estados Unidos eventualmente percam, caso sofram retaliações de seus parceiros comerciais.
A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (ApexBrasil) acredita que o Brasil não deve focar em qual vantagem pode ter com o novo pacote de tarifas dos Estados Unidos. Não há vantagem nenhuma quando o mundo pode piorar a relação comercial. O presidente Lula é adepto do multilateralismo. Há interdependência na pauta comercial entre Brasil e Estados Unidos, caso da carne bovina, que é comercializada para produção de hambúrguer nos Estados Unidos. A agenda do Brasil com os Estados Unidos é muito boa, com produtos de alto valor agregado. Para a China, três produtos brasileiros respondem por 80% dos US$ 100 bilhões exportados anualmente pelo Brasil para o país asiático, sendo soja, petróleo e minério de ferro.
São commodities que agregam valor na China. A exportação do Brasil para os Estados Unidos é muito diversificada, sendo que 30 produtos respondem por 80% dos US$ 40 bilhões exportados. Do ponto de vista de agregação de valor, a pauta do Brasil com os Estados Unidos é semelhante à que o País tinha com a Argentina. Em relação aos impactos nas cadeias produtivas e na balança comercial brasileira com a sobretaxa de 10% à alíquota do imposto de importação atual a ser adotada pelos Estados Unidos sobre os produtos importados do Brasil, é preciso aguardar a implementação para avaliar os efeitos. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.