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24/Feb/2025

Brasil: negociação é alternativa para lidar com EUA

Apesar da ameaça do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, apelar à Organização Mundial do Comércio (OMC) contra as medidas de Donald Trump não deverá ser uma via prioritária do governo na nova era trumpista. A resolução de disputas pela instituição internacional permanece paralisada, ainda sob as consequências do primeiro mandato do republicano. Embora Lula já tenha afirmado que pode recorrer ao órgão e retaliar os Estados Unidos se o país taxar produtos brasileiros, membros do governo reconhecem que o caminho não funcionará diante do esvaziamento da OMC. A situação deixa o Brasil, assim como outros países-membros da organização, sem opção viável de enfrentar as tarifas dos Estados Unidos pela mediação internacional. Com isso, a negociação bilateral é reforçada como o caminho mais adequado para o País reduzir os danos do tarifaço. O vice-presidente Geraldo Alckmin voltou a dizer que vê espaço para dialogar com a gestão do republicano.

O golpe de Donald Trump no multilateralismo comercial foi duplo. De um lado, passou a adotar medidas questionáveis desde seu primeiro mandato, que começou em 2017 e acabou no começo de 2021. De outro, penalizou a organização que seria capaz de fazer frente a essas ações. Parte importante da OMC está travada desde 2019 porque o presidente norte-americano bloqueou a indicação de juízes necessários para o pleno funcionamento da instituição. Embora Donald Trump tenha intensificado os ataques à OMC, a gestão do democrata Joe Biden, que o sucedeu até o início deste ano, manteve essa paralisia, o que foi alvo de consecutivas reclamações de membros da OMC, incluindo o Brasil. Quando um país aciona a organização para contestar uma prática comercial de um parceiro, o pleito é analisado por um painel. Os integrantes desse painel avaliam o caso e geram uma recomendação, que pode dar razão a quem recorreu à instituição e autorizar, por exemplo, a aplicação de medidas de retaliação pelo país atingido.

Mas, na prática, a decisão só tem efeitos com a palavra final do órgão de apelação da OMC. Esse colegiado é composto por sete juízes, nomeados a partir de um consenso entre os países-membros. Para funcionar, precisa de ao menos três integrantes. Em 2019, contudo, novas indicações para o órgão de apelação foram bloqueadas pelos Estados Unidos, deixando a instância sem quórum suficiente. Não há um órgão de apelação para autorizar, por exemplo, as sanções ao país contestado ou a represália que eventualmente o país afetado possa tomar. Precisa do órgão de apelação para que ele imponha a decisão final. Integrantes do governo brasileiro admitem que, no cenário atual, apelar à OMC não trará resultados práticos para o Brasil. Esse instrumento não está à disposição no momento. No estado em que se encontra a organização, a via adequada é a da negociação. Na quinta-feira (20/02), o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, teve reunião bilateral com a Diretora-Geral da OMC, Ngozi Okonjo-Iweala, em Joanesburgo, África do Sul.

O Palácio Itamaraty afirma que ambos discutiram sobre a necessidade de um processo de reforma do sistema multilateral de comércio. A OMC foi criada em 1995, após os países entenderem que era necessário institucionalizar o conjunto de regras previstas no chamado Acordo Geral de Tarifas e Comércio (GATT), desenhado no pós-guerra e assinado em 1947. Embora tenha sido construída com a liderança dos Estados Unidos nas negociações, a organização já é alvo de críticas dos norte-americanos desde a gestão de Barack Obama. Avesso ao multilateralismo, Donald Trump turbinou a antipatia a ponto de paralisar e inviabilizar a resolução das disputas. Na primeira administração Trump, os Estados Unidos começaram a questionar uma série de fatores relacionados ao funcionamento do órgão de apelação. Também questionou a transparência do órgão e o funcionamento do sistema de uma forma geral. O organismo multilateral como a OMC é totalmente orientado para que as decisões tenham um caráter de consenso, a começar pela forma como a indicação dos juízes do órgão de apelação é feita.

O diplomata, ex-diretor geral da OMC e presidente da Iniciativa Internacional para o Agronegócio Brasileiro, Roberto Azevêdo, lembrou que a via do litígio comercial na OMC era "muito eficaz", quando a maioria dos casos chegava a um desfecho; em contraste com a situação atual, em que a via do contencioso está paralisada. Claramente as medidas que estão sendo anunciadas pelos Estados Unidos não levam em consideração tudo o que foi negociado desde o final da Segunda Guerra Mundial até hoje. Um exemplo prático do que o vácuo do órgão de apelação já provocou é relativo ao aço e ao alumínio, que voltaram ao foco de Donald Trump neste segundo mandato. Em sua primeira gestão, o presidente norte-americano também decidiu sobretaxar a importação dos produtos. O ato parou na OMC, que entendeu que as tarifas violavam as regras do comércio global. A conclusão do painel foi chamada de "falha" pelos Estados Unidos, que não acatou.

A política de Donald Trump em seu retorno à presidência dos Estados Unidos tem evidenciado que ele usa de ameaças para forçar países a negociarem. Qual será a prioridade que o republicano dará às conversas com o Brasil é a dúvida que ainda paira entre integrantes do governo e da iniciativa privada. Os envolvidos insistem que a balança comercial entre os dois países e a posição estratégica do mercado brasileiro não podem ser ignoradas pelo presidente norte-americano. Neste contexto, o vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC), Geraldo Alckmin, reforçou que o Brasil vai buscar os Estados Unidos para negociar uma saída à aplicação de tarifas que impactem a exportação de produtos brasileiros. Ele também avaliou que o clima gerado pela gestão do republicano no comércio internacional pode "até fortalecer" o processo de implementação do acordo entre Mercosul e União Europeia. Sobre as tarifas de Trump, Alckmin afirmou que há espaço para negociação, assim como ocorreu no primeiro mandato do atual presidente norte-americano, quando o Brasil fechou um acordo para a aplicação de cotas de exportação do aço.

O Brasil vai procurar o governo norte-americano e negociar, como foi feito no primeiro mandato de Donald Trump. Na ocasião, foi estabelecida uma cota para o aço. O ministro reforçou que a balança comercial Brasil-Estados Unidos é equilibrada, não sendo um problema para os norte-americanos. Ele também defendeu que o mundo precisa fortalecer o multilateralismo, o que reforça a importância do acordo comercial entre o Mercosul e a União Europeia. O mundo precisa de democracias sólidas e multilateralismo. Então, o acordo é bom para o Mercosul e para a União Europeia. É um ganha-ganha, pois está fortalecendo o multilateralismo. É preciso acelerar a implantação do acordo. Alckmin se comprometeu a trabalhar num acordo bilateral de bitributação Brasil-Alemanha para facilitar, diminuir burocracia, ganhar tempo, reduzir custos. O Brasil é o país que tem mais empresas alemãs fora da Alemanha. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.