31/Jan/2025
Uma semana após o presidente Lula da Silva ter dado ao governo a tarefa de garantir comida barata na mesa do trabalhador, o governo anda em círculos sem saber o que fazer. E, ao menos desta vez, não se pode culpar a equipe de ministros, pois cumprir essa missão não é algo simples ou que esteja nas mãos do Executivo. Depois da péssima repercussão de suas próprias palavras, o ministro da Casa Civil, Rui Costa, descartou a possibilidade de o governo adotar um “conjunto de intervenções” nos preços dos alimentos. Menos mal que o ministro tenha rechaçado propostas que prevejam a concessão de subsídios ou a criação de uma rede estatal de distribuição de alimentos nos moldes do programa Farmácia Popular. Isso não significa que iniciativas dessa natureza não existam nos ministérios, mas ao menos indica que elas não contam com o aval do Palácio do Planalto.
Uma das possibilidades aventadas pelo Executivo é cortar as alíquotas de importação de alguns alimentos que estariam mais baratos no exterior do que no Brasil. Não se sabe a que itens isso se refere, mas, independentemente disso, trata-se do tipo de medida que costuma ter efeitos inócuos no preço final dos produtos. Em primeiro lugar, porque a redução de impostos indiretos tende a ser absorvida ao longo da cadeia produtiva. E, em segundo lugar, porque um dos motivos pelos quais os alimentos subiram tanto é a valorização do dólar. Na remotíssima hipótese de que os preços caíssem pelo corte de impostos, a demanda aquecida atuaria no sentido oposto. As carnes subiram devido a problemas climáticos e à redução da oferta de bois, após dois anos de muitos abates, mas também há pressões do lado da demanda no exterior e no Brasil, cujo consumo foi impulsionado pela queda do desemprego e pela valorização do salário-mínimo.
No caso do milho, a redução das tarifas de importação, hoje em 8%, não seria suficiente para assegurar a competitividade ao produto norte-americano nem ao argentino. Ademais, isso poderia desestimular o plantio da 2ª safra de milho de 2025 do País e reduzir a oferta nos próximos meses. A mera cogitação da medida foi suficiente para mobilizar o campo. A Associação Brasileira do Agronegócio (Abag) afirmou que o setor opera em condições absolutamente normais, o que torna a medida, além de desnecessária, “absolutamente perturbadora”. O problema do governo Lula da Silva vai muito além da questão dos preços dos alimentos. Há, na verdade, uma incompreensão sobre o funcionamento dos mercados e uma visão ingênua sobre o poder do governo para interferir em qualquer área que seja. Toda intervenção, ainda que o governo prefira chamar de “medidas”, gera consequências. O setor afetado não fica inerte, pelo contrário, e reage a elas. Longe de ser exclusividade do agronegócio, isso se repete em muitas outras áreas, entre elas o mercado financeiro.
Mas, prevalece no Executivo uma avaliação segundo a qual o agronegócio e os investidores torcem contra o presidente Lula da Silva e, por isso, boicotam o País. É uma visão bastante atrasada, mas também muito conveniente. Afinal, ao encontrar “inimigos” para culpar, o governo se desobriga de fazer a sua parte para melhorar o ambiente de negócios. Em vez de elencar ações para atuar na ponta da cadeia de alimentos, na qual seu poder é bastante limitado, o governo deveria agir na origem do problema, reconhecendo o quanto tem contribuído para agravá-lo. A falta de disposição para adotar os tão necessários cortes de gastos no fim do ano passado foi a razão pela qual o Real perdeu tanto valor em relação ao dólar. Mais do que qualquer das medidas cogitadas na última semana, uma taxa de câmbio mais apreciada aliviaria os preços dos alimentos e, consequentemente, a inflação como um todo. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.