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25/Nov/2024

Entrevista: Barry Eichengreen - University of California

O Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) deverá iniciar uma longa pausa no processo de redução de juros na reunião de dezembro e poderá voltar a subi-los em 2025. A percepção é de Barry Eichengreen, professor de economia da University of California, que espera nova alta da inflação nos Estados Unidos, com a adoção de tarifas sobre importados e o corte de impostos para empresas que o novo governo Donald Trump poderá implementar em breve. Eichengreen espera que a próxima administração determine taxas de 10% sobre todos os importados e taxas maiores para produtos chineses, de até 60%. Para Eichengreen, a China e a Europa devem tomar medidas de retaliação a eventuais tarifas elevadas por Trump. Há uma grande probabilidade de ocorrer uma guerra comercial no próximo ano. Segue a entrevista:

Quanto o presidente eleito dos EUA, Donald Trump, elevará tarifas de importados em 2025?

Barry Eichengreen: Trump está mais comprometido de forma incondicional com aumento de tarifas do que no seu primeiro mandato. No meu cenário principal, ele adotará 10% de tarifas para todos os importados pelos EUA, sendo que para produtos chineses elas poderão ser de 60%.

Quais serão as implicações da alta de tarifas à economia dos EUA em 2025?

Barry Eichengreen: O corte de impostos para empresas com o qual Trump e o Congresso estão comprometidos estimularão a demanda, o crescimento da economia e a inflação no curto prazo. Considero que o Federal Reserve já está repensando se continuará a cortar os juros. Estes fatores fortalecerão o dólar e farão as coisas parecerem rosa nos mercados financeiros americanos. Mas isto criará problemas para o futuro próximo, pois outros países vão retaliar as tarifas impostas pelos EUA e taxas de juros maiores não serão amigáveis a investimentos. Os mercados financeiros não gostam de incertezas e Trump é uma máquina de incertezas. O que reforçará a economia americana no curto prazo pode ter o efeito oposto no longo prazo.

A inflação poderá subir novamente nos EUA no próximo ano?

Barry Eichengreen: Eu vejo a retomada da inflação nos EUA por causa do corte de impostos e da imposição de tarifas a importados. Não sei quanto ela aumentará em 2025, pois não sabemos ainda como serão as reduções de impostos e quão rápido as tarifas sobre importados serão adotadas. Mas a inflação subirá.

Com o aumento da inflação, qual será a postura do Federal Reserve na condução da política monetária?

Barry Eichengreen: A expectativa geral é de que o Federal Reserve poderá continuar a cortar os juros mais 0,75 ou 1,0 ponto porcentual, mas é improvável. Eu penso que o Fed vai adotar uma pausa na reunião de dezembro e esperar para ver como as políticas da administração Trump evoluirão, quais as implicações à inflação da redução de impostos e aumento de tarifas. Se a inflação não der sinais de acelerar imediatamente, o Fed poderá adotar uma longa pausa na condução dos juros. Mas se ela começar a subir, especialmente com rupturas na oferta, caso empresas não puderem importar componentes com altas de tarifas e redução de impostos, haverá maior pressão na demanda e o Fed começará a subir os juros.

Quando o Fed poderá começar a subir os juros no próximo ano?

Barry Eichengreen: É possível que alguma pressão da inflação seja limitada pelo fato de que companhias americanas estão fazendo estoques de componentes antes da adoção de tarifas para importados. Dependerá muito do tipo de redução de impostos que elas terão ou se o novo departamento do governo que será comandado por Elon Musk poderá encontrar gastos para cortar. Eu estou cético em relação ao que ele poderá achar. Corte de impostos casados com redução de despesas não serão tão inflacionários. Mas a redução de tributos sem serem compensados pelo corte de gastos poderá ser inflacionário.

A maioria dos dirigentes do Federal Reserve espera que o PIB dos EUA suba 2,0% no último trimestre de 2025 ante o mesmo período de 2024. Este crescimento é viável?

Barry Eichengreen: Eu acredito que o PIB subirá no primeiro semestre e baixará na segunda metade de 2025. Haverá um imediato reforço para os mercados financeiros e investimentos com as expectativas de cortes de impostos para empresas. Poderá também ocorrer um fortalecimento do consumo se forem reduzidos os impostos sobre gorjetas recebidas por trabalhadores de restaurantes e hotéis. Mas virão as incertezas (com tarifas de importados), alta de juros pelo Federal Reserve e rupturas da oferta de mercadorias quando estiverem esgotados os estoques de componentes importados. Isto reduzirá o ritmo do crescimento no segundo semestre e posteriormente. Contudo, Trump herdará uma economia forte do presidente Joe Biden. Acredito que um crescimento de 2,0% em 2025 é concebível.

O FMI previu em outubro que o mundo poderá crescer 3,2% em 2025. Com as tarifas que o governo Trump poderá adotar, o crescimento mundial poderá baixar no próximo ano?

Barry Eichengreen: As tarifas serão negativas para o crescimento global. O FMI fez um estudo sobre como as tarifas, retaliações e rupturas para o comércio global e finanças poderiam afetar o crescimento e concluiu que a expansão de 3,2% da economia mundial poderá baixar para perto de 2,5% com tarifas adotadas por Trump e retaliação estrangeira. A China, a Europa e outras partes do mundo não aceitarão passivamente que Trump imponha tarifas. Eles retaliarão. A China poderá controlar as exportações de terras raras, outras commodities e produtos com os quais tem dominante posição de mercado. E há também as incertezas geopolíticas. A guerra entre a Rússia e a Ucrânia está piorando e pode ocorrer um choque de energia, inclusive porque são imprevisíveis os eventos no Oriente Médio e o que Trump fará diplomaticamente. Poderão ocorrer rupturas no Estreito de Ormuz por onde passa muito do fluxo do comércio mundial.

Guerras comerciais poderão acontecer em 2025?

Barry Eichengreen: Sim, Trump é sério sobre aumentar tarifas. E outros países entendem que se tiverem que negociar com ele terão que fazê-lo com uma posição forte e vão retaliar. Há uma grande probabilidade de ocorrer uma guerra comercial no próximo ano. A expansão global de 3,2% em 2025 é alcançável sem guerras comerciais e rupturas geopolíticas. Mas uma guerra comercial séria e problemas geopolíticos adicionais vão deprimir este número.

Caso ocorra uma guerra comercial em 2025, a zona do euro conseguirá crescer 1,3% no próximo ano, como prevê o Banco Central Europeu?

Barry Eichengreen: Não em um ambiente de guerra comercial. A Europa tem um grande superávit comercial com os EUA e Trump não gosta de parceiros comerciais nestas condições. A alternativa para a Europa é investir mais em casa, o que recomendou Mario Draghi (ex-primeiro-ministro da Itália) em seu relatório há alguns meses. A Europa tem sido incapaz de investir em infraestrutura, pesquisa e desenvolvimento para que sua economia cresça mais rápido. Ela tem vários tipos de fraquezas e vulnerabilidades, com o colapso da coalizão na Alemanha, ruídos políticos na França, a guerra na Ucrânia e carros elétricos chineses ingressando em seu mercado, criando vários problemas para a Volkswagen e outras companhias. A Europa não está numa posição invejável, ao contrário. Um crescimento de 1,0% no próximo ano já seria ótimo para os europeus.

O impacto das tarifas que os EUA poderão adotar sobre importados da Europa poderá levar o BCE a acelerar o corte dos juros e levá-los para 2,0% em junho?

Barry Eichengreen: Eu acredito que atingir 2,0% é concebível, mas alcançar esta marca no segundo semestre poderia ser ambicioso. Cortar os juros rápido pode ser interpretado pelos mercados como um sinal de pânico, pois poderia ser entendido que o BCE sabe que algo ruim virá. Eu acredito que o BCE continuará a cortá-los, com reduções graduais de 0,25 ponto porcentual, pois a inflação está baixando mais rápido na Europa, cuja economia é mais fraca do que a dos EUA.

Fonte: Broadcast Agro.