17/Sep/2024
O diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, admitiu preocupação com práticas de lavagem de dinheiro e crime organizado por trás das apostas online, as chamadas bets. Para os empresários, o governo deveria repensar a regulamentação do setor porque as consequências do crescimento vertiginoso das bets são cada vez mais perversas. É preciso fechar o cerco ao fluxo econômico do crime organizado, de bilhões e bilhões, a partir da investigação financeira, da cooperação internacional, da capacitação e de parcerias de entre empresas privadas e a Polícia Federal. Casas de apostas online têm aproveitado brechas da Lei Eleitoral para abrir um novo tipo de mercado, oferecendo prêmios diferentes a quem acertar os vencedores das eleições para prefeituras de São Paulo (SP), Rio de Janeiro (RJ) e Belo Horizonte (MG), por exemplo. Os empresários acreditam que os riscos das bets para o País são de longo prazo. Um deles é a legalização de um crime antes restrito à contravenção. O outro, a drenagem do dinheiro que deveria ser gasto na compra de bens e serviços.
Além disso, pessoas viciadas em apostas estão deixando até mesmo de comer para jogar e a chance de inadimplência no futuro é alta. Na avaliação de empresários, o governo pode perder o controle dessa situação se não forem tomadas medidas efetivas para coibir a prática. Muitos observaram que o foco, nesse caso, não pode ser apenas a arrecadação de impostos. O Ministério da Fazenda destacou que apostas sem relação com temática esportiva ou jogos online não são previstas pela legislação, não podendo ser assim entendidas como legalizadas nem em fase de regulação ou adequação. O Congresso aprovou em dezembro projeto de lei que regulamenta o setor de apostas de alíquota fixa, faixa de atuação das bets e dos cassinos online. Esse mercado, porém, só deve ser formalmente regulamentado no Brasil a partir de 2025. Economistas calculam que a arrecadação para o caixa do governo pode atingir cerca de R$ 10 bilhões por ano. Futebol e celular impulsionam bets entre crianças e adolescentes.
A proximidade com o futebol, os games e o celular fizeram com as bets entrassem no universo infantil com força que preocupa escolas, famílias e especialistas. O maior risco é a forma como as apostas esportivas são apresentadas. A publicidade ostensiva online e offline, com influenciadores e até medalhistas olímpicos, durante o jogo de futebol, na camisa dos times, nas redes sociais, normaliza as bets e faz com que pareçam saudáveis e divertidas. A falta de regulamentação no País, que só agora começa a ser enfrentada, também permite que o público infantojuvenil fique desprotegido. O Instituto Jogo Legal, que representa o setor, diz que o problema está nos sites irregulares. Pesquisas mostram que crianças e adolescentes têm menor capacidade de controle de impulso e são mais suscetíveis a atividades que prometem recompensas rápidas e parecem emocionantes. Por isso, só educação financeira não resolve a questão.
Na rede estadual de São Paulo, as discussões sobre bets foram incorporadas recentemente ao material didático online, na disciplina de educação financeira no ensino médio. A preocupação com as apostas online, fenômeno recente, esbarra ainda na falta de pesquisas. Mas, estudos mostraram que jovens têm mais possibilidades de se viciar em jogos de azar por imaturidade biológica e emocional. O fato de os jogos estarem disponíveis em celulares, além de facilitar o acesso, incorpora uma camada de preocupação. Estudos recentes também já têm relacionado o uso frequente de aparelhos e redes sociais ao vício e a problemas de saúde mental em crianças. Uma das referências mundiais em regulamentação é um relatório do Parlamento da Austrália de 2023. O jogo online tem sido deliberadamente e estrategicamente comercializado juntamente com os esportes, o que o normalizou como atividade divertida, inofensiva e sociável.
Isso “manipula” o público mais impressionável e vulnerável: crianças e adolescentes. O governo australiano ainda discute o que será tornado lei no País após recomendações do relatório, especialmente com relação à publicidade. As apostas esportivas online cresceram em muitos países a partir da Copa de 2018. No Brasil, o Ministério da Fazenda está finalizando o cadastramento das bets com novas exigências para atuarem, o que levará a cobrança de impostos e transferência bancárias. Estima-se que 15% do mercado seja de empresas sem registro, que permitem que apostadores joguem apenas com um número de celular. Esse mercado movimenta entre R$ 60 bilhões e R$ 100 bilhões no País. Segundo o Instituto Jogo Legal, criança e adolescente só vai apostar a partir de 1º de janeiro de 2025 com a conivência do pai ou responsável. O problema são bets ilegais que não exigem CPF e data de nascimento do jogador. No entanto, há relatos de adolescentes que jogaram em plataformas de apostas burlando sistemas de registro.
Em junho, o Instituto Alana fez denúncia ao Ministério Público de São Paulo porque encontrou dez perfis de influenciadores mirins, entre 6 e 17 anos, que fazem propaganda de sites de apostas. Segundo a entidade, os perfis ainda estão ativos. Resolução do Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária (Conar), de fevereiro, diz que anúncios de apostas online precisam indicar que a atividade é restrita. Afirma também que a propaganda só pode ser feita por influenciadores que tenham adultos como seu público-alvo. O problema maior não é o jogo, são esses influenciadores que passam mensagem de que você vai ficar rico. O jogo é entretenimento e nada mais. Para o Instituto Alana, as regras não são suficientes. Segundo a International Network for Financial Education da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a educação financeira ajuda, mas não é suficiente para afastar crianças e adolescentes do vício nas bets.
Há uma pressão grande de influenciadores, o futebol, a facilidade, o hábito de usar celular, e ainda a ilusão de gratificação imediata. O caminho está aberto demais. A educação financeira não é a “salvação da lavoura.” Sim, é preciso educar crianças e jovens a usar conscientemente o dinheiro porque são hábitos mais fáceis de serem trabalhados cedo. No caso dos jogos de azar, porém, é preciso “bombardear” com informações sobre pessoas que se endividaram e de como eles são estruturados para que, sempre, se perca mais do que se ganhe. As políticas públicas precisam olhar para questões de psicologia, do comportamento, de regulamentação, de proteção do consumidor e de como é feita a arquitetura para atrair a população de todas as idades para as apostas. Caso contrário, só informação não resolve. “É como o bilhete da loteria que está escrito atrás a chance de ganhar: 1 em 50 milhões. Ninguém deixa de apostar por isso.”
As ciências do comportamento mostram como o cérebro vai em busca de recompensas intermitentes, como nos mecanismos de apostas, em que ganhos são intercalados com perdas. No caso das crianças, há ainda o fato de que elas entendem o jogo como brincadeira e não compreendem o valor real do dinheiro. Tem ainda o efeito de manada: ‘todo mundo joga na escola e não quero ficar de fora’. E o desafio de aprender a fazer aquilo, é como aprender a amarrar sapato, ele quer saber os macetes. Uma das soluções seria grandes campanhas com “marketing de sinal trocado” mostrando histórias de pessoas que tiveram muitos problemas com o jogo. É preciso juntar forças, famílias e escolas, com regulamentação, trabalho com influenciadores, com adolescentes que são considerados líderes. O Ministério da Educação diz que a educação financeira faz parte da Base Nacional Comum Curricular. O Ministério da Saúde informou que tem ampliado o atendimento a pessoas com problemas de saúde mental, incluindo o jogo patológico para crianças e adolescentes.
senador Omar Aziz (PSD-AM) afirmou que vai apresentar uma ação na Procuradoria-Geral da República (PGR) pedindo para retirar do ar todos os sites de apostas esportivas enquanto não estiver concluído o processo de regulamentação das empresas pelo governo federal. No ano passado, o Congresso aprovou um projeto de lei que prevê a taxação de apostas esportivas, que ainda está em processo de regulamentação no Poder Executivo. A partir do ano que vem, apenas empresas autorizadas poderão atuar no País. De acordo com Aziz, enquanto não houver regulamentação, é preciso que os sites saiam do ar. Segundo ele, o número de saque da poupança e os empréstimos consignados aumentaram devido ao crescente consumo de jogos. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.