03/Sep/2024
Pela primeira vez, desde 2018, o Mutirão do Emprego, promovido pela União Geral dos Trabalhadores (UGT) e pelo Sindicato dos Comerciários de São Paulo, virou o "mutirão do pleno emprego". Ou seja, teve mais vagas do que candidatos. Nos cinco dias do evento, 3,58 mil trabalhadores passaram por lá, menos da metade dos 7,4 mil candidatos da primeira edição, em 2018. O número de postos de trabalho oferecidos neste ano bateu recorde: 25.046. Foi o mutirão com mais vagas ofertadas de todas as nove edições e com menos candidatos. Do total de posições abertas, 200 foram preenchidas no evento, menos de 1%. Esse resultado é um retrato da dificuldade enfrentada hoje pelas empresas para contratar trabalhadores qualificados. A taxa de desemprego de 6,8% registrada no trimestre encerrado em julho foi a menor da série histórica, iniciada em 2012, segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Com isso, a escassez de mão de obra atingiu níveis recordes. Já afeta 40% das profissões que respondem pela maior fatia dos empregos formais no País, revela um estudo feito pela Confederação Nacional de Bens, Serviços e Turismo (CNC). Profissões onde há maior escassez de trabalhadores estão ligadas ao setor de serviços e à construção civil. Para chegar a esse resultado, foram cruzados dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged) com o Relatório Anual de Informações Sociais (Rais) e selecionado um grupo de 231 profissões que respondem por 80% da ocupação do País. Constatou que, em junho, 92 das profissões que mais empregavam apresentavam indícios de escassez. Ou seja, o salário para admitir trabalhadores tinha crescido acima da média nominal do mercado de trabalho (5,8%) entre junho de 2023 e junho de 2024 e o estoque trabalhadores também tinha aumentado no período. É o ponto mais alto de indício de escassez no mercado de trabalho.
Um cenário parecido com o atual ocorreu em meados de 2021. Só que, naquela época, a escassez era por causa da reposição de trabalhadores na saída da pandemia, não em razão do crescimento da atividade. Tirando esse período após a pandemia, não há registro de escassez tão elevada no mercado de trabalho como a que houve ao final do primeiro semestre deste ano. Outro estudo feito pelo Departamento de Pesquisa Econômica do Banco Daycocal, com base nos dados da Pnad, aponta para a mesma direção. Revela que, até junho deste ano, de dez setores da economia analisados, seis estavam com alta demanda por mão de obra há mais de seis meses. Isto é, o salário e o número de ocupados no setor cresciam acima da média histórica. Nesse rol estão indústria, comércio, transporte, tecnologia e finanças, administração pública e outros serviços. A situação é ainda mais crítica no setor de alimentação e alojamento, onde os salários têm subido acima da média histórica, porém o número de contratados tem avançado abaixo desse parâmetro.
Na prática, os empresários querem contratar, mas não encontram trabalhadores para preencher as vagas. Isso denota que está faltando trabalhador. O estudo do banco indica que o setor de alojamento e alimentação chegou ao limite. Um dos motivos é que esse segmento teve uma recuperação muito forte na saída da pandemia. Sondagem do setor de serviços da Fundação Getúlio Vargas (FGV) confirma o movimento constatado pelos estudos da CNC e do Daycoval. Em julho, 36,6% das empresas de alojamento, restaurante e alimentação apontaram a escassez de mão de obra qualificada como um fator limitante ao avanço das atividades. Na média do setor de serviços da sondagem da FGV, esse problema foi indicado por 21,2% das companhias no período. Falta de mão de obra foi o terceiro obstáculo ao avanço das atividades no setor de serviços em geral.
Alojamento, restaurante e alimentação foi o segmento com o maior resultado entre os demais do setor de serviços nesse quesito de escassez de mão de obra e o que registrou o maior aumento em relação a julho do ano passado. A falta de trabalhadores qualificados é clara na construção civil e o principal problema para as companhias. Em julho deste ano, mais de um quarto das empresas (26,7%) apontou a escassez de mão de obra como um problema. É o maior patamar desse quesito para os meses de julho desde 2014. A reclamação de falta de trabalhadores é constante nos serviços e na construção. No comércio, a FGV não pesquisa diretamente os obstáculos ao avanço da atividade entre as empresas dos setores. No entanto, os indícios de escassez de trabalhadores aparecem no elevado custo da mão de obra, apontado por 12,9% das varejistas como um problema em julho último. Esse obstáculo tem aparecido de forma recorrente nas sondagens do comércio feitas pela FGV nos últimos meses.
A demanda por salários maiores já foi percebida, por exemplo, pela Pernambucanas. No último Mutirão do Emprego, a varejista oferecia salário fixo de R$ 2 mil para vendedor mais comissão. Os candidatos que compareceram ao evento pleiteavam de 10% a 15% a mais no salário fixo e isso dificulta as contratações. A Pernambucanas ofertou 100 vagas para a cidade de São Paulo no mutirão da semana passada. Até o dia 28 de agosto, preencheu 10 vagas e a expectativa até aquela data era ter completado a metade dos postos de trabalho. No Grupo GR, empresa de vigilância e limpeza, as contratações estavam em marcha lenta até meados da semana passada, comparado a eventos de anos anteriores. A companhia levou 300 vagas para o mutirão e tinha contratado apenas 15, após entrevistar 18 candidatos. A expectativa era chegar no dia 28 de agosto com 100 contratações. O que dificultou as admissões neste ano foi a falta de candidatos. A situação se inverteu: no ano passado, os candidatos vinham até a empresa e agora, a empresa que está indo atrás deles.
O aperto no mercado de trabalho mudou o perfil dos trabalhadores que hoje estão em busca de emprego. Entre os que estavam à procura de uma vaga no Mutirão do Emprego, havia pessoas com mais idade, aposentados, os que queriam um segundo emprego para complementar a renda e até quem pediu demissão recentemente, acreditando que conseguiria colocação melhor. Porém, apesar do recuo da taxa de desemprego, há ainda no País um grande número de desempregados. São 7,431 milhões de pessoas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) no trimestre encerrado em julho. A LCA Consultores observa que o problema de escassez de trabalhadores enfrentado pelas empresas se refere à falta de mão de obra qualificada. Tanto é que o maior contingente de desempregados atualmente é formado pelos trabalhadores com menor grau de instrução. Profissionais com ensino superior completo e incompleto respondem hoje por menos de 20% do total das pessoas que não têm emprego. No entanto, o mercado de trabalho aquecido abre espaço para incorporar pessoas com menos experiência.
Isso é bom para o trabalhador que obtém ganhos salariais ou novas oportunidades. Os ganhos de renda para os trabalhadores são nítidos em duas pesquisas. Em 12 meses até junho, o rendimento real dos trabalhadores, isto é, descontada a inflação, cresceu 4,4%, segundo IBGE. Também no primeiro semestre deste ano, 87,2% dos reajustes salariais superaram a inflação, segundo o Boletim Salariômetro da Fipe. Foi o melhor primeiro semestre em dez anos para os reajustes salariais. Na opinião da CNC, embora a taxa de crescimento da economia tenha superado as expectativas na primeira metade deste ano, os recordes de escassez de mão de obra não estão atrelados somente ao aumento do Produto Interno Bruto (PIB). A economia mudou depois da pandemia. Isso reduziu a participação da população na força de trabalho e deixou de pressionar a taxa de desemprego. No segundo trimestre encerrado em junho, 62,1% da população total participava da força de trabalho, ante 63,8% no segundo trimestre de 2019, antes da pandemia. Caso a força de trabalho retomasse o nível pré-pandemia, 3 milhões de brasileiros estariam procurando emprego. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.