03/Sep/2024
O presidente da Federação Nacional de Previdência Privada e Vida (Fenaprevi), Edson Franco, avalia que a incidência do imposto de herança, o chamado ITCMD, sobre os planos de previdência privada é um “grande erro”. O executivo aponta intenção arrecadatória dos Estados com base em argumento falho, parcial e limitado. O executivo alega que apenas uma minoria dos poupadores usa os planos para fugir do imposto estadual no momento da doação ou transferência dos valores, o chamado planejamento tributário. “Não dá para você dar um tiro de canhão para matar uma formiga”, diz Franco.
Ele também destaca que 41% dos investidores dos planos VGBL e PGBL são da classe C. Há uma percepção equivocada de que a Previdência é produto para classe alta, mas não é assim. O tema está em discussão em duas frentes: no Congresso, por meio do projeto de lei de regulamentação da reforma tributária; e também no Supremo Tribunal Federal (STF), que começou a analisar o assunto em ação que atende a um pedido do Rio de Janeiro, onde o Tribunal de Justiça local declarou a inconstitucionalidade da cobrança sobre VGBL, mas liberou sobre PGBL. A ação no STF está parada, após pedido de vistas do ministro Gilmar Mendes na semana passada.
Quais as preocupações com o projeto de lei de regulamentação da reforma tributária?
Edson Franco: Entendemos que essa previsão de incidência vai aumentar ainda mais a insegurança jurídica, porque a gente tem uma série de relações contratuais já vigentes. Então, temos de tomar muito cuidado com o tratamento dos contratos fechados anteriormente a isso, incluindo aspectos relacionados à portabilidade.
Como afeta a portabilidade?
Edson Franco: A previdência é um dos produtos pioneiros em ter um instituto da portabilidade que favorece o cliente e promove uma concorrência saudável entre as empresas. Isso vem desde a lei complementar 109 (de 2001). Então, a gente tem de ter certeza de que os planos já existentes, inclusive os que usam o instituto da portabilidade, não perderão (a isenção do imposto de herança) - ou seja, que não serão alcançados por uma mudança dessa natureza.
O temor é de que o plano portado seja considerado um novo aporte?
Edson Franco: Exato. Imagina o seguinte: eu tenho um plano no banco ‘A’, aí eu pego esse dinheiro e migro para o banco ‘B’. Se a portabilidade não estiver preservada (blindada do imposto), todo o dinheiro que foi migrado será considerado como uma nova contribuição, e aí ficará sujeito à tributação. Ou seja, você estará prejudicando o cliente, porque você vai desincentivar a portabilidade e, consequentemente, a concorrência.
Como o sr. avalia as demais consequências dessa possível tributação?
Edson Franco: Essa ideia de taxação (via imposto de herança) é um desserviço. O Brasil envelhece a um ritmo muito superior ao que se viu nos países europeus, por exemplo. E com um contexto social muito distinto, de uma classe média frágil, de uma renda média baixa e de um sistema previdenciário público que certamente tem um caráter de insustentabilidade. Portanto, qualquer proposta que desincentive a formação de poupança previdenciária privada vai na contramão dessa tendência demográfica inequívoca. Além disso, há uma percepção muito equivocada de que a previdência é produto para classe alta, mas não é assim.
Qual o recorte por classe social?
Edson Franco: Os produtos de natureza previdenciária já atendem necessidades de classes sociais distintas. Só na previdência aberta, são mais de 11 milhões de famílias protegidas por esses planos. Nós não estamos falando de algo que vai atingir os ricos, como se poderia imaginar. Grande parte é da classe média e 41%, da classe C. Secretários de Fazenda dos Estados, técnicos do Legislativo e a equipe econômica alegam que a previdência privada é usada como uma forma de o rentista fugir do imposto de herança no momento de transferir os bens à próxima geração. Essa é uma forma muito limitada. As pessoas não estão entendendo o alcance que o sistema previdenciário tem hoje. A maioria dos nossos participantes é formada por pessoas que contribuem de forma regular. Além disso, a previdência aberta é composta por planos individuais e coletivos. Nesses últimos, esse tipo de comportamento já não é possível.
Mas os planos individuais respondem por 80% dos participantes…
Edson Franco: Mesmo nos planos individuais, é uma minoria que entra no sistema com uma visão exclusivamente de planejamento tributário. Nós temos, hoje, um estoque de ativos, na previdência aberta, de quase R$ 1,4 trilhão. Olhar para a previdência e generalizar uma situação específica é um grande erro. Numa intenção arrecadatória dos Estados, com um argumento falho, parcial e limitado, a gente está, na verdade, criando um desincentivo para todo o sistema previdenciário, que tem uma função social superimportante. Não dá para você dar um tiro de canhão para matar uma formiga.
O relator do projeto de lei complementar, deputado Mauro Benevides (PDT-CE), isentou os VGBLs com mais de cinco anos. O objetivo, segundo ele, é blindar investimentos de longo prazo. Isso ajuda a solucionar o problema?
Edson Franco: Na verdade, não são cinco anos da contratação do plano, e sim de cada aporte. Mesmo as pessoas que fazem aportes regulares mensais ou anuais teriam grande parte do patrimônio atingido pelo ITCMD. A gente vive numa situação em que os mais jovens têm mais dificuldade de poupar e, à medida que você vai crescendo na carreira, envelhecendo, a sua capacidade de poupança aumenta. Então, é natural que, nos últimos cinco anos da vida laboral, você acelere a formação de poupança - e todo esse estoque seria atingido.
Fonte: Broadcast Agro.