27/Aug/2024
Sempre que ficou sem trabalhar, Anderson Souza, de 24 anos, não se deu ao luxo de esperar pela vaga perfeita. “Agarrei o que apareceu.” Estudante de publicidade e propaganda, ele vem de uma origem simples. Em 2017, concluiu o ensino médio numa escola técnica e só ingressou na universidade em 2020. Mas, o sonho da graduação foi adiado pela pandemia de Covid-19 e as demandas crescentes que surgiram com o trabalho remoto. Em 2021, conseguiu retomar os estudos. Hoje, se mantém na universidade graças ao Prouni (Programa Universidade para Todos). A trajetória de Anderson, bastante comum no País, ajuda a desmistificar um quase consenso que se criou em torno da chamada geração Z (formada por aqueles que nasceram entre 1997 e 2010). Globalmente, são jovens que mudaram a maneira de se relacionar com o trabalho e empregadores e deram origem a movimentos importantes, como great resignation (grande renúncia) e quiet quitting (demissão silenciosa).
Como começaram a vida num momento em que a economia global convive com uma baixa taxa de desocupação, podem, em tese, se dar ao luxo de escolher os seus empregos. Anderson, por exemplo, compartilha as bandeiras da geração Z: busca trabalhar numa companhia com propósito, que acolha a diversidade, estimule o desenvolvimento profissional e dê flexibilidade. Em seu segundo emprego, ele escolheu sair porque não se identificava com quem trabalhava no local, sendo uma pessoa LGBT e de baixa renda. Mas, é difícil imaginar um caminho tão glamouroso para todos os jovens brasileiros, sobretudo para aqueles que estão nas camadas sociais mais baixas. Para esse grupo, muitas vezes não é possível encontrar vagas que se enquadrem a seus propósitos e ideais. E, por necessidade, eles são obrigados a trabalhar no emprego que aparecer.
Segundo a consultoria Plano CDE, o jovem da base da pirâmide chega ao ensino médio e olha para frente com muita frustração, porque os empregos que estão disponíveis para ele são muito precários e sem muita confiança de que ele vai conseguir sair desse ciclo. No Brasil, a população economicamente ativa (PEA) de 18 a 24 anos soma cerca de 15,2 milhões de pessoas, um contingente maior do que o de todos os habitantes da Bahia, e é altamente educada, pelo menos para o padrão brasileiro. Essa faixa etária alcançou 11,8 anos de escolaridade, um recorde, de acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios calculada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). É verdade que essa faixa etária viu um crescimento na renda, ajudado pelos anos a mais de estudo e pelo bom desempenho da economia. Mas também é verdade que os números do mercado de trabalho seguem desafiadores.
Trata-se de uma geração que enfrenta uma taxa de desemprego maior do que a geral do País, foi de 16,5% no ano passado, ante 8% da média nacional. E uma taxa de informalidade gigantesca, de 42,1%. A taxa de informalidade entre os jovens é maior. Segundo a consultoria Tendências, isso se dá por causa dessa dificuldade de ingresso e de estabilidade no mercado de trabalho. É um grupo mais vulnerável, especialmente os menos qualificados. Historicamente, o mercado de trabalho sempre foi mais difícil para os jovens. É uma realidade, inclusive, de boa parte dos países desenvolvidos. No início da vida laboral, é difícil saber se o jovem será produtivo ou não. Para as empresas, portanto, é mais arriscado contratar um profissional sem a certeza de como será o desempenho dele. Segundo o Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (FGV/Ibre), a baixa experiência significa para o contratador uma insegurança grande, pois não se sabe se o jovem é bom ou ruim, se é produtivo.
O grande risco de uma entrada com vários tropeços no início da jornada laboral é o que os analistas chamam de “efeito cicatriz”, quando a desocupação ou a permanência em posições de trabalhos mais precários geram efeitos adversos ao longo de toda a carreira do trabalhador. A questão da falta de oportunidade para os jovens ainda é um desafio global. Pelo menos no curto prazo, não existe uma expectativa de reversão dessa vulnerabilidade entre os jovens. No Brasil, a elevada desigualdade cria um abismo entre os brasileiros da geração Z das diferentes classes sociais. Os jovens das classes C, D e E acabam sendo menos estimulados por famílias e escolas do que os brasileiros da elite. Os analistas apontam que um dos grandes entraves para transformar essa realidade passa por fazer com que o ensino médio se torne mais estimulante e prepare os jovens para o mercado de trabalho.
Hoje, a falta de perspectiva para seguir adiante na educação se dá pelo fato de a diferença salarial ser muito pequena entre quem não concluiu e quem concluiu o ensino médio. A diferença salarial só aparecerá quando se chega ao ensino superior, mostra um estudo da consultoria Plano CDE. De acordo com o levantamento, aos 22 anos, um brasileiro que concluiu o ensino superior recebe R$ 9,40 por hora trabalhada. Os estudantes que concluíram o ensino médio ganham R$ 6,80, pouco mais do que os que não terminaram essa etapa educacional (R$ 6,20). Para o jovem da geração Z que está no ensino médio, se ele não confia que vai chegar à universidade, e muitos não confiam, nem vale a pena concluir. Na percepção desse jovem, ele não ganha nada. Mas, claro, os estudos econômicos mostram que, ao longo da vida, o diploma de ensino médio faz muita diferença.
Apesar das dificuldades enfrentadas pelos jovens de classes mais baixas, os últimos anos apresentaram um avanço na mobilidade geracional, ou seja, a chance de uma criança pobre ter um futuro melhor do que o de seus pais. No passado, os filhos eram um espelho dos pais. Pai pobre, filho pobre e pai rico, filho rico. Isso teve uma melhora, segundo a FGV Social. Antes, 70% da educação dos filhos era determinada pela dos pais. Na geração Z, esse percentual cai para 47%. Como comparação, nos Estados Unidos, esse número é de 32%; na Alemanha, 20%; e na Malásia, 19%. Danielle Menta, de 25 anos, e Sofia Hibino, de 21 anos, são exemplos de como o ambiente familiar e as condições financeiras ditam o ritmo de suas escolhas. Famílias mais estáveis economicamente ajudam a impulsionar carreiras e a facilitar as decisões. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.