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23/Jul/2024

Reforma Tributária e a polêmica do setor imobiliário

A proposta de regulamentação da reforma tributária, aprovada na Câmara, instaurou uma queda de braço entre a equipe econômica e o setor imobiliário, numa disputa que extrapolou os corredores do Congresso, ganhou as redes sociais e deve se intensificar durante a sua tramitação no Senado. Isso porque o diagnóstico a respeito dos efeitos do novo modelo de Imposto de Valor Agregado (IVA) sobre o setor são muito divergentes. Enquanto o governo garante que não haverá aumento de carga tributária, entidades do setor rebatem com estudos independentes que apontam o contrário, o que resultaria em alta nos preços dos imóveis, com risco de agravamento do déficit habitacional no País. O secretário extraordinário da reforma tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, afirmou que as mudanças feitas pelos deputados, que permitiram uma redução de 40% da alíquota-padrão para o setor, contra 20% da proposta original da equipe econômica enviada ao Congresso, já deixaram a carga tributária em equilíbrio com o regime atual. Isso no caso de transações por empresas, uma vez que, segundo o texto, o IVA não incidirá sobre compra, venda e aluguel por pessoas físicas.

Além disso, Appy lembra que há redutores automáticos da base de cálculo do imposto e créditos que serão acumulados ao longo da cadeia e poderão ser abatidos. Por isso, garante que o impacto nos preços chegará a, no máximo, 3,5% para imóveis acima de R$ 2 milhões; sendo que, para imóveis populares, na faixa de R$ 200 mil, haverá queda de 3,5% nos preços. A relação do governo com o setor imobiliário foi correta e houve uma discussão muito técnica sobre a carga atual; mas há hipóteses diferentes. Pelas contas do governo, a redução da alíquota-padrão que mantém a carga tributária atual é próxima de 40%; pela conta do setor, precisa ser próxima de 55%. Eles têm como universo as grandes incorporadoras; e o governo tem a base de dados da Receita Federal, com todas as declarações de operações imobiliárias. A Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e o Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação ou Administração de Imóveis Residenciais ou Comerciais de São Paulo (Secovi) citam estudos feitos pelas consultorias Tendências e FM/Derraik que apontam a necessidade de a redução chegar a 60% da alíquota-padrão do novo IVA, estimada em 26,5% pelo Ministério da Fazenda, para manter a carga tributária atual. É um debate técnico para se encontrar um consenso.

Mas, há divergências também no próprio setor. Enquanto a CBIC estima alta de 2% a 5%, mais próximo das contas da Fazenda, o Secovi teme que ela chegue a 12%. O setor imobiliário promete forte mobilização e conta com as redes sociais para pressionar o governo e os senadores para conseguir os ajustes que acha necessários. Uma brecha na redação do texto poderia fazer com que aposentados que vivem da renda de imóveis paguem mais impostos, embora a equipe econômica rejeite a ideia. Isso porque a proposta diz que está sujeito à cobrança de impostos quem tem imóvel como “forma preponderante em suas atividades econômicas”. Imagine um aposentado que recebe R$ 2 mil de aposentadoria, e de dois imóveis recebe R$ 10 mil de locação. Isso é mais do que a aposentadoria. E aí, fica a dúvida: é atividade preponderante? Não é possível ter essa incerteza. A consultora Melina Rocha, especialista no modelo de IVA dual, que será implementado no Brasil, avalia que não há essa dúvida, porque todo o direcionamento da reforma é para a tributação de atividades empresariais, e não de pessoas físicas.

Só vai ser contribuinte do CBS (IVA do governo federal) e do IBS (IVA de Estados e municípios) se estiver desempenhando uma atividade econômica de forma empresarial. Tem que ser de forma habitual, relevante, profissional. Esses três critérios se aplicam ao regime de bens imóveis. Mas, o regulamento a ser feito depois, por normas infralegais, pode trazer critérios mais objetivos para definir o que ocorre nessa situação; não necessariamente precisa estar no projeto de lei da regulamentação. De uma forma ou de outra, a dúvida gerou ruídos que foram parar nas redes sociais. A confusão foi tão grande obrigou o Ministério da Fazenda a divulgar uma nota no dia 12 de julho para rebater o que chamou de “notícias falsas”. Ao contrário das notícias inverídicas que estão circulando, a reforma tributária será positiva para o setor imobiliário brasileiro e será justa, pois tributará menos os imóveis populares que os imóveis de alto padrão, diz o texto.

A nota saiu porque começou a circular muita desinformação nas redes sociais, dizendo que ia pagar 26,5% em qualquer venda de imóvel, diz Bernard Appy, que considera o aumento sobre o valor dos imóveis “marginal” e que pode ser compensado por ganhos de produtividade que o setor terá com os benefícios da reforma, lembrando que novos benefícios vão aumentar a alíquota-padrão para o restante da economia. O setor vai ser beneficiado com um aumento grande de produtividade, porque vai permitir a recuperação de 100% dos créditos, o que vai fazer as empresas optarem por métodos construtivos mais eficientes. As demandas do setor imobiliário por alterações na regulamentação são pelo menos oito. Além da aplicação do redutor do imposto em 60% para venda e 80% para locação, e da definição clara do que é contribuinte na locação, quer ainda que o pagamento do tributo siga o modelo de “caixa”, ou seja, feito apenas quando recebem o pagamento, e um novo cronograma de transição para que empreendimentos já iniciados preservem o modelo tributário atual.

Para a consultora em política tributária Vanessa Canado, ex-assessora especial para o tema do Ministério da Economia, há uma grande dificuldade para se calcular o resíduo tributário que hoje é pago pelo setor imobiliário. Mas ela tende a concordar com os números do Ministério da Fazenda. É uma questão de premissa e essa premissa é muito difícil de ser fixada. Não se pode considerar apenas o ISS (imposto municipal) e o PIS/Cofins (impostos federais) na construção e venda dos imóveis. Também deve se considerar o quanto desses e outros tributos estão embutidos nos insumos comprados (materiais de construção, máquinas alugadas, advogados contratados, terceirizados etc.). Esses tributos estão embutidos nos preços e são pagos pelo setor.

Jefferon Valentin, auditor do estado de São Paulo e representante do Comitê Nacional de Secretários de Fazenda, Finanças, Receita ou Tributação dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) no grupo de trabalho na Câmara que discutiu questões do setor imobiliário na reforma, entende que as concessões feitas já foram suficientes. Ele avalia que há interesses diversos dentro do próprio setor, que tem uma cadeia de produção longa, e isso aumenta a dificuldade para se atender todos os pleitos. Para ele, o setor está no papel dele de tentar a menor carga possível. Mas tem um problema: cada Real a menos cobrado de um significa aumento na alíquota de referência (do IVA), que será pago em outro lugar. Depois da aprovação na Câmara, o primeiro projeto que regulamenta a reforma tributária será analisado pelo Senado, onde será relatado pelo senador Eduardo Braga (MDB-AM), que também foi o relator da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que tratou da reforma no ano passado. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.