09/Jul/2024
Frases de efeito, hashtags, profusão de estudos e até petição. Na regulamentação da reforma tributária, são amplos os recursos utilizados por setores e empresas para tentar escapar ou ao menos reduzir a incidência do "imposto do pecado", que será cobrado sobre produtos considerados nocivos à saúde ou ao meio ambiente. Tecnicamente chamado de Imposto Seletivo, o tributo mira bebidas alcoólicas e açucaradas, cigarro, carro, barco, aeronave, bens minerais e apostas físicas e online, esse último item acrescentado pelo grupo de trabalho da Câmara dos Deputados. Mas, há debates para a inclusão de alimentos ultraprocessados, além de armas e munições. A expectativa é de que o texto seja votado ainda nesta semana ou, no máximo, na seguinte, antes do recesso parlamentar, que começa dia 18 de julho, o que deve acirrar os lobbies dos segmentos não atendidos no relatório apresentado pelos deputados.
As entidades da sociedade civil contra-atacam com números, evidências empíricas e campanhas e alegam que se trata de oportunidade única para Congresso e governo inibirem comportamentos danosos, sobretudo à saúde, os quais geram bilhões de Reais em gastos públicos anualmente. A indústria das bebidas alcoólicas é o melhor exemplo dessa guerra de slogans, travada desde o início do ano, mas intensificada agora, com a proximidade da votação do primeiro projeto de lei complementar da reforma na Câmara. Com a frase "Álcool é álcool", que também virou hashtag nas redes sociais, os fabricantes de destilados defendem alíquotas homogêneas do Seletivo, sem relação com o teor alcoólico. O argumento é de que as doses-padrão de cachaça, vodca, gim e uísque têm a mesma quantidade de etanol (álcool puro) da cerveja e do vinho, por exemplo, que são bebidas fermentadas. E, por isso, pedem uma "dose de igualdade".
Além disso, argumentam que a cerveja representa 90% do consumo de álcool no País. Pesquisa realizada na América Latina comprovou que, no Brasil, a cerveja foi a bebida mais consumida antes de acidentes", afirmou a Associação Brasileira de Bebidas Destiladas (ABBD). Os produtores de cerveja se defendem afirmando que é uma proposta bizarra falar que bebidas com 40%, 50% de teor alcoólico têm de pagar o mesmo imposto que bebidas com 4%. Isso não funciona em nenhum lugar do mundo, rebateu o Sindicato Nacional da Indústria da Cerveja (Sindicerv). Com os lobbies cada vez mais ativos dentro do Congresso, a Vital Strategies, uma organização global de saúde pública, também decidiu investir em mensagens de impacto aos parlamentares às vésperas da votação da regulamentação da reforma tributária. Para isso, lançou a campanha "Quer uma dose de realidade?".
São imagens fortes de pessoas afetadas pelos danos provocados pelo consumo de bebidas sem moderação, espalhadas nas vias de acesso ao Congresso. Na legenda, há mensagens como: "O álcool é um dos maiores causadores de câncer de mama e de cólon. Parlamentar, se o álcool provoca mortes, tem de pagar mais imposto". Pesquisa realizada pela organização aponta que a maioria da população brasileira (61%) é favorável à cobrança de impostos para reduzir o consumo desse tipo de bebida. E praticamente o mesmo percentual (62%) concorda que uma maior tributação levaria as pessoas a efetivamente beber menos. A indústria do fumo também reagiu. A Associação Brasileira da Indústria do Fumo (Abifumo) afirmou que o setor de tabaco não suporta mais aumento de imposto. Dizer que aumentar o preço do cigarro vai diminuir o consumo é uma inverdade.
Se o imposto aumentar, vai jogar a população para consumir o cigarro do contrabando, do Paraguai, que não tem qualidade do produto nacional, que é controlado pela Anvisa. O Ministério da Fazenda, no entanto, aponta que a taxação dos produtos fumígenos está defasada. Isso porque a alíquota específica, no valor de R$ 1,50 por maço, está congelada há oito anos. A carga tributária do cigarro é muito inferior à vigente em 2016, última vez que a alíquota teve atualização, afirmou a Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária. A ideia é que a alíquota específica (que terá valor fixo, em Reais) seja atualizada anualmente pela inflação, como prevê o projeto enviado pela equipe econômica. Além dessa taxação, haverá uma segunda alíquota, que será um percentual sobre o preço do produto. A indústria de refrigerantes investe em expressões como discriminação e contrassenso para pedir a exclusão das bebidas açucaradas da lista do Seletivo.
Para a Associação Brasileira das Indústrias de Refrigerantes e Bebidas Não Alcóolicas (Abir), a proposta do governo incluiu as bebidas açucaradas como o único alimento causador de obesidade. Isso é discriminação, porque obesidade é uma questão multifatorial. Há também contradição no fato de o açúcar ter sido incluído na cesta básica com imposto zero. A recomendação do Ministério da Saúde, porém, vai na direção contrária: na de que os estudos demonstram a efetividade do Seletivo nas escolhas de consumo e que, por isso, é fundamental manter a sobretaxa nesse tipo de bebida. Doenças crônicas não transmissíveis como obesidade, diabetes e complicações cardiovasculares matam cerca de 760 mil pessoas no País por ano. O Imposto Seletivo é altamente efetivo na prevenção e promoção da saúde. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.