03/Jul/2024
A reforma tributária em debate no Congresso Nacional cria dois tributos "gêmeos": a CBS, de competência federal, e o IBS, gerido por Estados e municípios. Ambos são Impostos sobre Valor Agregado (IVAs) incidentes sobre o consumo de bens e serviços. Apesar dessa estrutura espelhada, as disputas entre os contribuintes e o Estado serão decididas por órgãos distintos, o que gera preocupação sobre decisões discrepantes. O temor apontado por especialistas é de que, para uma mesma estrutura de imposto, haja duas sentenças diferentes, ampliando a complexidade para o contribuinte. A crítica é procedente. Manoel Procópio, diretor de Programa da Secretaria Extraordinária da Reforma Tributária (Sert) do Ministério da Fazenda, afirmou que, idealmente, no plano técnico, a unificação das disputas tributárias seria uma solução viável e muito boa.
Pelo projeto de lei complementar enviado pelo Executivo ao Congresso, Estados e municípios terão uma estrutura própria de contencioso administrativo, que ficará no âmbito do Comitê Gestor, órgão responsável pelas decisões referentes ao IBS. Já o governo federal manterá as análises nas delegacias de julgamento e no Conselho de Administração de Recursos Fiscais (Carf), como ocorre atualmente. Unificar esses atos exigiria um alinhamento entre Receita Federal e entes federados. Se for um contencioso único, não há outra forma que não seja via Comitê Gestor, afirma a Associação Nacional de Fiscais de Tributos Estaduais (Febrafite). Ele é o único órgão constitucionalmente previsto para fazer o julgamento do IBS e da CBS, ao contrário do Carf. Os dois contenciosos estão adequados à realidade do IVA dual, que têm suas competências divididas. Por esse motivo, é importante a manutenção desse trecho da lei. Foi a escolha política do legislador ainda durante a elaboração da PEC (a Proposta de Emenda à Constituição, promulgada no fim de 2023).
Mesmo avaliando que a solução não foi tecnicamente a ideal, o Ministério da Fazenda, pondera que a existência de dois órgãos julgadores já significará um avanço em relação ao cenário atual. Hoje, o contencioso administrativo de Belo Horizonte (MG), por exemplo, não tem nada a ver com o de Sete Lagoas (MG), que não tem relação com o de Uberaba (MG) ou o de Juiz de Fora (MG). Isso dando o exemplo apenas de Minas Gerais, mas o mesmo vale para todo o País. Pela primeira vez, Estados e municípios terão legislação e estrutura únicas de julgamento. É um avanço absurdo. Há atenuantes para essa duplicidade de contenciosos, ou seja, de análise das disputas tributárias. Os técnicos conceberam dois ambientes em que irão mitigar ou até eliminar esse problema. Em referência à criação de um comitê e de um fórum de harmonização, os quais terão o objetivo de uniformizar interpretações e prevenir litígios. O consenso será vinculante para todo mundo.
O primeiro colegiado será formado por quatro representantes da Receita Federal e quatro do Comitê Gestor do IBS. Já o segundo terá quatro membros da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e quatro procuradores estaduais e municipais. Tributaristas e economistas temem, porém, que essas instâncias de harmonização não tenham poder e articulação suficientes para evitar decisões conflitantes e a criação de insegurança jurídica. Para a Warren Investimentos, essa ideia de um fórum para dirimir discrepâncias não tem o menor cabimento. Fórum se faz para debater academicamente, não para cuidar do comando de uma área tão sensível da arrecadação e do financiamento das políticas públicas de todo o País. O escritório Mattos Filho corrobora que se trata de um ponto de atenção na regulamentação da reforma. É algo para ficar atento, porque só falar que será integrado não resolve a situação. É preciso tomar cuidado para o contribuinte não ter os seus direitos feridos. Além dos dois contenciosos, haverá três esferas de fiscalização: uma municipal, outra estadual e uma terceira federal.
Se um auto de infração, no Acre, sobre um mesmo tipo de fraude, versar de modo distinto de um auto de São Paulo ou de Pernambuco? Qual vai prevalecer? questiona a Warren Investimentos. O deputado Mauro Benevides Filho (PDT-CE), que integra o grupo de trabalho que vai regulamentar esse trecho da reforma na Câmara, defende que o Comitê Gestor do IBS possa fazer essa harmonização de regras. Apesar de a legislação ser a mesma, não está claro onde se fará o entendimento comum entre os dois. Porque o auditor da Receita Federal (que regula a CBS) pode ter um entendimento e o auditor municipal e estadual (que regula o IBS) pode ter outro. Estuda-se a viabilidade de que o Conselho Gestor, em terceira instância, tenha competência para tal. Essa ideia ainda será levada aos demais integrantes do grupo, à equipe econômica e à Receita Federal. A única certeza é de que essa harmonização precisará ser feita sem envolver o Superior Tribunal de Justiça (STJ), uma vez que isso significaria sair da esfera administrativa e migrar para a judicial. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.