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28/May/2024

Mercado de Carbono muda paisagem na Amazônia

Debaixo do céu aberto e do sol forte das 11 horas da manhã, Josias Santos, 51 anos, respira fundo após tomar um pouco de água para aliviar o calor intenso. Com a manga da camisa, limpa o rosto sujo pelo suor misturado com a poeira fina que levanta da terra, ainda arenosa e seca, pouco antes da irrigação feita para receber as mudas de espécies nativas na área descampada que um dia foi pastagem de gado. Josias é um dos 20 trabalhadores que atuam na linha de frente, plantando muda por muda, em um projeto de restauração de uma área degradada de pouco mais de 8,3 mil hectares (ou 83 Km²) em Maracaçumé, divisa do Maranhão com o Pará. A função é nova para o ex-vaqueiro, que por 22 anos trabalhou nesse mesmo pedaço de chão, na Fazenda Entre Rios. A propriedade até há pouco tempo era voltada para a pecuária, assim como ainda são as demais fazendas vizinhas no município, que tem pouco mais de 20 mil habitantes.

A fazenda agora é uma das unidades da re.green, empresa que atua no mercado de crédito de carbono e tem no local sua primeira área na Amazônia Legal. A meta da empresa é restaurar 1 milhão de hectares de Mata Atlântica e Floresta Amazônica em 15 anos. Como comparação, o compromisso assumido pelo governo brasileiro internacionalmente, no Acordo de Paris, é de restaurar 12 milhões de hectares até 2030. A re.green opera no mercado voluntário de carbono, no qual vende créditos para empresas cumprirem compromissos climáticos que não estão sujeitos a obrigações legais de redução de emissões. Cada crédito vendido pela re.green corresponde a uma tonelada de gás carbônico capturado da atmosfera por meio de árvores. A companhia aposta em um segmento em que o crédito custa mais caro: o da restauração ecológica. Nele, áreas degradadas recebem mudas de plantas nativas. Outro segmento é o de projetos do tipo REDD+, que só podem ser desenvolvidos em áreas sob pressão de desmatamento.

Nesse modelo, o crédito corresponde a uma tonelada de CO2 que deixou de ser emitida. Para se ter esse crédito, engenheiros calculam o desmatamento médio da região. Se o dono da terra conseguir manter a mata nativa em pé, no ano seguinte tem a diferença convertida em créditos de carbono. A consultoria McKinsey calcula que a demanda voluntária por crédito de carbono deve crescer exponencialmente e esse mercado, pular do patamar atual de US$ 1 bilhão para US$ 50 bilhões em 2030. O Brasil pode abocanhar até US$ 15 bilhões desse total. Segundo a Boston Consulting Group (BCG), o Brasil está ainda em um estágio inicial desse mercado. O mercado voluntário de carbono em que a re.green atua avança no Brasil, mas não sem passar por dificuldades decorrentes de uma crise global de credibilidade.

A desconfiança no setor começou em janeiro do ano passado, quando o jornal inglês The Guardian, a revista alemã Die Zeit e a organização de jornalismo investigativo sem fins lucrativos SourceMaterial publicaram uma reportagem que mostrava que grande parte dos créditos de carbono reconhecidos pela Verra (a maior certificadora do mundo na área) não compensavam emissões como deveriam. O mercado regulado, por sua vez, depende do avanço de discussões no Congresso. É inaceitável o tempo que o País está levando para ter uma lei. De acordo com o projeto de lei que está em tramitação, o Brasil terá um sistema de comércio de emissões de gases semelhante ao adotado na União Europeia. Esse sistema se baseia no mecanismo de “cap and trade” (limite e comércio em inglês), em que são estabelecidas cotas de emissões para os entes regulados (empresas, por exemplo). Quem emitir menos toneladas de CO2 que sua cota pode vender a diferença para quem ultrapassou seu limite.

O projeto foi aprovado no Senado e encaminhado à Câmara no ano passado. Em dezembro, deputados fizeram alterações e, agora, o texto precisará ser novamente debatido por senadores e retornar à Câmara. No Senado, ainda não há um relator. O escritório Mattos Filho vê muito interesse do governo em aprovar com brevidade um projeto. No entanto, há um desalinhamento entre Senado e Câmara, e esse projeto está no meio de um bolo de diversas iniciativas que dependem de um certo consenso das casas para avançar. Outros atores envolvidos na discussão, porém, afirmam que o projeto interfere no mercado voluntário de forma negativa. Segundo eles, isso tem preocupado empresas do setor. Uma dessas regras é a de que créditos negociados no mercado voluntário e exportados para um país teriam de ser registrados pelo sistema brasileiro que vai organizar o mercado regulado sempre que esse país comprador quiser usar o crédito para reduzir as emissões com as quais se comprometeu no Acordo de Paris. Esse sistema brasileiro será administrado pelo governo federal.

Essa, porém, é apenas uma das discussões em torno do projeto de lei que cria o mercado regulado e que estão travadas desde o começo do ano. Segundo a Eccon, empresa que desenvolve projetos de carbono, o Brasil está regulando seu mercado de carbono, mas colocou muitos artigos no projeto de lei que não precisariam estar lá. O cenário agora é o de que não tem como o texto continuar tramitando. O Brasil estava com um debate mais maduro para regulamentar o mercado em 2023. No ano passado, às vésperas da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP), o governo deu celeridade ao projeto, cujo texto estava alinhado às expectativas do setor privado. Agora, porém, há incerteza sobre como isso se dará. De qualquer forma, ainda que o projeto seja aprovado neste ano, deve demorar para que o mercado comece a operar. O texto prevê, após a sanção do presidente, um prazo de até dois anos para a regulamentação. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.