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13/May/2024

Entrevista: Fernando Haddad - ministro da Fazenda

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, minimizou a divisão exposta no Comitê de Política Monetária (Copom) sobre o corte da taxa básica de juros (Selic), na semana passada. De um lado, os quatro indicados pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva votaram por uma redução de 0,50%. Em oposição, cinco diretores que estavam no Banco Central antes da chegada de Lula optaram por um corte menor, de 0,25%. O racha gerou desconfiança entre investidores e analistas, que veem risco de que o próximo presidente da instituição, a ser nomeado por Lula ainda neste ano, possa ser mais tolerante com a inflação para não bater de frente com os interesses do Palácio do Planalto. Haddad afirma acreditar que a diferença ocorreu no campo técnico, sobre uma mudança rápida de direção em relação ao que era esperado até então. Não tem uma bancada bolsonarista e uma bancada lulista no Banco Central, afirmou Haddad. Segue a entrevista:

A decisão do Copom expôs uma divisão entre os diretores indicados que já estavam no BC e os indicados pelo governo Lula. Como avalia o episódio?

Fernando Haddad: Eu não concordo com esse tipo de avaliação. Até em respeito aos profissionais que estão lá, não tem uma bancada bolsonarista e uma bancada lulista no BC. Eu acredito que a questão do guidance (orientação) tenha sido a razão da divergência. Vou esperar pela ata porque é uma impressão, não tenho um diagnóstico, mas creio que a divisão se deveu ao guidance. Havia o compromisso de tirar o plural (do número de cortes previstos na taxa de juros) e repensar a trajetória a partir de novos dados. Eu acredito que tenha sido essa a questão.

Mas, desta vez, a divisão ocorreu justamente entre os quatro indicados pelo presidente Lula, de um lado, e os cinco que já estavam no BC do outro.

Fernando Haddad: Tem de ler a ata para saber se minha impressão se confirma, de que o guidance foi importante. Vocês vão se lembrar que já fizeram matérias sobre a discrepância entre os comunicados e as atas várias vezes. Não cabe precipitação, vamos analisar com calma. A impressão que eu tenho é de que talvez isso tenha sido o objeto de debate. Havia um compromisso de tirar o plural e manter o guidance, e isso não foi observado.

Essa redução do ritmo preocupa em termos de crescimento da economia?

Fernando Haddad: A economia cresceu no ano passado com juros de 13,75% ao ano. Estamos seguros de que as medidas de crédito que nós estamos tomando, as medidas de ajuste, as negociações que estão sendo feitas… Às vezes, a pessoa pergunta: ‘Como resolver o fiscal?’ A verdade é que há dez anos não se resolve o fiscal. Teve o pseudossuperávit de 2022, mas tivemos dez anos de déficit, e penso que a agenda da Fazenda não deixa dúvidas sobre o nosso compromisso.

A divisão do Copom alimenta os temores de que o próximo presidente do BC pode não ser tão comprometido com a meta de inflação quanto Roberto Campos Neto, e coloca em dúvida a autonomia do BC. A autonomia segue como compromisso do governo Lula?

Fernando Haddad: Essa é uma leitura superficial e ideológica. E, sinceramente, acho que essa questão nem se coloca. Eu considero que as pessoas indicadas por nós são iguais ou melhores do que as que saíram do ponto de vista técnico, e não tenho dúvidas de que eles vão aportar um excelente trabalho.

O diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo, é favorito para a sucessão de Campos Neto?

Fernando Haddad: É uma atribuição do presidente Lula o nome e a oportunidade da indicação.

A ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, defendeu em entrevistas recentes a possibilidade de fazer a desvinculação dos benefícios previdenciários, que deixariam de estar atrelados ao salário-mínimo. Isso é uma agenda que a Fazenda abraça?

Fernando Haddad: Na verdade, o que aconteceu de prático sobre esse assunto até o presente momento foi a discussão de um texto sobre indexadores da Saúde e Educação. Naquela ocasião, houve uma discussão preliminar sobre isso, que não prosperou. Esse assunto, especificamente, não foi discutido no âmbito do governo. Eu não conheço a proposta, eu conheço o debate. Não vejo muito espaço, nessa seara, para discussão da questão do mínimo. Teve também um debate na época do envio para o Congresso da política de valorização do salário-mínimo, em que a Fazenda, aí, sim, defendeu que o indexador do mínimo fosse o PIB per capita. Essa posição da Fazenda foi vencida e o projeto de lei tem a orientação do primeiro governo do presidente Lula. Foi discutida essa política, houve o debate, mas a nossa posição de fazer o reajuste pelo PIB per capita não logrou êxito.

A Previdência é um grande ponto de pressão sobre o fiscal, no futuro das contas públicas. Tem algo que possa ser endereçado além dessas medidas?

Fernando Haddad: Por isso, estou peremptoriamente contra abrir mão de receita previdenciária. A Previdência tem um custo, e nós temos de buscar as fontes de financiamento para honrar os compromissos assumidos pelo País, o Congresso Nacional, o Executivo e assim por diante.

Simone Tebet tem falado de rever gastos, fazer uma agenda de reavaliação de despesas. Tem ambiente político para isso?

Fernando Haddad: Eu sou 100% a favor de que o Planejamento faça isso. Você pensa que o ambiente político para aprovar as medidas da Fazenda é favorável? O ambiente político você constrói à luz da justiça da medida, você tem de demonstrar para as pessoas que a medida é justa, mesmo que ela desagrade a determinados setores. Não é fácil nem aumentar a receita nem diminuir a despesa.

O mercado está com visão muito negativa do fiscal, com juros futuros maiores. O diretor de investimentos da Verde Asset, Luis Stuhlberger, falou da decepção dele sobre a avaliação que ele fez, ao acreditar que o PT teria seriedade fiscal…

Fernando Haddad: Eu respeito a opinião de qualquer cidadão. Mas tem de ver também o que está acontecendo com os negócios dele.

Mas o Armínio Fraga também falou criticamente, são duas pessoas que declararam voto em Lula, que participaram do esforço da frente ampla, como o sr. vê isso?

Fernando Haddad: Eu vejo com preocupação uma pessoa como o Armínio criticar a Moody’s. Uma pessoa que presidiu o BC recomendar a uma agência de risco rebaixar o Brasil é uma coisa inédita.

O sr. falou sobre ser contra o ajuste fiscal no ‘lombo do pobre’ e que isso tem de acontecer pelo andar de cima. Como promover esse ajuste pelo andar de cima quando se vê, por exemplo, o Congresso discutindo a PEC do Quinquênio?

Fernando Haddad: Acredito que nós devemos, até para sensibilizar as pessoas sobre a necessidade de racionalizar os gastos públicos, começar dando o exemplo. Várias vezes eu mencionei o projeto de lei dos supersalários. Acredito que qualquer mexida na Constituição, para cima ou para baixo, deveria contemplar o projeto de lei. Nós deveríamos constitucionalizar determinadas vedações, para que esses expedientes de furar o teto do salário sejam disciplinados de uma maneira decisiva. Porque, se ficar só no projeto de lei, amanhã alguém muda.

Como compensar a manutenção da desoneração da folha de pagamento em 2024?

Fernando Haddad: Vamos ter de fazer as contas para ver qual medida tomar.

E a desoneração para os municípios?

Fernando Haddad: Municípios eu penso que o problema é de outra natureza. Porque há alternativas que me parecem bem melhores do que corroer a base de arrecadação da Previdência. Eu penso que não é uma boa política você comprometer a Previdência.

Fonte: Broadcast Agro.