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26/Apr/2024

Brasil: soluções climáticas para todos os setores

O Acordo de Paris se fundamenta na ambição que os países apresentam em suas contribuições nacionalmente determinadas (NDC), como a resposta global para as mudanças climáticas. A somatória das 168 NDCs apresentadas até setembro de 2023 evidencia que os esforços para limitar o aumento de temperatura em no máximo 1,5ºC estão aquém do necessário. Se todas as ações forem adotadas será possível reduzir 5,3% das emissões globais até 2030, considerando os níveis de 2019, e de acordo com o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas é preciso chegar a 43%! A COP30, em 2025, será o momento de avaliar o novo grau de ambição.

Os países precisam atualizar suas metas e enviá-las para a Convenção do Clima até março de 2025. Isso permitirá calcular qual será o nível de ambição das metas climáticas até 2035 e, em alguns casos, até 2040. A atualização da NDCs ocorrerá em um momento peculiar, marcado pelas guerras, pela intensificação da crise do multilateralismo, mudanças políticas ao redor do mundo e um desconfortável abismo entre o que é preciso e o que é tangível em termos de recursos financeiros voltados para fomentar as ações climáticas apresentadas pelos países. Somente para transição energética, sem a qual não será factível alcançar os objetivos do Acordo de Paris, estima-se que é preciso em torno de 4 trilhões de dólares anuais.

O tema crucial da COP29, no Azerbaijão, será justamente acordar a nova meta quantificada de financiamento climático, o que envolverá definir várias fontes de recurso e "rotular" o que é elegível para financiamento alinhado a agenda climática, indo muito além das doações de países desenvolvidos. O fato de o Brasil sediar a COP30 faz com que os olhos do mundo se voltem para o País. A Conferência na Amazônia precisa reforçar o papel das florestas como solução climática. Mas é preciso ir muito além da mera conservação, trazendo os amazônidas para o centro, envolvendo os indígenas, ribeirinhos, populações locais, agricultores familiares, agricultores, a bioeconomia, os desafios de adaptação, do acesso à energia e do que implica promover o desenvolvimento sustentável em um bioma extremamente complexo.

A "COP tropical" precisa mostrar o Brasil inteiro! Engloba a Amazônia, naturalmente, mas todos os demais biomas e desafios que exigem planejar e fortalecer o desenvolvimento do País atrelado ao carbono. Neste sentido, a atualização da NDC, coordenada pelo Comitê Interministerial sobre Mudança do Clima, deve permitir mergulhar nas soluções climáticas que permitirão colocar o País em uma trilha de baixo carbono. A revisão dos planos setoriais de mitigação é o instrumento necessário para permitir propor novas metas. Em pleno 2024/2025, os países precisam pensar suas metas de 2031 a 2035 e, caso queiram, até 2040! No caso do Brasil, há uma questão de fundo que não pode ser menosprezada.

A meta atualizada até 2030 prevê zerar o desmatamento, para permitir chegar a um nível de emissões na casa de 1,2 Gt de CO2eq (1,2 giga toneladas de carbono equivalente). Nesse cenário, as novas metas terão como setores prioritários agropecuária, energia e indústria. Pensando na meta de neutralidade até 2050, são esses setores que serão responsáveis por equilibrar as emissões e remoções de carbono. Assumindo que as novas metas precisam ser mais ambiciosas, vale pensar que uma meta hipotética de cortar 60% de emissões considerando o patamar previsto para 2030 exigiria que o Brasil chegue em 2035 com emissões na casa de 480 Mt CO2eq (milhões de toneladas de carbono equivalente). De que forma cortar emissões e catalisar a economia?

Essa parece ser uma pergunta norteadora para a atualização da NDC. Partindo da premissa de que o crescimento econômico é desejável e o Brasil irá crescer, planejar a nova meta requer um exercício extremamente minucioso e importante, com visão de longo prazo, mesmo que a redução de desmatamento e a conservação de florestas ainda tenha um papel nas futuras metas. A descarbonização não é um fim em si mesmo, o que significa que cortar emissões prescinde da possibilidade de adotar inovação e novas tecnologias, de fomentar políticas que norteiem ações de mitigação e adaptação e, sobretudo, de financiar em escala o desenvolvimento de baixo carbono. Isso sugere que na COP30 o Brasil terá uma oportunidade peculiar para apresentar uma cesta de ações climáticas em todos os setores. Vale explorar algumas ações que precisarão integrar a nova NCD:

- A restauração de vegetação nativa terá um potencial fabuloso para capturar carbono e contribuir com as metas nacionais. Incentivar a restauração com base em diferentes políticas de financiamento, incluindo a geração de créditos de carbono com alta integridade ambiental. é um dos caminhos. Os estoques de carbono formados pela restauração deverão abater emissões no Inventário Nacional.

- Ampliar e fortalecer a agropecuária de baixo carbono, com base no Plano ABC+ 2020-2030, e sua revisão e aprimoramento periódico, será crucial para contribuir com as ações climáticas de agricultura e segurança alimentar. Há 141 NDCs que tratam de agricultura e o Brasil tem experiência e capacidade para transformar a agropecuária em um pool de soluções climáticas.

- Somente a recuperação de áreas degradadas, reabilitando áreas improdutivas e capturando carbono, com o programa de recuperar 40 milhões de hectares como está sendo construído pelo Ministério da Agricultura, terá um papel enorme no futuro das ações climáticas tropicais.

- O papel dos biocombustíveis será central para descarbonização brasileira. Etanol de cana e de milho, biodiesel, biogás e biometano de vários coprodutos e resíduos da agropecuária, precisam ganhar mais espaço e crescer na matriz energética.

- Em linha com o anseio de transição energética, a energia eólica e solar, incluindo projetos offshore, precisam ser catalisados. O fato de que a matriz energética já é 47% renovável não é uma escusa para não ampliar as fontes renováveis. Diversificar fontes de energias renováveis é saudável por diversas razões.

- A descarbonização da produção de energias fósseis é outro assunto que não pode ficar de fora. O debate sobre captura e estoque de carbono é uma condição para a meta de 1,5ºC de acordo com a Agência Internacional de Energia.

- Apoiar a indústria de baixo carbono é outro campo que não pode passar despercebido. Seja pelo uso de energia nos processos industriais, seja pelo enorme desafio de estimular o phase-out de tecnologias mais intensivas em carbono e o phase-in de tecnologias de baixa emissão.

A agenda climática é, como se fala no jargão das negociações, uma agenda econômica. Planejar a nova meta brasileira exige pensar o desenvolvimento do Brasil a partir de ações climáticas em todos os setores econômicos. A possibilidade de apresentar uma cesta de soluções climáticas "economy wide", como se fala no Acordo de Paris, exige um intenso planejamento conectado com os atores que implementarão essas ações. Ao longo da presidência do G20 e os caminhos até a COP30, o Brasil terá a oportunidade de exercitar o pragmatismo climático em prol do desenvolvimento, baseado nos desafios que incitam pensar e planejar uma economia inovadora e de baixa emissão de carbono. Fonte: Rodrigo C. A. Lima. Broadcast Agro.