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11/Jan/2024

As percepções sobre os mercados de commodities

A The Economist fez uma matéria que chamou minha atenção, mais pelo assunto, do que pelo conteúdo em si. O conteúdo, sobretudo no que diz respeito às menções feitas às commodities agrícolas (soja, milho, trigo), não me pareceu muito preciso. Mas a constatação de que o mercado de commodities de forma ampla (agrícolas, fertilizantes, minerais e energia) está calmo, me parece fazer sentido, sobretudo comparando 2023 com 2020 a 2022, anos que juntaram os efeitos da pandemia, da guerra Rússia-Ucrânia (que mexeu nos mercados agrícolas e de energia) e choques na oferta em algumas regiões do mundo. A matéria faz boa provocação tentando apontar fatores que podem alterar em 2024 esse ambiente de calma. Eles citam três: queda de taxas de juros nos Estados Unidos puxando crescimento na infraestrutura, condições adversas de clima no inverno do Hemisfério Norte (o que parece ter cada vez mais chances de acontecer) forçando a Europa a usar mais gás do que o planejado e comprometendo safras agrícolas na região, guerras, tais como a evolução de Rússia versus Ucrânia, mas também conflitos com Irã e países do Golfo, o que afetaria diretamente os preços do petróleo.

Os três fatores resultariam em aumentos nos preços das commodities mudando o cenário de aparente calmaria. Embora a matéria procure discutir este mercado de forma ampla, no fundo ela aborda algumas commodities, sobretudo petróleo e gás. Pouco se fala, e quando falou foi de forma imprecisa a meu ver, das commodities agrícolas. Essa predominância de petróleo e gás, e o menor foco nas agrícolas, decorre do tamanho do mercado destes grupos. Os valores exportados destas commodities demonstram as diferenças de tamanho. Usando dados de 2022, observamos que as exportações de petróleo foram de US$ 2,16 trilhão, gás natural US$ 661,9 bilhões e carvão US$ 239,4 bilhões. Já os valores das agrícolas são: cereais com US$ 251,9 bilhões, oleaginosas e farelos proteicos US$ 240 bilhões, café e energéticas US$ 123 bilhões e açúcar US$ 59,2 bilhões. Cereais e Oleaginosas e farelos têm ordem de grandeza semelhante a carvão, mas são muito menores do que gás natural e ainda mais que petróleo. Ou seja, as exportações de commodities ligadas ao mercado de energia são consideravelmente superiores do que as agrícolas.

Apenas olhar para um ano não é suficiente. A dinâmica das exportações com o passar do tempo mostra um filme interessante. Olhando de 2005 a 2022, 2005 foi escolhido como data de referência porque foi quando a China entrou com força no mercado internacional como compradora, a taxa de crescimento anual mostra que as commodities agrícolas são mais dinâmicas. O comércio de petróleo, gás e carvão cresceu a, respectivamente, 1,4%, 3,7% e 5,4% ao ano. Já as agrícolas, tirando açúcar, cresceram acima de 6% ao ano (exceção a cereais, que cresceu 5,6%). Se for pego um período mais curto (últimos dez anos) a mesma dinâmica se observa, embora os números de taxa de crescimento anual sejam diferentes. Nota-se que o carvão tem evolução equivalente ao das agrícolas, mas petróleo e gás crescem menos. Por outro lado, a série histórica mostra que a variabilidade nas commodities de energia é maior do que nas agrícolas. As agrícolas apresentam um crescimento mais estável ao passo que as de energia oscilam muito, inclusive com vários anos de queda.

O comércio de commodities de energia responde com mais vigor às oscilações de demanda. Em anos de baixo crescimento econômico, tendem a cair, ao passo que as commodities agrícolas oscilam mais por conta de choques na oferta. Anos de baixo crescimento afetam pouco o consumo de alimentos pois a população mundial continua a crescer. Conforme a matéria da The Economist afirma, de 2020 a 2022 os preços das commodities aumentaram consideravelmente, demonstrando crescimento de demanda, o que fez as exportações destes produtos aumentarem. As exportações de petróleo, por exemplo, dobraram, de gás triplicaram e de carvão quase triplicaram. Nem de longe algo parecido se viu no mercado de agrícolas, embora tenha havido um crescimento considerável. Assim, fica claro que a grande preocupação é mesmo com as commodities de energia porque preços e demanda delas, dado o tamanho dos seus mercados, têm grande efeito nos rumos da economia mundial. No entanto, as agrícolas também têm grande relevância e precisam ser olhadas com cuidado, sobretudo porque afetam a segurança alimentar.

Todas juntas representaram, em 2022, exportações de US$ 674 bilhões, o que é um valor muito expressivo. Dado que a matéria não deu pistas reais sobre o que pode acontecer com as commodities agrícolas em 2024, seguem as minhas percepções. Todas as atenções estão voltadas para a safra na América do Sul. A Argentina deverá ter uma safra grande de soja, se recuperando de dois anos de frustrações. Mas a safra brasileira é objeto de preocupações. Várias consultorias e analistas estão indicando que a produção de soja tem chances de ser menor do que safra passada, o que será uma quebra considerável em relação à área que foi plantada e a tecnologia colocada. A Abiove ainda trabalha com 160 milhões de toneladas, com base nos dados de dezembro, mas o começo da colheita em janeiro deverá alterar esse número. Há grande expectativa em relação ao quarto levantamento da Conab. Existem grandes chances de a safra de soja vir com produção inferior à safra 2022/2023. Diante das dificuldades no cultivo de soja no Centro-Oeste, a produção brasileira de milho 2ª safra de 2024 deverá ser consideravelmente menor do que de 2023. Ou seja, pode acontecer de o Brasil exportar menos milho no segundo semestre de 2024.

Dado que a safra de soja da Argentina deverá ser grande, ela compensará o Brasil no mercado internacional. O mesmo não deve acontecer com o milho. No entanto, como a nossa safra 2022/2023 foi muito grande, a quebra de 2023/2024 não deverá mexer muito com os preços mantendo, seguindo a linha de raciocínio da The Economist, a calmaria no mercado internacional, embora não haja qualquer calmaria para o produtor brasileiro das regiões com problemas climáticos. Que fique claro que 2024 é um ano difícil para eles. A safra 2024/2025 dos Estados Unidos, ainda não plantada, é um importante fiel da balança. O verão brasileiro com El Niño está sendo muito quente e com chuvas heterogêneas. Se algo semelhante acontecer nos Estados Unidos, os preços podem mudar. Por fim, é preciso olhar para a China. Não há razões para projetar comportamento da China no mercado de commodities em 2024 diferente de 2023. Assim, não se espera rupturas do lado da demanda. Minha conclusão: 2024 deverá ser normal para as commodities agrícolas, a despeito do fato de que será muito desafiante para o produtor rural brasileiro. Fonte: André Nassar. Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). Broadcast Agro.