ANÁLISES

AGRO


SOJA


MILHO


ARROZ


ALGODÃO


TRIGO


FEIJÃO


CANA


CAFÉ


CARNES


FLV


INSUMOS

08/Dec/2023

Mercosul: os desafios da Cúpula do Rio de Janeiro

As divisões internas têm sido evidentes. O Brasil tenta retomar uma posição de liderança com a defesa da integração regional, o Uruguai quer fazer negócio com a China, e já ameaçou sair do Mercosul se preciso for, mas o Paraguai reconhece Taiwan, que o governo chinês vê como parte do seu território, e a Argentina virou uma incógnita. É assim que os países sul-americanos chegam à Cúpula do Rio de Janeiro, com diferentes interesses para conciliar, alguns avanços, e impasses persistentes. No encontro de ministros, o Uruguai voltou a pressionar e defendeu que o Mercosul deve retomar os mecanismos de diálogo com a China, lembrando que a última reunião ocorreu há cinco anos. E sugeriu que, se o avanço não vier em bloco, pode vir pelo do Uruguai. O Uruguai quer todo o Mercosul com a China, mas se o Uruguai puder avançar primeiro, isso pode servir a todo o conjunto. O problema é que o Mercosul só faz esse tipo de acordo em bloco e tem priorizado o livre comércio com a Europa, não com a China.

Pressionado pelo Uruguai enquanto tenta reapresentar o Brasil como liderança regional, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva já sugeriu que a China poderia ser a próxima da fila, depois que o acordo com a União Europeia fosse concluído, o que não aconteceu. O apelo do Uruguai pode até impulsionar uma retomada das conversas com a China, que tem avançado na América Latina. Evidentemente, a China também tem interesse nesse fluxo comercial. É um país que aumentou a presença na região por meio da sua estratégia de política externa e isso poderia facilitar o contato com o Mercosul. Ainda que haja essa disposição para negociar, os entraves são muitos. A Fundação Getúlio Vargas (FGV) concorda que dá para esperar algum nível de articulação nos próximos anos, mas a passos lentos. O fato de o Paraguai reconhecer Taiwan é apontado como um dos principais empecilhos, somado à falta de articulação dentro do próprio Mercosul. Falta coordenação política. Mesmo que o bloco decida avançar para desenhar um acordo com a China, as visões do que seria um acordo ideal na perspectiva brasileira são muito diferentes do que o Uruguai vê como ideal ou que a Argentina verá como ideal.

E resta saber se o Brasil de fato tem interesse nesse acordo diante do difícil equilíbrio entre agricultura e indústria, que está entre os principais complicadores para a conclusão do acordo com a União Europeia. Se a indústria brasileira vai perder com a União Europeia, perderia ainda mais em acordo com a China. E a indústria já vem sendo dizimada. Então, se for um acordo focado em tarifas, como a China tende a fazer, o Brasil tenderia a perder; então não seria negócio para ninguém, mas isso no que diz respeito à perspectiva brasileira. Do ponto de vista da China, qualquer discussão de acordo é "impossível" já que Paraguai reconhece Taiwan. A única saída seria flexibilização do bloco para que Argentina, Uruguai e Brasil negociassem individualmente, sem essa amarra do Paraguai, que reconhece Taipei como governo oficial da China e não Pequim. O Mercosul, que começou como mercado comum, virou uma "união aduaneira imperfeita". Algo que ficou no meio do caminho entre o acordo comercial e a tarifa única. Como os quatro países fundadores do Mercosul possuem vantagens comparativas na área de commodities, a lista de exceções (à redução de tarifas) é muito grande.

Embora esses países tenham um comércio importante, há uma série de produtos que têm dificuldade para circular dentro do bloco. Então, não tem conseguido evoluir para união aduaneira de fato. Essa ideia foi reforçada pelo próprio Uruguai durante o encontro no Rio de Janeiro. O país reclamou que, mais de trinta anos depois, o Mercosul não conseguiu superar a etapa de eliminação de barreiras o que limita a mobilidade de bens e serviços. E mesmo assim, avançou para união aduaneira com a Tarifa Externa Comum e a unificação da política comercial para terceiros. Mais do que uma plataforma para inserção no mundo, foi priorizado o sentimento protecionista, que transformou em uma das regiões mais fechadas do mundo, criticou o Uruguai. As empresas uruguaias estão "decepcionadas" com o Mercosul. As barreiras não tarifárias se multiplicaram nos últimos anos, gerando graves perturbações econômicas. Basta olhar os números. É difícil discutir integração produtiva ou cadeias de valor regionais se não formos capazes de aprimorar o livre comércio.

O Brasil tem aproveitado o encontro no Rio de Janeiro para mostrar resultados dos seis meses que ocupou a presidência rotativa do bloco, mas reconhece que o comércio está aquém do desejável. O vice-presidente Gerald Alckmin comparou que, na União Europeia, cerca de 60% do comércio é feito intra-bloco e, no Mercosul, apenas 10%. A densidade do comércio intra-bloco é um sinal de avanço na integração, disse Alckmin, acrescentando que o número tem crescido, mas é preciso mudar esse quadro. Entre os resultados que o Brasil busca apresentar está o livre comércio com Singapura. Esse será o primeiro acordo fora do bloco em 12 anos e foi descrito pelo vice-presidente como "porta de entrada para Ásia". Analistas concordam que o acordo é importante, mas é também uma forma de responder às pressões internas por maior abertura comercial dentro do Mercosul. Houve um esforço, principalmente do Brasil, de acelerar esse processo para fazer com que o acordo saísses antes da Cúpula, como um gesto a esses países mais críticos ao Mercosul. Não é um passo tão grande, mas é um passo que ajuda a credibilizar o bloco para os seus associados.

Entre os avanços, o governo também tem destacado a expansão do Mercosul, com a entrada da Bolívia. No final do mês passado, a Bolívia recebeu o aval do Congresso brasileiro o último que estava pendente e agora deve formalizar a adesão ao bloco. O país tende a agregar como potência energética, dizem especialistas, mas não tem peso para influenciar nas disputas, principalmente, pela instabilidade que enfrenta internamente. Pensando nas capacidades do bloco, será um ator importante, mas não um país-chave para resolver os problemas imediatos que o Mercosul enfrenta. Por outro lado, o grande anúncio que era esperado para a Cúpula foi descartado: o acordo com a União Europeia. Os dois lados insistem que vão manter as negociações e ainda esperam tirá-lo do papel, mas a presidência da União Europeia vai rodar da Espanha (um dos grandes defensores do acordo) para a Bélgica a e eleição do Parlamento Europeu, em junho, encerra o que é visto como uma "janela de oportunidade". O que também foi apontado pelo Uruguai. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva lamentou o desandar das negociações entre Mercosul e União Europeia (UE) para o fechamento do acordo de livre comércio entre os blocos.

Lula disse que as tentativas devem continuar e pediu que o presidente do Paraguai, Santiago Peña, insista nas negociações. Lula criticou especificamente o protecionismo francês, a insistência europeia em fazer monitoramento do desmatamento e sua falta de concessões na discussão sobre compras governamentais. Lula conversou com quase todos os presidentes da União Europeia, com os negociadores, tentando mostrar a necessidade de fazer esse acordo. O presidente Lula afirmou que tinha um sonho de concluir o acordo durante sua presidência pro-tempore no Mercosul, que coincide com a do presidente Espanhol, Pedro Sanchez, que lidera a União Europeia. Lula destacou os esforços da diplomacia brasileira pelo fechamento do acordo e disse ter acreditado que poderia fechá-lo durante a Cúpula do Mercosul, essa semana, no Rio de Janeiro. Ele lembrou conversas com a presidente da União Europeia, Ursulla Von der Leyen, e com o presidente da França, Emmanuel Macron, em sua última viagem ao Oriente Médio. Lula lembrou que muitos países europeus são protecionistas em se tratando dos produtos agrícolas. Lula disse que a versão do acordo de 2019, negociada pelo governo Jair Bolsonaro, era "inaceitável".

Em seguida afirmou que os termos melhoraram, mas ainda assim não o suficiente do ponto de vista do Mercosul. Lula afirmou que a União Europeia não muda nada na questão industrial, destacando a questão das compras governamentais do Mercosul, as quais os europeus pleiteavam acessar de forma irrestrita. Lula, entretanto, disse que houve alguns avanços, lembrou que já conhecia a posição da Argentina e da França, mas que ainda acreditava no acordo. Lula afirmou ainda que estranha a resistência europeia e que o Mercosul só depende de alguma flexibilização da contraparte, como garantia de compra de algumas coisas com valor agregado. A respeito do desmatamento, Lula disse que a União Europeia tem de reconhecer a acuidade do sistema de monitoramento do Brasil. Esse é um dos pontos atuais de estremecimento nas negociações pelo acordo de livre-comércio entre os blocos. O presidente afirmou que o País leva a questão ambiental a sério, com um compromisso público de zerar a destruição florestal até 2030, que será cumprido. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.