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01/Dec/2023

COP28: entrevista com embaixador André do Lago

O Brasil terá de equilibrar alguns pratos na COP28. Por um lado, a delegação do País defenderá que os países assumam compromissos mais ousados para garantir que a alta da temperatura global não ultrapasse 1,5ºC na comparação com a metade do século XIX. Por outro, não terá uma postura incisivamente refrataria ao uso de combustíveis fósseis, um dos assuntos pelos quais o governo foi mais cobrado durante a Cúpula de Belém, em agosto. O embaixador André Corrêa do Lago, secretário de Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores, estará à frente de um time de negociadores climáticos do Itamaraty. Em entrevista, Lago defende que os países acelerem as substituições de combustíveis fósseis, mas admite limitações.

O Brasil adotou a ‘Missão 1,5ºC’ para garantir que os países se esforcem para manter a temperatura global abaixo disso. Que estratégias o País vai usar?

André Corrêa do Lago: Negociamos dentro de vários grupos, e adiantamos para esses grupos que iríamos propor isso. Vamos tentar no G-77 + China (grupo que reúne nações em desenvolvimento) conseguir.

O G-77 inclui países como a China, grande emissor de gases do efeito estufa. Como ter a adesão de países como esse?

André Corrêa do Lago: Tem de ser um esforço racional. Não tem de ser meramente declaratório. Estamos em emergência. Temos de acelerar meios de implementação, que são os recursos financeiros, mas também a ambição.

Cientistas dizem que para alcançar o 1,5ºC é preciso acelerar o fim do uso de combustíveis fósseis. Qual a posição brasileira?

André Corrêa do Lago: Aí entra um debate muito complexo, que não é necessariamente sobre o fim dos combustíveis fósseis. Tratamos de emissões, sejam elas de qualquer origem. Se os combustíveis fósseis puderem reduzir as suas emissões, será uma coisa que vai ajudar.

O senhor mencionou que é preciso posição equilibrada. O Brasil vai adotar esse meio do caminho?

André Corrêa do Lago: O Brasil defende sempre que, seja para hidrogênio ou qualquer solução energética, o importante é que a fonte emita pouco, cada vez menos. E, se possível, seja uma emissão negativa. Se o CCS (tecnologia de captura e armazenamento de carbono), que está sendo desenvolvida para o petróleo, se tornar economicamente viável e convincentemente eficiente, os biocombustíveis no Brasil passam a ter emissão negativa. Ou seja, os biocombustíveis passam a ter função que se tem no reflorestamento, no qual absorve o carbono que já existe. As tecnologias que servem para uns também podem servir para outros e podem ser extremamente positivas para o combate à mudança do clima.

Mas temos visto que há urgência na questão. Não é arriscado depender da evolução dessas tecnologias?

André Corrêa do Lago: A realidade é que hoje não pode parar os (combustíveis) fósseis, porque no curto e no médio prazo eles não são substituíveis na escala que seria necessário. No entanto, temos de acelerar a substituição. Há um esforço generalizado, mas precisamos acelerar. Tem várias soluções. Há 15 anos, ninguém no Brasil acreditaria nos números que temos hoje de (energia) solar e (energia) eólica.

Na Cúpula de Belém, houve desconforto entre Brasil e Colômbia na questão do petróleo (era debatido na época o plano da Petrobras de explorar a Foz). Como o Brasil pretende negociar em bloco, se há arestas a serem aparadas entre os próprios países amazônicos?

André Corrêa do Lago: Não podemos chamar de arestas. É uma questão de visão do futuro. Apostar em parar de explorar petróleo: esse debate ainda não está muito maduro. Há pouquíssimos países que têm potencial de produzir petróleo que estejam anunciando isso. Pode dar datas. Por exemplo: as petroleiras estão dizendo que serão carbon neutral em 2050. A própria Petrobras já disse. Há esforço muito grande nesse sentido de redução dos fósseis.

Historicamente, o Brasil tem papel de mediador entre países ricos e pobres. Mas o presidente tem assumido fala dura, de cobrança do financiamento pelas nações desenvolvidas.

André Corrêa do Lago: O presidente pode cobrar, porque ele está fazendo a parte do Brasil. Não há só o combate ao desmatamento, mas um governo com o Plano de Transformação Ecológica (capitaneado pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad).

A agropecuária é estratégica para o Brasil, mas às vezes o setor critica o presidente, em outras ele critica o setor. Isso traz uma visão menos coesa sobre compromissos para a comunidade internacional?

André Corrêa do Lago: Há diálogo construtivo entre os dois mesmo que de vez em quando tenha uma declaração menos simpática de um lado ou do outro. A realidade é que tanto o governo como o agronegócio querem exatamente a mesma coisa: que o setor cresça, que o Brasil exporte mais, que seja referência mundial.

Como a diplomacia brasileira tem atuado para ajudar a vencer resistências na concretização do acordo com a União Europeia?

André Corrêa do Lago: A melhor resposta é sempre a verdade. Há uma campanha de desinformação por um lado, dos interesses europeus que querem restringir as importações do Brasil. Mas também, por outro lado, há uma realidade no Brasil que queremos mudar, porque existem várias coisas que ainda não estão como deveriam estar. O mais importante é que não há dúvida do desejo do governo de tornar o Brasil um símbolo da sustentabilidade. E não há dúvida do agronegócio de querer ser visto como sustentável. O que não podemos é deixar com que uma minoria do setor agrícola no Brasil, que não cumpre com os padrões que deveria cumprir, estrague a reputação da esmagadora maioria que cumpre com o padrão que o Brasil quer e que o transforma numa grande referência.

Fonte: Broadcast Agro.