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03/Oct/2023

Mudanças Climáticas: Planeta vive era de extremos

O secretário-geral da Organização das Nações Unidas (ONU), António Guterres, reforçou o alerta na abertura do debate principal da 78ª sessão da Assembleia-Geral em setembro. Em todo o mundo, observa-se não só a aceleração das temperaturas, mas também a aceleração do aumento do nível do mar, o recuo das geleiras, a disseminação de doenças mortais, a extinção de espécies e cidades ameaçadas. E isso é apenas o começo. A previsão de Guterres é a mesma reiterada inúmeras vezes pela ciência. É também a mesma que os pesquisadores fazem antes de ressaltar que a janela de chances para livrar o planeta da catástrofe ainda está aberta, mas quase se fechando. Nas últimas semanas, uma série de informações (e recordes climáticos) que surgiram deram o alerta: as mudanças climáticas já afetam a rotina em todo o mundo. Como o próprio Guterres disse há dois meses, “a era da ebulição global” chegou. O Laboratório Nacional do Noroeste do Pacífico observa que o aumento recente das anomalias de temperatura pode ser um sinal de que as influências humanas e as flutuações naturais estão agindo em conjunto para elevar as temperaturas globais.

O último mês de agosto foi o mais quente já medido pela Agência Oceânica e Atmosférica dos Estados Unidos (NOAA), em 174 anos. Em julho, a temperatura global bateu o recorde por três dias seguidos e uma onda de incêndios se espalhou pelo mundo. No Canadá, a fumaça da queimada florestal pôde ser vista do espaço. Nos Estados Unidos, a ilha havaiana de Maui teve o incêndio mais mortal do último século. Ao todo, 101 pessoas morreram. Na Europa, Itália, Espanha e Grécia sofreram com as chamas descontroladas. A Grécia registrou o maior incêndio da União Europeia, com ao menos 21 vítimas. O problema não se restringe à terra firme. Desde abril, a superfície do mar tem visto novas marcas máximas em relação à média padrão. Por enquanto, os oito primeiros meses de 2023 fazem deste o ano com a maior anomalia climática nos oceanos desde meados do século 19. E o El Niño ainda nem atingiu seu pico, o que deve acontecer em novembro ou em 2024.

Isso já garante que o próximo ano terá mais gasolina sendo despejada no fogo. Os pesquisadores observaram na semana passada recorde histórico negativo de gelo marinho na Antártida. E os cientistas ainda consideram que o mesmo gelo marinho deve desaparecer do Ártico na próxima década. A empresa de pagamento Stripe observa mais três fatores contribuintes para o quadro atual: redução das emissões de navios, permitindo que mais luz solar alcance os oceanos; erupção de 2022 do vulcão submarino Hunga Tonga no sul do Pacífico, que enviou grandes quantidades de vapor de água para a atmosfera; aumento contínuo na atividade solar, elevando ligeiramente o efeito de aquecimento do Sol na Terra. As anomalias de temperatura são notáveis por serem ainda mais aberrantes agora do que o calor extremo observado em todo o mundo em julho e agosto. Por uma grande margem de 0,71ºC, este verão no Hemisfério Norte foi o trimestre mais quente do planeta nos registros que remontam a quase dois séculos, disseram cientistas climáticos europeus.

A conclusão inevitável é que setembro marca o terceiro mês consecutivo de temperaturas globais médias recordes. Se as temperaturas permanecerem anormalmente altas como estão agora, a média planetária poderia pela primeira vez em base anual superar 1,5ºC de aquecimento acima das temperaturas pré-industriais. Essas anomalias de temperatura aumentaram mesmo quando, em termos absolutos, o planeta se resfriava antes do equinócio de 23 de setembro, que marca o início do outono no Hemisfério Norte. As condições no Hemisfério Norte têm efeito maior nas médias planetárias, pois ele contém mais terra do que o Hemisfério Sul, e a terra esquenta e esfria mais rapidamente do que os oceanos. Só que o problema não se restringe ao norte global. É uma espécie de ‘tempestade perfeita’, no pior sentido do termo. O El Niño deste ano encontrou um planeta cada vez mais quente e assolado pelos efeitos das mudanças climáticas. Nesse cenário, a chegada do fenômeno climático, que aquece as águas superficiais do Oceano Pacífico, com repercussões em todos os continentes, ‘é como jogar gasolina no fogo’.

Não à toa, a temperatura global bate recordes sucessivos em 2023 e o clima do planeta se torna imprevisível. Segundo o Laboratório de Gases de Efeito Estufa, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), os eventos extremos serão cada vez piores e mais intensos. Está aumentando a frequência do El Niño e esses fenômenos também estão ficando mais quentes. O El Niño é conhecido por elevar as temperaturas planetárias em 0,1ºC a 0,2ºC. Em 2015 e 2016, o fenômeno foi tão forte que ganhou o apelido de “El Niño Godzilla”. Uma pesquisa publicada na revista Nature revela o tamanho do estrago na Amazônia após a passagem dessa “criatura”. Ainda que não tenha superado o de 1997 e 1998 na escala de problemas, foi o suficiente para, por exemplo, fortalecer a epidemia de Zika na América do Sul e, na floresta tropical, desencadear condições perfeitas para enormes incêndios, como os registrados na porção norte do bioma, e levar a estiagem severa, capaz de secar quase inteiramente o lago da Hidrelétrica de Balbina, no Amazonas, o que causou desabastecimento e insegurança alimentar às comunidades ribeirinhas. E desta vez, ele pode ser ainda mais forte, como mostram os temporais no Rio Grande do Sul e a seca na Amazônia.

E os efeitos são não só materiais, mas psicológicos. A chamada ecoansiedade também afeta os herdeiros das ações que vierem a ser tomadas hoje. Estudo publicado na revista científica The Lancet Planetary Health ouviu 10 mil adolescentes e jovens (de 16 a 25 anos) em dez países: Austrália, Brasil, Finlândia, França, Índia, Nigéria, Filipinas, Portugal, Reino Unido e Estados Unidos. Do total de entrevistados, 59% se disseram “muito” ou “extremamente” preocupados, 84% estavam pelo menos “moderadamente preocupados”. Mais de 50% dos jovens relataram cada uma das seguintes emoções: tristeza, ansiedade, raiva, impotência, desamparo e culpa. Mais de 45% dos entrevistados disseram que seus sentimentos sobre as mudanças climáticas afetaram negativamente sua vida. Segundo a Woodwell Climate Research Center, décadas de queima de combustíveis fósseis e desmatamento emitiram gases de efeito estufa na atmosfera, e a grande maioria desse calor é absorvido pelos oceanos. Agora, pode-se ver a ira desse calor.

É preciso agir ousadamente para reduzir as emissões a fim de evitar o máximo possível de aquecimento e os impactos desse calor. O último relatório do Painel Intergovernamental sobre o Clima (IPCC), das Nações Unidas, divulgado neste ano, aponta que algumas das mudanças climáticas futuras são inevitáveis ou irreversíveis, mas podem ser limitadas por alterações rápidas e de redução sustentada das emissões globais. O documento aponta a necessidade de mudanças na forma de produção de alimentos, eletricidade, transportes, indústria, construções e uso do solo, além de indicar medidas como a ampliação do acesso à energia e tecnologias limpas. Não por acaso, na sequência IPCC e ONU falaram na necessidade de uma Agenda de Aceleração contra as mudanças climáticas. Essa prevê dos países ricos compromisso de atingir a neutralidade de emissões o mais próximo possível de 2040 e os países em desenvolvimento o mais próximo possível de 2050.

Pela proposta, seria eliminado o uso do carvão e neutralizada a produção de eletricidade até 2035 para todos os países desenvolvidos e 2040 para o resto do mundo. A sugestão prevê a interrupção de novas licenças e fundos para indústrias de petróleo e gás e qualquer expansão do petróleo e reservas de gás. Outras medidas sugeridas são a proteção das comunidades mais vulneráveis, com mais fundos, capacidades de adaptação para perdas, danos e promoção de reformas para garantir o apoio de bancos multilaterais de desenvolvimento em caso de tragédias. Este foi o último relatório do IPCC previsto para esta década, o que significa que o próximo encontrará o planeta irreversivelmente condenado à catástrofe climática, ou ainda respirando? Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.