03/Oct/2023
O dólar se recuperou com força total no terceiro trimestre, ameaçando a complicada tarefa dos bancos centrais globais de reduzir a inflação e, ao mesmo tempo, proteger o frágil crescimento econômico. O dólar subiu quase 6% desde meados de julho e na semana passada encerrou seu melhor trimestre desde o outono passado no Hemisfério Norte, quando estava no meio de uma recuperação que só acontece uma vez em uma geração. Algumas moedas de mercados emergentes foram especialmente atingidas, com o dólar subindo 11% face ao peso chileno e 8% frente face ao florim húngaro. A força do dólar foi impulsionada pelo aumento dos juros dos títulos do Tesouro Norte-Americano, que na semana passada saltaram acima de 4,6%, para um novo máximo em 16 anos.
Os investidores estão cada vez mais convencidos da resiliência da economia dos Estados Unidos, e que o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) irá provavelmente manter os juros em alta por mais tempo do que faria num ciclo econômico típico. Qualquer grande movimento cambial produz vencedores e perdedores. Nos Estados Unidos, um dólar forte é politicamente popular e, em grande parte, bom para os consumidores, porque reduz a inflação ao manter sob controle os preços das importações e torna as viagens ao estrangeiro mais baratas. Para o resto do mundo, contudo, a retomada do dólar forte é um movimento amplamente indesejável. Em muitos países, as taxas de juros estão nos níveis mais elevados dos últimos anos ou décadas, aumentando já o risco de stress financeiro. A combinação de taxas altas, moeda norte-americana forte e preços elevados do petróleo significa crescimento em baixa em todo o mundo e mais vulnerabilidade financeira.
As empresas norte-americanas com grandes negócios no estrangeiro, como a Apple, também são atingidas, à medida que o valor de suas receitas no exterior cai em moeda norte-americana e seus produtos se tornam mais caros para os estrangeiros. O dólar forte está ultrapassando as expectativas. Segundo o ING, está começando a se tornar um problema novamente. O dólar ainda é, de longe, a moeda mais utilizada no comércio e nas finanças globais, o que significa que suas flutuações repercutem muito fora dos Estados Unidos. As matérias-primas, como o petróleo ou o trigo, são geralmente cotadas em dólares. E governos, empresas e famílias em todo o mundo contraem empréstimos de trilhões na moeda dos Estados Unidos. Quando o valor do dólar aumenta, fica mais caro para outros comprarem produtos importados ou pagar suas dívidas.
Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), os mercados têm consistentemente tentado precificar cenários otimistas associados a um dólar mais fraco e continuam surpresos com o fato de a realidade não ser tão boa. O dólar forte será negativo para os mercados emergentes e para o comércio global. Pelo menos até agora, os danos têm sido menos generalizados do que no ano passado, quando a subida do dólar levou a uma liquidação histórica de ativos dos mercados emergentes e fez países como Sri Lanka e Gana mergulharem em crises econômicas graves. Nos últimos meses, as moedas da América Latina e da Europa Oriental foram duramente atingidas. Os bancos centrais do Brasil, da Polônia e da Hungria começaram a cortar as taxas de juros depois de terem sido elogiados por sua rápida ação para apertar a política monetária em 2021, bem antes do Fed e de outros bancos centrais de mercados desenvolvidos.
Estão agora sob pressão para interromper ou abrandar os planos de redução das taxas para evitar mais pressões sobre as suas moedas. Um dólar mais forte é sentido amplamente nos mercados emergentes. Um artigo mostrou como o choque de uma forte subida do dólar leva a um desempenho econômico insatisfatório que dura anos nas economias menos desenvolvidas. O consumo, a produção, o investimento e os gastos do governo ficam todos sob pressão juntamente com a moeda local. É um golpe duplo. O país é afastado de sua meta de crescimento e, ao mesmo tempo, de sua meta de inflação. Alguns bancos centrais globais recorrem a reservas de moeda estrangeira para ajudar a reforçar as suas moedas. Outros ameaçam fazer isso. O Ministério das Finanças do Japão prometeu, no dia 29 de setembro, tomar medidas contra as quedas acentuadas do iene, que está perto de 150 por dólar.
O valor está próximo do nível que no ano passado estimulou a primeira intervenção do Banco do Japão no mercado em 24 anos para comprar ienes. Serão tomadas medidas apropriadas contra movimentos excessivos sem descartar quaisquer opções. Tanto a Suíça como a Coreia do Sul venderam reservas em moeda estrangeira para reforçar as suas moedas, o franco e o won. A China está ajudando a sustentar o yuan, que caiu para o nível mais baixo em 16 anos em setembro, ao fazer com que os bancos estatais vendessem dólares. Os investidores esperavam, em grande parte, que o dólar enfraquecesse este ano, à medida que o Fed encerrava sua campanha mais agressiva de aumentos das taxas de juro desde a década de 1980. No primeiro semestre deste ano, moedas como a libra esterlina e o euro se recuperaram de quedas brutais em 2022. Mas o euro, que ultrapassou os US$ 1,10 durante o verão no Hemisfério Norte, caiu para US$ 1,05, à medida que a economia da zona euro estagna e as preocupações com a sustentabilidade da dívida nas frágeis economias do sul, como a Itália, ressurgem.
Muitos investidores ainda esperam que a sequência de décadas de ganhos do dólar, que o deixou pelo menos 10% sobrevalorizado segundo muitas estimativas, esteja chegando ao fim. Um fator poderá ser o enfraquecimento do crescimento norte-americano. Os consumidores dos Estados Unidos estão esgotando seus mais de US$ 2 trilhões em poupanças da época da pandemia e espera-se que a retoma dos pagamentos de empréstimos estudantis prejudique ainda mais o consumo. A taxa de desemprego, embora ainda perto de mínimos históricos, está aumentando. Segundo a Pictet Asset Management, o crescimento dos Estados Unidos deverá ficar em linha com o do resto do mundo em 2024. A recente recuperação do dólar é o último ‘grito’ antes de um declínio significativo no próximo ano. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.