21/Sep/2023
A Proposta de Emenda à Constituição 03/2023, que submete financiamentos de bancos públicos à exportação ao crivo Nacional tem forte resistência do governo federal, sobretudo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Segundo o BNDES, embora o texto mire financiamentos do banco à exportação de serviços para outros países, ele vai, na prática, criar barreiras à liberdade econômica de empresas e bancos privados, inclusive porque repercute sobre financiamentos à exportação de bens, que ocorrem regularmente no Brasil e têm sido intensificados sob o governo Lula. A PEC atinge qualquer exportação, é geral. Exportações da Embraer, do setor de ônibus, de equipamentos de energia eólica, incluindo linhas de pré-embarque, tudo teria que passar pelo Congresso (se a PEC for aprovada). Assim como as operações que contam com recursos conjugados de bancos privados. É clara restrição à liberdade econômica do setor empresarial e financeiro.
Parte do debate legislativo está viciado por um entendimento "equivocado" de que o governo federal pode usar o BNDES para emprestar a países alinhados ao PT, mas que não têm capacidade de pagamento, como Cuba e Venezuela. Movido por essa preocupação pontual, a PEC 03, proposta pelo deputado Mendonça Filho (União), teria efeitos mais amplos, limitando os empréstimos para exportação de bens e dificultando ainda mais o objetivo do BNDES de retomar as exportações de serviços, interrompidas desde 2016. Somados, Cuba e Venezuela têm um débito vencido de US$ 973 milhões, considerando dados do BNDES até junho. São empréstimos do BNDES a empresas brasileiras, sobretudo Odebrecht, para construir infraestrutura como o Porto de Mariel, em Havana, e o metrô de Caracas. Completa a lista de devedores Moçambique, com US$ 122 milhões não pagos. Embora fossem feitos em reais a empresas brasileiras para que atuassem no exterior, essas dívidas tinham garantia soberana desses países e o não pagamento acarretou a compensação do Banco pelo Fundo de Garantia à Exportação (FGE), da Fazenda brasileira.
O BNDES reconhece que as dívidas são problemáticas, mas argumenta tratar-se de exceções. De fato, desde 1998, o BNDES já desembolsou US$ 10,4 bilhões para exportação de serviços a 15 países, quase todos latino-americanos, dos quais 12 honraram ou têm honrado obrigações. Somando às operações para serviços os empréstimos com foco em exportação de bens, os desembolsos totais chegam a US$ 100 bilhões desde 1991, sendo 20% destinados a operações envolvendo os Estados Unidos. Isso mostra que a prática do BNDES não é ideológica. Ideológicas são as críticas. Ainda assim, é necessário aperfeiçoar o mecanismo de financiamento à exportação de serviços do BNDES. Por isso, técnicos do banco trabalham em um projeto de lei com esse fim, a ser apresentado ao Congresso pelo governo.
Espécie de reação à PEC, o PL vai prever a proibição de financiamento envolvendo países inadimplentes com o BNDES ou governo; a criação de um braço específico voltado ao apoio à exportação, um "Eximbank" com CNPJ e corpo de funcionários próprios cedido pelo BNDES; além da previsão de apresentações periódicas das operações no Congresso Nacional. Quanto à vedação a inadimplentes, as regras do banco já contemplam, mas a ideia é colocar isso em lei. Esse caminho de aperfeiçoamento não pode passar pela criação de mais barreiras a essas operações de apoio às empresas, que têm se tornado cada vez mais agressivas no mundo. A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) está flexibilizando regras para o financiamento à exportação de serviços para competir com a China, enquanto O Brasil discute o caminho contrário. O Brasil sempre vendeu ônibus para o Chile, mas a última licitação de Santiago foi (vencida) 100% chinesa. A China chegou com o produto e o financiamento prontos. A exportação de serviços é estratégica, porque, na média, 35% dos montantes envolvidos dizem respeito a bens. Essa modalidade carrega bens com ela.
O BNDES lembra que mais de 90 países no mundo têm mecanismos de apoio à exportação de bens e serviços parecidos com os do BNDES e do FGE e, na média, a participação do setor público nessas operações é de 8%, enquanto no Brasil está em apenas 0,3%. Nos casos de Coreia do Sul, China e Turquia, isso chega a 20%. Em 2010, o BNDES chegou a financiar exportações com R$ 11 bilhões, montante que recuou para a casa dos R$ 600 milhões no ano passado e vem sendo gradualmente recomposto. Só no primeiro semestre deste ano, já foi superado o total de 2022 desembolsado para exportações. Na CCJ, presidida pelo deputado Rui Falcão (PT-SP), o governo perdeu as disputas para retirar a PEC 03 da pauta, mas conseguiu postergar sua votação, o que deu tempo à articulação com a base, recém-ampliada pela reforma ministerial. O resultado segue em aberto, mas há tratativas com parlamentares de legendas como PP, PSD e Republicanos que eram simpáticos ao texto. Se houver o aval da CCJ, o texto será analisado por uma comissão especial quanto ao mérito e, se aprovado, seguirá para o plenário, onde será votado em dois turnos. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.