ANÁLISES

AGRO


SOJA


MILHO


ARROZ


ALGODÃO


TRIGO


FEIJÃO


CANA


CAFÉ


CARNES


FLV


INSUMOS

25/Aug/2023

Brasil e os desafios para cumprir o Acordo de Paris

De acordo com estudo inédito do Fórum Econômico Mundial em parceria com a consultoria Oliver Wyman, “Encontrando Caminhos, Financiando a Inovação: Enfrentando o Desafio da Transição Brasileira”, o Brasil vai precisar de investimentos da ordem de R$ 1 trilhão para alcançar os compromissos de redução de emissão de carbono até 2030. O desafio, porém, não é só financeiro. Após nove meses de encontros com os maiores nomes do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, além de representantes do governo e da academia, a conclusão do Fórum é de que o País precisa consolidar uma “narrativa comum” para atrair investimentos e guiar o setor privado, especialmente após as “mensagens mistas” emitidas no último “par” de anos. Embora os detalhes do Plano de Transformação Ecológica (PTE) do governo façam falta, a expectativa é de que o Brasil tenha sucesso nos próximos fóruns internacionais para recuperar o protagonismo na agenda ambiental, uma das principais bandeiras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

É urgente, contudo, reverter o desmatamento ilegal e agir na transição do setor agropecuário. A expectativa é de que essa “narrativa comum” seja articulada pelo governo brasileiro na Assembleia-Geral das Nações Unidas (ONU) em setembro, em que o Brasil tradicionalmente faz o discurso de abertura, e na Conferência do Clima (COP), em novembro, em Dubai. Em Dubai, para a COP deste ano, a expectativa é de que o Brasil terá uma narrativa atraente para contar. O relatório reconhece que o País está, neste momento, buscando recuperar o papel de liderança que tinha nos primeiros anos do século 21, com o PTE, que inclui o projeto do mercado regulado de carbono e a iniciativa para a criação de uma taxonomia nacional, e com o Comitê Interministerial de Mudança do Clima. O compromisso do Brasil em combater a mudança climática está se fortalecendo. Mas, os detalhes do Plano de Transformação Ecológica fazem falta. O governo pretende apresentá-los ainda neste mês.

Quando se trata do governo, a indústria diz que precisa dos incentivos certos e de taxonomia. Isso ainda está faltando. Conforme o compromisso atual no Acordo de Paris, a meta do Brasil é reduzir em 50% as emissões de carbono até 2030, tendo como base os níveis de 2005. Em 2050, chegaria à neutralidade. O País era o sexto maior emissor de gases de efeito estufa do mundo em 2019, sendo responsável por cerca de 3% das emissões globais. Uma das principais conclusões do estudo é de que os setores produtivos precisam de maior clareza sobre os caminhos específicos que têm de trilhar para chegar às suas metas individuais de redução de emissão de carbono, que ainda não foram definidas e precisam de uma articulação do governo. Particularmente, é urgente encaminhar a transição do setor agropecuário, segundo maior responsável pelas emissões de gases de efeito estufa no País, uma particularidade em relação a outras economias do mundo.

O principal culpado é o desmatamento, que cresceu nos últimos anos e alcançou os maiores níveis em mais de uma década em 2021, manchando a imagem ambiental do País durante o governo de Jair Bolsonaro. Juntos, o agro e o desmatamento, também impactado pelo avanço da fronteira agrícola e por atividades como o garimpo ilegal, representam 70% das emissões brasileiras. Segundo a Oliver Wyman Brasil, os padrões das emissões no Brasil são muito diferentes da China, Estados Unidos e Europa por causa da matriz energética renovável. Por isso que agricultura e desmatamento são tão importantes para o Brasil. A indústria ainda é importante, mas será possível ao País atingir seus compromissos se for capaz de controlar o desmatamento e migrar para uma agricultura de baixo carbono. O principal desafio quando se trata da descarbonização do setor agrícola é balancear as prioridades.

A questão é que a transição do setor precisa ocorrer ao mesmo tempo em que o mundo enfrenta uma crise de segurança alimentar, e o Brasil é um grande fornecedor global. A decisão é do governo. Um dos maiores desafios da agenda de transição no Brasil, porém, é o dinheiro. Serão necessários recursos estrangeiros, financiamento dos bancos brasileiros e algum suporte do governo, o que preocupa em meio à forte restrição orçamentária do País, para alcançar o montante trilionário estimado para bancar a transição climática. O estudo pontua que o Brasil precisa também sofisticar os instrumentos financeiros, aumentando a emissão de títulos vinculados à agenda ambiental, social e climática (ESG). Nesse sentido, o título verde que o Tesouro Nacional pretende levar a mercado entre setembro e novembro deve ser importante, mas não suficiente. Para convencer o capital privado internacional, o relatório do Fórum Econômico Mundial deve ser um importante instrumento. É por isso que a narrativa é tão central.

Quando se articula o papel que o País quer desempenhar, traz bastante segurança para os investidores estrangeiros, que receberam mensagens mistas sobre o compromisso do País nos últimos anos. Apesar de todos os desafios listados no relatório “Encontrando Caminhos, Financiando a Inovação: Enfrentando o Desafio da Transição Brasileira”, o Fórum Econômico Mundial acredita que as oportunidades do Brasil são bastante “únicas”, colocando o País como um grande candidato para ser “campeão” na agenda climática. Uma das principais mensagens do relatório está nas entrelinhas: a oportunidade é "boa demais para ser desperdiçada”. Há um pouco de competição entre as economias sobre quem será a campeã na transição verde e sustentável e o relatório destaca a oportunidade que o Brasil tem. Apesar dos vários desafios, as oportunidades do Brasil são únicas e o País se adiantou de alguma forma comparado especialmente às economias emergentes.

O relatório é resultado de um trabalho de nove meses conduzido pelo Fórum em parceria com a consultoria Oliver Wyman. Desde outubro, foram promovidos workshops com a presença de empresários, membros do governo e especialistas, além de entrevistas individuais, para tentar entender quais eram os principais desafios do Brasil para financiar a transição climática e cumprir os compromissos assumidos no Acordo de Paris. O País é considerado um caso representativo para avaliar a situação dos demais emergentes. Antes, o Fórum fez uma análise global, com foco maior em países desenvolvidos, e uma pesquisa sobre a China. O perfil único do Brasil se deve à baixa contribuição de setores como de setores industriais, de geração de energia e de transporte nas emissões brasileiras, ao contrário do resto do mundo, devido, por exemplo, à matriz renovável de energia e o potencial na área de biocombustíveis.

Isso representa uma oportunidade de o Brasil se tornar um hub global de soluções verdes, diz o estudo, citando como exemplos energia limpa e commodities de baixo carbono. Mas, o relatório pondera que o Brasil não pode se acomodar. A posição privilegiada hoje é fruto de políticas do passado e para se manter firme na disputa global pelo protagonismo da agenda ambiental é preciso investir mais. Até porque as outras economias estão correndo por fora e anunciando grandes investimentos, baseados em planos concretos para a transição climática. Nos Estados Unidos, o governo prometeu investir US$ 387 bilhões dentro do Ato de Redução de Inflação (IRA) em iniciativas sustentáveis. Na União Europeia, os países decidiram destinar 37% dos recursos do programa criado para dar suporte ao bloco após a pandemia de Covid-19 para financiar objetivos climáticos. O Chile está à frente do Brasil na apresentação de estratégias claras, como a relativa ao hidrogênio verde.

Os Estados Unidos têm o IRA, a China também está colocando recursos na agenda de transição. É um desafio para o Brasil quanto de dinheiro ou qual é o montante de subsídios que o governo brasileiro vai conseguir mobilizar para dar suporte a essa agenda. Mas, ainda tem o Plano de Transformação Ecológica para ser anunciado. Para o Brasil não perder a oportunidade, além da narrativa comum, da definição de metas para os setores e da atração de investimentos, o País também precisa dar atenção às pequenas e médias empresas e à educação da população sobre o assunto, conclui a análise do Fórum e da Oliver Wyman. A importância das pequenas e médias empresas na cadeia de suprimentos foi uma das peculiaridades e surpresas encontradas na análise brasileira. Assim, para que as iniciativas de transição das grandes indústrias tenham sucesso, é fundamental “educar” os fornecedores e incluí-los nos planos de descarbonização.

Senão, seja qual for o compromisso assumido pelas grandes indústrias, não será atingido sem o alinhamento de toda a cadeia produtiva. O Fórum Econômico Mundial ainda ressalta a importância da educação sobre a transição verde em escolas e universidades para que toda a sociedade contribua para o andamento da iniciativa, especialmente considerando as diversas e urgentes demandas que a população de um país emergente e desigual. Há uma necessidade de que todos do País estejam envolvidos e é preciso melhorar a qualificação de profissionais que tenham habilidade para levar essa agenda adiante. O Brasil está se preparando para sediar dois importantes eventos internacionais que devem ter a agenda climática como foco nos próximos dois anos: o G20, em 2024, e a COP 30, em Belém (PA), em 2025. Se o País seguir as recomendações presentes no estudo, deve estar muito preparado para a “lupa” a que vai estar sujeito.

As forças políticas e a indústria estão prontas para agir e engajadas. Há entusiasmo do setor privado brasileiro com a agenda climática. A Oliver Wyman lembra que o País também vai sediar o G20 no ano que vem, outra oportunidade de mostrar avanços na pauta climática. O Brasil tem alguns anos de uma janela de oportunidade para apresentar as narrativas, mas, além disso, precisa mostrar progresso. Na Amazônia, em 2025, o País precisa estar extremamente ‘na trilha’ da política anti-desmatamento, para mostrar que está no caminho dos compromissos de descarbonização. Outro palco no ano que vem é Davos, evento anual do Fórum Econômico Mundial que vai oferecer um palco para os líderes empresariais e do setor público poderem apresentar sua agenda e serem capazes de não só dar visibilidade ao que está sendo feito, mas também conseguir novas parcerias. Afinal, o capital de R$ 1 trilhão para financiar a transição precisa vir de algum lugar. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.