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14/Aug/2023

Europa: transição verde e renascimento da mineração

Covas do Barroso, Portugal - Escondida nas montanhas do Norte de Portugal, a cerca de duas horas ao nordeste do Porto, segunda maior cidade do país, situa-se uma idílica vila agrícola, Covas do Barrosos. Com menos de 200 habitantes, a maioria acima de 60 anos, a região é mais conhecida pelo seu gado Barrosão, uma espécie protegida e valorizada pela sua carne. A cidade mais próxima, Boticas, fica a 20 minutos de carro, e no topo da colina, os únicos sons que ouvimos são os de gado, o canto de pássaros e insetos. Covas, no entanto, deverá ser a sede da transição energética em sua forma mais bruta. A apenas 540 metros das casas da vila está localizada uma das reservas de lítio mais ricas da Europa: o metal prateado usado em baterias de veículos elétricos; e há um plano operacional de mineração para extrair o mineral. Os moradores se preocupam com o impacto ambiental, bem como os danos que a mina pode representar ao vilarejo. Nas conversas com os habitantes locais, a palavra "mina" costuma causar arrepios, e deve haver um protesto no final deste mês.

"Nossa maior oposição à mina é que eles querem nos destruir", disse a Associação Unidos em defesa de Covas do Barroso, o grupo de protesto local. "E não se trata apenas da intensidade da destruição, mas também da proximidade. Ela ficará praticamente dentro do vilarejo." Governos e empresas em todo o mundo estão empenhados em encontrar novas fontes de materiais relevantes e, ao fazê-lo, flexibilizam o processo de aprovação de projetos que antes levariam anos, ou até mais de uma década, para decolar. A mineração adicional de metais como cobre, níquel e lítio será crucial para atender à crescente demanda pela transição energética, já que esses metais compõem redes de cabos, ímãs, motores e células de bateria usadas em tecnologias verdes, como veículos elétricos, turbinas eólicas e baterias para armazenamento de energia. Segundo o banco de investimentos Peel Hunt, do Reino Unido, há uma demanda bem real, com aumento de 35 vezes na demanda de lítio, e não há nenhuma mina de lítio em grande escala na Europa. Trata-se de um problema enorme.

Mas, à medida que os governos aceleram as aprovações de tais projetos e lutam para mostrar a importância dos esforços para garantir materiais envolvidos na transição, a resistência cresce entre moradores como os de Covas, que sentem o impacto, além de ambientalistas que pedem cautela no avanço de projetos ecossistemas sensíveis. O local proposto em Covas será uma das quase 50 minas que se espera abrir em toda a Europa até 2030. Na Alemanha, a empresa Vulcan Energy Resources pretende abrir uma mina de lítio, aproveitando uma nova tecnologia de extração do metal da água do mar. Na Suécia, a Copperstone Resources espera reabrir uma mina já explorada para extrair cobre, enquanto a Adriatic Metals acaba de iniciar a mineração de prata e zinco na Bósnia, com mais projetos planejados da Finlândia à Grécia. Segundo o escritório de advocacia White & Case, definitivamente trata-se de um renascimento da mineração. Para muitos que trabalham no setor, é a primeira vez que se vê projetos primários na Europa. O material de minas europeias está para entrar nas cadeias produtivas.

A situação na Europa e nos Estados Unidos é surpreendentemente semelhante, de acordo com o escritório Covington & Burling. Há um aumento no interesse pela indústria e produção doméstica nos Estados Unidos, impulsionado pela aprovação da Lei Climática, conhecida também, como Lei de Redução da Inflação (IRA), de 2022. A IRA e outras leis aumentaram os recursos disponíveis para as agências federais acelerarem e melhorarem suas licenças, mas trabalhar com Estados individualmente e seus Legislativos continua sendo um desafio. A tentativa é promover um cenário de aprovações que seja eficiente e responsável. Na Europa, o renascimento da mineração ocorre após anos de quase nenhuma atividade nova de mineração no continente. Normalmente, a abertura de uma nova mina leva de 10 a 15 anos, muitas vezes porque a concessão de permissão pode levar anos, de acordo com o Peel Hunt. A falta de pessoal com conhecimento de campo tem sido um problema, bem como a atitude negativa em relação à mineração em geral.

Em 2017, a Savannah Resources, uma mineradora listada em Londres, identificou a reserva de Covas como uma possível área para mineração, na esperança de lucrar com a demanda verde. Os estudos geológicos da área, que remontam à década de 1980, encontraram possíveis reservas de lítio. O projeto, no entanto, parecia ter parado depois de não obter o apoio da agência ambiental de Portugal. Isso mudou este ano. Em maio, a Savannah Resources recebeu a aprovação da agência ambiental, o que permitiu que a empresa avançasse com os estudos de pré-viabilidade, que incluem a mineração de um pequeno local para demonstrar o que ocorreria com uma operação em grande escala. A aprovação coincidiu com a proposta de legislação de minerais essenciais da União Europeia para acelerar as aprovações de minas em todo o bloco com várias medidas, incluindo o limite de tempo de revisão para aprovação ambiental de dois anos. Para a Savannah Resources, a mineração de espodumênio (rocha base recuperada para extração de lítio) nas colinas portuguesas tornou-se mais atraente desde que o governo atualizou suas leis de mineração, em 2021, que ficaram mais abertas à exploração.

A empresa pretende cavar quatro locais no vale, o maior deles de 487 metros de diâmetro, algo próximo da extensão de cinco campos de futebol. Atualmente, a Savannah Resources minera o menor destes locais, usando parte dos recursos na indústria cerâmica local, pois a empresa ainda não obteve aprovação para processar o lítio. Algumas das rochas extraídas para obtenção de espodumênio são atualmente extraídas para cerâmica. Mas, em vez de usar tudo para cerâmica, a empresa retira o espodumênio e o transforma em hidróxido de lítio. O hidróxido de lítio é usado para fazer materiais de cátodo para baterias de íon-lítio. Os moradores temem que o Rio Covas seja usado pela mina. A Savannah Resources, que montou dois escritórios no município, disse que evitará isso, e que construirá reservatórios para armazenar a água da chuva. No entanto, a oposição local, tem suas dúvidas. A Savannah Resources não vai tirar água do rio, mas precisa tirar de algum lugar. O Rio Covas nasce a 20 quilómetros daqui, por isso vão usar sua nascente, mesmo que não usem o rio de fato.

A reação local contra novas minas não é incomum. A indústria tem uma longa história de destruição ambiental, más relações com as comunidades locais e desastres mortais. Em 2021, a oposição doméstica derrubou um projeto de lítio da Rio Tinto na Sérvia, embora a empresa ainda esteja confiante de que a mina será aberta com alguma capacidade em algum momento. No entanto, os governos querem e precisam de uma cadeia de abastecimento segura de metais e minerais. A maioria dos minerais essenciais é processada em um número relativamente pequeno de países, e uma ameaça ao abastecimento se tornou mais aparente no mês passado, após a China informar que introduziria restrições à exportação de germânio e gálio, dois minerais usados na fabricação de semicondutores. Os preços dispararam quando os compradores ficaram repentinamente inseguros quanto à disponibilidade das matérias-primas necessárias para fabricar chips para carros, telefones e outras tecnologias. Existem minerais que se tornaram necessários com a transição verde, recursos que não eram necessários, ou para os quais não havia aplicação antes, mas agora são importantes para a sociedade, para as nações.

Eles são muito necessários, disse Jessica Polfjärd, membro do Parlamento Europeu e do Partido Moderado da Suécia. Na Europa, a atitude dos governos começa a mudar em relação à mineração e cabe aos legisladores ajudarem a explicar os benefícios e as necessidades da exploração de recursos minerais em casa. Apesar da forte oposição local, Portugal ainda quer explorar os seus recursos. “Temos a responsabilidade de fazê-lo, pois possuímos a maior reserva de lítio da Europa", disse Ana Fontoura Gouveia, secretária de Estado de Energia e Clima de Portugal. Fontoura disse que existe a possibilidade de que a área da mina, cuja maior parte pertence à comunidade e a proprietários privados, possa ser expropriada, mas espera-se chegar a um acordo. Essa visão é compartilhada pela Savannah Resources. Portugal está na vanguarda da adaptação de leis para padrões ambientais e sociais. Matérias-primas sensíveis têm valor econômico e valor social, e pode-se conseguir isso mantendo altos padrões ambientais e sociais. É importante convencer as pessoas de que este é o caminho a ser seguido. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.