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03/Aug/2023

Regra antidesmate da UE causando preocupações

A União Europeia está gerando preocupação entre os produtores brasileiros com sua regra antidesmatamento, que proíbe a importação de produtos provenientes de áreas desmatadas. Alguns produtores estão enfrentando dificuldades para cumprir essa norma e alegam que as exigências europeias são ainda mais rigorosas do que a legislação brasileira. Eles alertam para o potencial aumento de custos e a perda de competitividade dos produtos brasileiros enviados à Europa. Os laços comerciais entre o Brasil e a União Europeia têm experimentado um crescimento significativo. A corrente de comércio passou de US$ 69,9 bilhões em 2018 para US$ 74,8 bilhões em 2021 e atingiu US$ 95,2 bilhões em 2022, com um valor de US$ 95 bilhões em um período de 12 meses até junho. A União Europeia ocupa a posição de segundo principal destino das exportações brasileiras, ficando atrás apenas da China. No entanto, o futuro dessa relação no médio prazo é incerto.

Aprovado em abril pelo Parlamento Europeu e em vigor desde 29 de junho, o Regulamento da União Europeia para Produtos Livres de Desmatamento (EUDR) deve impactar 356 produtos brasileiros de sete cadeias produtivas: café (que tem metade da produção exportada para a Europa), soja (15%), carne bovina e couro (5%), cacau (5%), madeira e papel (13%), óleo de palma (10%) e borracha (4%), segundo o Ministério da Agricultura. A lei europeia proíbe a entrada de produtos provenientes de áreas com qualquer nível de desmatamento até dezembro de 2020, seja legal ou não. O Código Florestal brasileiro permite que na Amazônia legal sejam desmatadas 20% da área de floresta onde a propriedade está situada e 65% no Cerrado. Dentre as principais punições que a nova legislação europeia prevê estão a suspensão do comércio importador, apreensão e destruição dos produtos e multas de até 4% do valor anual arrecadado pela operadora responsável.

A nova regra começa a ser aplicada em dezembro de 2024, o que significa que produtores têm menos de 18 meses para implementar mecanismos e rastrear as cadeias. A União Europeia diz que é necessário recolher dados sobre coordenadas de geolocalização de onde foram produzidas as commodities e que grandes produtores e exportadores são responsáveis por fiscalizar, podendo comparar a geolocalização com imagens de satélite ou mapas de cobertura florestal para avaliar o atendimento aos requisitos. Pequenos e médios produtores têm 24 meses para se adaptar. Muitos não sabem direito como fazê-lo. Alguns estão mais avançados, caso do setor cafeeiro, mas em carne bovina e soja ainda há dúvidas de como prosseguir. Não há clareza sobre como os produtores brasileiros podem se adaptar às novas regras. O desafio é rastrear a cadeia da produção até o transporte para a armazenagem e de lá até o embarque no porto.

As empresas e o setor público ainda estão mensurando o impacto econômico da nova regulamentação, e o custo dessa rastreabilidade ainda não está precificado. A perspectiva é que os custos aumentem. A decisão da União Europeia é irreversível. Agora, é preciso debater e estabelecer normas que façam sentido. Mas, as regras ainda não estão claras. Cada empresa está pensando sua própria metodologia. O setor de café está montando sua própria rede de monitoramento. Segundo o Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé), 94% do café brasileiro é produzido em São Paulo, Minas Gerais, Espírito Santo, Bahia e Paraná. Cerca de 3% da produção ocorre em áreas de agricultura familiar em Rondônia. Com as exigências da União Europeia, o Cecafé criou uma plataforma de rastreabilidade, agregando informações como geolocalização de propriedades e verificação via satélite do tamanho do parque cafeeiro e limites das florestas.

As informações são cruzadas o Cadastro Ambiental Rural (CAR), que atesta quem produz em determinada propriedade. Como os produtores brasileiros podem se adaptar às novas regras é a grade questão. Muitos produtores já desenvolvem mecanismos de rastreabilidade, isso não é novo. Mas, com novas regras em tempos de ESG e due dilligence, que demanda um raio X social, indicando a existência de trabalho escravo ou desmatamento, é preciso mostrar que o Brasil é organizado. O setor de café participa de um projeto dentro do programa espacial europeu para monitoramento de áreas plantadas. O País tem o Cadastro Ambiental Rural e o Código Florestal. Tem condições de se adequar em 18 meses. Porém, segundo a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo), o setor de carne bovina ainda não sabe ao certo quais procedimentos terá de implementar para conseguir cumprir as exigências até dezembro de 2024. Não se sabe quais mecanismos usar. Para cumprir tudo, será preciso rastrear desde o nascimento do animal, e não apenas a última fazenda por onde ele passou antes do abate.

Para cumprir tudo o que determina o novo regulamento para exportar para a União Europeia, haverá aumento nos custos, mas ainda não é possível estimar qual será esse custo com certificação e implementação. Isso pode resultar em perda de competitividade dos produtos brasileiros. Um produto pode ser barrado na Europa por ser proveniente de área desmatada ilegal segundo as regras europeias, mas legal dentro do Código Florestal brasileiro, o que para ele é uma grande incoerência. Para a Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja Brasil), as regras europeias atropelam as brasileiras e têm motivações econômicas. É necessária a expansão da área cultivada para dar conta da demanda global de alimentos. Assim, a entidade defende a busca de mercados alternativos à Europa. A percepção é de que os preços dos alimentos vão aumentar muito, prejudicando os mais pobres. Se a União Europeia for adiante com essas regras, o mundo passará fome e haverá redução da população a qualquer custo.

Os produtores têm direito de ampliar a produção e de converter a área de pecuária para uso agrícola, o que pode infringir a lei europeia. O Ministério da Agricultura e Pecuária reconhece que as regras da União Europeia não são um cenário isolado, mas acredita que elas não visem apenas à redução do desmatamento. Essa é uma lei com efeito de contrato, unilateral, discriminatória, de aplicação extraterritorial, que não garante efeito sobre a redução do desmatamento e nem tampouco valoriza as práticas sustentáveis ou a conservação ambiental. A Convenção das Nações Unidas sobre a Mudança do Clima, vem sendo enfraquecida por coalisões paralelas, com “narrativas enviesadas”. Com o passar dos anos, em especial desde o Acordo de Paris, o que se observa é o surgimento de uma profusão de coalisões e de acordos paralelos à Convenção do Clima, em iniciativas lideradas pelos países ricos com demandas que afetam mais diretamente os países em desenvolvimento, focando em fontes de emissões minoritárias, como agricultura, resíduos urbanos e mudanças no uso da terra, ou mesmo gases de efeito estufa secundários, como o metano.

É uma disputa econômica, com instrumentos de protecionismo. Se houvesse um esforço sério para tratar as causas das mudanças climáticas haveria ações muito urgentes sobre o setor de combustíveis fósseis. Segundo as Nações Unidas, o uso de carvão, petróleo e gás natural para gerar energia produzem dióxido de carbono, um dos gases de efeito estufa. A extração de petróleo e gás, a mineração de carvão e os aterros sanitários, por sua vez, respondem por 55% das emissões de metano, outro gás de efeito-estufa, provocadas pelo homem. Outros 32% são atribuíveis a vacas e outros ruminantes que fermentam alimentos em seus estômagos. A decomposição do esterco e o cultivo do arroz são outras fontes. Quando a União Europeia concentra os ataques no desmatamento, prejudica a imagem do agronegócio brasileiro e protege seu próprio desenvolvimento, que depende de combustíveis fósseis. A legislação brasileira representada pelo Código Florestal é a mais moderna e de maior impacto ambiental positivo do mundo e não há necessidade de revisão diante da divergência com as regras da União Europeia.

O desmatamento ilegal deve ser tratado no rigor da lei e o desmatamento legal pode ser evitado com práticas de incentivo à conservação. O Ministério do Meio Ambiente está atento a essas demandas e tem grande interesse em viabilizar caminhos para conservação. O Ministério da Agricultura auxilia o produtor de commodities em duas frentes: no desenvolvimento de plataforma georreferencial com mecanismos de rastreabilidade e com a consulta pública ao programa Caborno+Verde, para agregação de valor aos itens produzidos com compromissos ambientais. Nos bastidores, contudo, diplomatas da União Europeia afirmam que as regras do bloco protegem o comércio e passam maior segurança aos compradores, ao garantir que se tratam de produtos sem relação com desmatamento, que vinha prejudicando a imagem do Brasil. E dizem que a última coisa que a Europa deseja é ver o comércio com o Brasil diminuir. Fonte: Valor Online. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.