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28/Jul/2023

Importância do Brasil na geopolítica climática global

A confirmação de que Belém sediará a 30ª Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (COP30-UNFCCC) em 2025 traz uma enorme atenção sobre, e responsabilidade para o Brasil. As vocações para contribuir com a meta global de 1,5°C são inerentes ao potencial do Brasil de eliminar o desmatamento ilegal, favorecer a conservação e a restauração de vegetação nativa, expandir a produção agropecuária resiliente e de baixa emissão de carbono, ampliar a matriz energética renovável e fomentar uma ampla agenda de desenvolvimento. Às vésperas da COP28, em Dubai, o mantra é reavaliar os esforços coletivos no âmbito do Acordo de Paris, fortalecer a pauta de financiamento climático e aprofundar a implementação de ações climáticas que catalisem a transição da economia em todo o mundo. Vale sempre lembrar que a agenda climática é, eminentemente, uma pauta econômica e ambiental e, sem recursos financeiros substanciais, seu progresso se torna inviável.

Na COP27 chegou-se a um consenso sobre a necessidade de investimentos da ordem de US$ 4 a 6 trilhões por ano. A geopolítica climática até a COP30 deve se intensificar e o Brasil terá um papel de extrema relevância. Há um iminente risco de fracasso global dos esforços necessários para alcançar as metas do Acordo de Paris, mesmo com o maciço envolvimento de empresas e atores da sociedade civil na adoção de metas de neutralidade climática. O pano de fundo mostra que o mundo busca se recuperar dos efeitos do Covid-19, enquanto as mazelas da guerra assolam os mercados e a latente crise do multilateralismo expõe de maneira intensamente realista os interesses de um mundo cada vez mais desigual. Como Parte do Acordo de Paris, o Brasil terá que apresentar o plano de implementação de suas metas climáticas e, de forma transparente, sua ambição e compromissos de longo prazo. Vale salientar, no entanto, que sediar uma conferência climática na Amazônia vai muito além de mostrar as forças do Brasil e é justamente aí que reside uma imensa oportunidade de costurar mudanças efetivas em prol do desenvolvimento sustentável.

Vale ponderar que até 2025 ocorrerão encontros multilaterais que merecem extrema atenção do Brasil e que ultrapassam os desafios da crise climática. No contexto da relação entre clima e comércio internacional, ocorrerá, em setembro de 2023, o Fórum Público da Organização Mundial do Comércio (OMC), que será palco de intensas discussões. Vale considerar que a OMC vive um momento de fragmentação de medidas ambientais que podem impactar o comércio, como as medidas de due diligence para conter emissões de GEEs oriundas de desmatamento e medidas de carbono na fronteira. Durante a COP28, o 4 de dezembro marcará pela primeira vez o dia do comércio internacional, voltado para debater soluções que o comércio pode trazer para descarbonizar a economia e potencializar inovações como instrumentos necessários da agenda climática. Já em fevereiro de 2024 ocorrerá a 13ª Conferência Ministerial da OMC, e espera-se criar um consenso mínimo para negociar como integrar meio ambiente nas regras do comércio internacional visando ganhos mútuos e evitando barreiras não tarifárias justificadas em finalidades ambientais.

Há, nas regras da OMC, a previsão de que os membros devem reconhecer a equivalência entre as ações adotadas para atingir objetivos ambientais, o que pode acomodar o princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas da UNFCCC. Na prática, a fragmentação de medidas que buscam alcançar objetivos climáticos via regulação extraterritorial fragiliza a OMC e a própria implementação do Acordo de Paris, o que denota uma sensibilidade evidente do mundo atual. Partindo da OMC, o Brasil terá o desafio de convencer os europeus a ratificarem o Acordo União Europeia e Mercosul, e aprofundar a cooperação na agenda de comércio e desenvolvimento sustentável. O obstáculo maior para tanto é o desmatamento; a estratégia europeia de não ratificar o acordo como forma de gerir esse risco parece menosprezar os desafios inerentes à conservação das florestas tropicais e relutar em reconhecer que a agropecuária brasileira tem inúmeros atributos sustentáveis.

Fazer o Acordo UE-Mercosul ganhar vida é colocar o Brasil no cenário da nova geração de acordos regionais de comércio e trazer cooperação para solucionar o risco de desmatamento, não apenas excluir produtores que continuarão alijados do mercado regulado. Vale lembrar que em junho de 2023 o Brasil assumiu a presidência pro-tempore do Mercosul, o que representa uma oportunidade significativa para fortalecer laços regionais importantes diante do tabuleiro global. Em dezembro de 2023, o Brasil assumirá a presidência do G20, o que significará uma imensa oportunidade para construir mudanças de rumo essenciais para reequilibrar o multilateralismo diante das várias crises que assolam o mundo, envolvendo fome, pobreza, guerra, migração, mudanças climáticas, dentre outras. Há várias crises, e não há solução única que possa remediá-las. Esse cenário sugere que 2024 será um ano intenso do ponto de vista da geopolítica global, o que exigirá uma ampla gama de articulações e altas doses de diplomacia.

Além de vasto conhecimento e soft skills para construir acomodações no tabuleiro multilateral, o Brasil precisará fortalecer sua agenda interna a caminho da COP30. O potencial de transformar as mudanças do clima em soluções é latente e inerente à habilidade de induzir a transição da economia baseada em tecnologia, inovações e financiamento voltado para desenvolver o País. O Brasil precisa seguir um menu de opções para potencializar a transição energética e se consolidar como o líder na produção de fontes renováveis de energia. A possibilidade de fomentar uma cesta farta de renováveis, passando pelo etanol de cana e milho, biogás e biometano, bioeletricidade, eólica, solar, hidrogênio verde, eletrificação, dentre outras fontes, levará inovação, empregos, novos negócios e acesso descentralizado a fontes energéticas. A economia da floresta e dos povos da floresta é outra pauta central. Os potenciais da bioeconomia não podem se restringir ao extrativismo, agroflorestas e produtos da sociobiodiversidade.

Há que se aprimorar os sistemas produtivos locais voltados à redução de emissões, resiliência climática e aumento de renda, já que nas áreas de maior concentração de vegetação nativa também há pobreza e falta de assistência básica às populações locais. É urgente catalisar uma economia inclusiva e pujante baseada nos recursos naturais que permita ganhos socioeconômicos que propiciem desenvolvimento e melhoria de condições de vida. As oportunidades para impulsionar a agropecuária de baixo carbono podem colocar o Brasil na liderança global da produção de alimentos alinhada com a agenda de transição da agropecuária. Será crucial fortalecer a agenda de financiamento para a agropecuária moderna, que inclua a imensa massa de agricultores que ainda não adotam tecnologias básicas, para não dizer tecnologias de ponta considerando a ampla heterogeneidade de produtores e cadeias produtivas. Fortalecer a agropecuária como solução climática lastreada em inovação é a chave para dar saltos de desenvolvimento, mesclando vários sistemas produtivos capazes de gerar alimentos e energias renováveis para todos os brasileiros e para o mundo.

O potencial para induzir inovação na indústria a partir da ótica da descarbonização abre oportunidades fabulosas. E isso passa pelo envolvimento sério e prudente do Brasil no mercado de carbono, tema central quando se cogita a inserção sólida do país na agenda de investimentos e de comércio internacional de setores competitivos. Os caminhos até a COP30 não podem ser trilhados somente sob a ótica ambiental e, menos ainda, sob a lógica de que o Brasil será um eterno beneficiário potencial de recursos para manter suas florestas e quiçá, os povos da floresta. O multilateralismo em crise exige soluções profundas e complexas que perpassam inexoravelmente a agenda financeira. Nossa habilidade de trilhar caminhos e construir acordos que permitam mudanças disruptivas pode fortalecer a agenda de desenvolvimento sustentável duramente negociada desde a Rio 92, colocando o Brasil no centro da geopolítica global. Fonte: Rodrigo C. A. Lima. Broadcast Agro.