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18/Jul/2023

Brasil: desigualdade no campo e polarização política

Celeiro agrícola do mundo, o Brasil tem se tornado menos rural. Com a intensificação do êxodo do campo, nos anos 1980, e o desenvolvimento da produção agrícola, mecanizada e moderna, o mundo do agronegócio é potencialmente mais urbano. O pulsar de grandes cidades no interior do País, em regiões outrora com densidade populacional baixa, tem criado uma sociedade que vive dos efeitos econômicos do campo, mas que enfrenta o dia a dia citadino. Essa mudança de característica do brasileiro advindo do mundo agrícola também gerou uma nova maneira de esse público se relacionar com a política e com o voto. O Brasil rural foi quem mais sofreu com o coronelismo e o voto de cabresto na época da República. O campo era terra fértil para a manipulação do eleitorado. O desenvolvimento do setor, no entanto, permitiu maior geração de riqueza e renda, formando núcleos de classes B2 e C1 integrados às cidades, a partir da construção de polos urbanos em meio aos cinturões agrícolas. Apesar dessa evolução social, é necessário pontuar que o Brasil mais defasado economicamente ainda é o rural que vive da agricultura de subsistência e se encontra principalmente no sertão nordestino.

Cidades como São Luís do Piauí (PI), na microrregião de Picos, tem mais de 70% dos habitantes classificados, segundo o Critério Brasil, da Associação Brasileira de Empresas de Pesquisa (Abep), em classe D. A renda média mensal de uma família de classe D é de R$ 862,41, 65% de um salário-mínimo. O voto do setor agrícola está intimamente ligado às nuances de renda. Em regiões onde houve a urbanização do agro e a condição financeira da população é maior, há um comportamento eleitoral. No País rural, que enfrenta a miséria e até mesmo a fome, o perfil do voto é outro. Ficando na Região Nordeste, ao se analisar o desempenho de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e de Jair Bolsonaro (PL), é bem perceptível essa diferenciação. Em Viçosa, Alagoas, capital da bacia leiteira do Estado, Lula teve 65% dos votos, ante 35% de Bolsonaro. Já em Imperatriz, no sudoeste do Maranhão, região de pecuária e extrativismo, Bolsonaro atingiu 55% dos votos, ante 45% do atual presidente. Olhando para essas duas cidades, percebem-se algumas pistas que confirmam essa desigualdade no mundo agrícola.

Viçosa possui 27% da população em zona rural, um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,607, médio, e um PIB per capita de R$ 3.227,52. Imperatriz possui apenas 5% da população em zona rural, um IDH de 0,731, alto, e R$ 27.880,96 de PIB per capita. Uma diferença abissal, comparando duas cidades do interior nordestino. Ao se analisar o eleitor dos polos urbanos agrícolas, de classe B2 e C1, principalmente na realização de grupos de foco qualitativo, alguns pontos chamam a atenção. Palavras como pátria, liberdade e segurança são repetidas. Este eleitor sente orgulho de fazer parte de uma sociedade que produz. Isso gera sentimento de pertencimento, de fazer pelo País. As leis que controlam a produção, seja por questões ambientais ou de licenças burocráticas, são malvistas e responsabilizadas por tolher mais progresso. Isso implica a defesa constante da ideia de liberdade. Os resquícios da luta dos sem-terra e a própria questão da violência no País promovem um levante em prol de mais segurança e armamento pessoal. Esses pontos combinam com a visão de mundo bolsonarismo. Os eleitores sentem no ex-presidente um líder que defende a mesma causa e enxergam em Lula e no PT a antítese de tudo que acreditam.

Associam palavras como desordem e caos aos petistas, de certa forma os culpando pela questão da violência no campo, além de os acusarem de querer acabar com a propriedade privada. Neste ponto, exalta-se ainda mais o discurso de que há um plano para tornar o Brasil comunista. Em recente pesquisa, o Instituto Datafolha trouxe que 52% dos brasileiros acreditam que o País corre o risco de virar comunista e, ao fazermos o corte olhando apenas para esse setor da sociedade, essa percepção atinge 65%. Essas preocupações passam ao largo quando analisados os eleitores rurais que atuam em pequena escala e acabam por consumir o que produzem em busca de saciar a insegurança alimentar que os ronda. Para esses, há uma necessidade maior de o Estado prover. São gratos a Lula por seus dois primeiros mandatos e enxergam que algumas medidas os beneficiaram diretamente.

Pouco comentado nas grandes cidades, o programa Luz para Todos é sempre lembrado por esse público, que teve acesso à energia elétrica por meio dessa intervenção federal. Possuem menos medo de invasões, já que seus pedaços de terra são consideravelmente menores e há pouca mecanização ou maquinários de valor. Olham para a questão eleitoral com o desejo de conseguir uma prosperidade induzida pelo governo. Essa dualidade do eleitor do agro é mais um reflexo da desigualdade social que há no País. A variável renda é a que mais pesa nessa distinção de olhar de necessidades. No Brasil de quase empate entre lulismo e bolsonarismo, quem quiser vencer o próximo pleito com alguma tranquilidade precisará conquistar eleitor do outro e, contudo, terá a necessidade de entender os porquês que motivaram o voto em cada um dos lados e traçar uma estratégia para conseguir dialogar com quem o preteriu. O “agrovoto” está longe de ser homogêneo e insta compreender que cada segmento tem suas dores e sabores, e o mais importante é conseguir percebê-los sem discriminação. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.