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14/Jul/2023

Mercosul-UE: entraves para fechar acordo comercial

A contraproposta que o Brasil pretende fazer à União Europeia, e que ainda precisa ser avalizada pelos demais integrantes do Mercosul, para tentar avançar no acordo comercial entre os dois blocos gerou um racha no governo. O texto deve ser apresentado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva por integrantes do Itamaraty e da Casa Civil. O documento reabre a discussão sobre o capítulo relativo a compras governamentais, defendida por Casa Civil e Itamaraty e pelas pastas de Saúde e de Gestão. A oposição parte de Indústria, Planejamento, Defesa e Agricultura, que veem risco para o acordo. A resolução geral anunciada em 2019, depois de mais de 20 anos de negociações, abarca uma série de temas, como bens, serviços, facilitação de comércio e compras governamentais.

No capítulo relativo às compras do governo, a intenção é permitir competitividade de estrangeiros em contratações públicas e limitar aquelas feitas sem licitação. Assim, empresas europeias não poderiam ser discriminadas nos processos de licitação no Brasil, por exemplo, salvo em determinados casos. Nesse processo, o Brasil negociou com os europeus situações e áreas em que o governo poderá se isentar dessa obrigação assumida com os europeus e usar as compras governamentais para promover políticas públicas. Estatais, por exemplo, podem ter preferência na contratação pelo governo. Compras de pequenas e médias empresas, para incentivar empreendedorismo social, compras para o setor de defesa e compras que sejam consideradas estratégias para a área de saúde já estão entre as exceções previstas.

Um dos debates mais recentes trata da possibilidade de incluir no acordo exceção para o governo contratar empresas nacionais para serviços de construção civil. O governo Lula tenta estimular o setor por meio de um novo PAC. Técnicos ponderam que esse tipo de debate seria infrutífero, pois o acordo não afetaria políticas do projeto por oito anos. O pedido de Lula para proteger pequenas e médias empresas, de acordo com os mesmos técnicos, também já faz parte do acordo e pode ser feito sem novas alterações ou pedidos adicionais. A ala que defende as novas exceções pondera que seria preciso incluir no desenho final do acordo temas caros para a atual administração, como ampliar o espaço para usar as compras públicas para induzir uma política nacional de industrialização em setores importantes, como o da Saúde.

O principal argumento é o de que o cenário mundial mudou desde 2019, quando o texto foi fechado. Pandemia e guerra na Ucrânia fizeram os países repensarem suas cadeias de produção para torná-las mais próximas e menos dependentes de China e Índia, por exemplo, no tema da saúde. O presidente Lula quer que a contraproposta envolvendo o acordo comercial com a União Europeia esteja pronta e seja enviada para avaliação dos demais integrantes do Mercosul (Argentina, Uruguai e Paraguai) antes de sua viagem, neste fim de semana, a Bruxelas, na Bélgica, onde participará de encontro da Comunidade dos Estados da América Latina e Caribe (Celac) com a União Europeia. Ele não irá apresentar o documento aos europeus, mas quer indicar que o Brasil já fez a sua parte e que aguardará a resposta dos parceiros regionais para dar andamento às tratativas.

A expectativa é de que uma nova rodada de negociação com os europeus aconteça entre agosto e setembro, já com o Brasil na presidência temporária do Mercosul. Lula afirmou que o Brasil "não abre mão" das compras governamentais no acordo. O Ministério da Fazenda tem tentado colocar “panos quentes” na divisão. A despeito de, internamente, o ministro Fernando Haddad ter dado sinais de que é favorável a uma conclusão rápida do acordo, a Pasta não tem encabeçado um movimento mais crítico às sugestões da Casa Civil. A leitura do Ministério da Fazenda é de que as condições políticas para o avanço do acordo de forma rápida não estão presentes, e não seria por causa do Brasil, mas da Europa (assinado em 2019, o acordo ainda depende de ratificação de cada um dos Estados integrantes dos dois blocos para entrar efetivamente em vigor).

Resistências públicas da França e a possibilidade de eleição de um governo de direita ou extrema direita na Espanha, no fim de julho, estão entre os desafios no cenário internacional. A principal crítica que vem da ala considerada liberal é a de que argumentos técnicos foram desconsiderados no texto da contraproposta, e que a Casa Civil, ao lado do Itamaraty, acabou liderando esse debate sem participação ampla como havia sido prometido. Afirmam também que o Brasil já tem acordos de comércio com as cláusulas incluídas no UE-Mercosul, como o assinado com o Chile. A outra ala do governo, no entanto, considera que é importante que Lula deixe seu DNA no acordo, que foi assinado pela gestão passada. Nessa disputa, parte do setor industrial, que em tese seria beneficiado com a maior flexibilização no capítulo sobre compras governamentais, também não acha boa ideia estender a discussão.

A Confederação Nacional da Indústria (CNI) defendeu que o governo se empenhe em aprovar com celeridade o acordo, em vez de insistir em ampliar possibilidades de exceção para compras governamentais, um ponto que poderia beneficiar a indústria. O acordo já foi discutido por muitos anos, é o momento de virar essa página. É preciso avançar no acordo. Isso é fundamental para a economia do País. A conclusão completa do acordo e o começo do processo para sua implementação ficaram travados nos últimos anos, pois os europeus resistiam em tratar do assunto com Bolsonaro, com críticas à política ambiental do governo.

Agora, apesar do trabalho dos dois lados para concluir o acordo ainda neste ano, há negociações adicionais colocadas à mesa pelos europeus e pelo governo Lula. Em março, a União Europeia enviou ao Mercosul um protocolo adicional, com novas condicionantes na área ambiental. O movimento foi considerado "desbalanceado" pelo governo brasileiro, que discorda da ideia de ter um acordo adicional vinculante, do enfoque considerado punitivista e da abordagem sobre meio ambiente feita pela União Europeia. Do outro lado, Lula quer aproveitar a negociação aberta para incluir a possibilidade de mais exceções para manter produtos nacionais nas compras governamentais, tema defendido publicamente pelo presidente. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.