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13/Jul/2023

Reforma Tributária: análise dos pontos aprovados

Provavelmente apenas o relator, os parlamentares membros do grupo de trabalho e os técnicos que atuaram no dia a dia conseguem passar em revista todas as modificações aprovadas. Mas é necessário avaliar o texto sob o viés das cadeias do agro. A visão adotada aqui não é apenas do produtor rural, mas também das indústrias de processamento que adquirem e processam os produtos agropecuários. Nunca é demais repetir os benefícios horizontais da reforma para os setores produtivos: simplifica a apuração e o recolhimento, coloca os tributos por fora dando transparência, promete ressarcimento integral dos créditos, desonera investimentos, dá flexibilidade de fornecimento (assumindo que o sistema débito-crédito vai funcionar a contento), garante exportações imunes (de novo, assumindo que o ressarcimento financeiro dos créditos vai funcionar a contento) e pode não aumentar carga tributária para os setores com elevada produtividade (que é o caso do agronegócio).

Os benefícios citados acima não são retóricos e os setores produtivos perceberão seus resultados à medida que a reforma avance. Arriscaria dizer que eles não deverão ser perdidos na tramitação no Senado, mesmo que os senadores optem por rever muitos pontos aprovados na Câmara. Sem eles a reforma perderia razão de ser defendida. Evidentemente, se a discussão no Senado for de encontro a qualquer um dos pontos acima, a oposição de setores produtivos deverá ser grande. Importante afirmar que uma eventual perda de qualquer um deles invalida a reforma tributária inteira. O agronegócio é o setor com maior ganho de produtividade da economia brasileira. Sendo assim, é justificável passar em revista o texto aprovado na Câmara sob a perspectiva do setor. Tratarei aqui como pontos positivos ou negativos. Tendo em vista que os pontos positivos para o agronegócio não ferem, ou seja, estão alinhados, os benefícios horizontais acima listados, eles são positivos para o setor e para a economia como um todo.

As exportações são imunes, o que significa que a Constituição Federal vai garantir que não somente não pode haver incidência de IVA na operação de exportação como também todo o resíduo tributário na cadeia para trás precisa ser ressarcido ao exportador. Havendo ressarcimento integral dos créditos, trata-se de um avanço muito relevante em relação à situação atual, na qual os exportadores não conseguem o ressarcimento dos tributos federais ou estaduais, ou, em alguns casos, de ambos. Foi criada a possibilidade de o produtor rural optar por não ser contribuinte desde que ele tenha faturamento anual de até R$ 3,6 milhões. A percepção de que produtores rurais de menor escala deveriam ter a opção de não ser contribuintes ganhou força quando os próprios proponentes da reforma decidiram excluir o Simples Nacional do IVA (IBS + CBS). Afinal, o racional é o mesmo: empresas de menor porte devem ter tratamento diferenciado.

A discussão, assim, passou a ser qual nível de faturamento, mas o mérito já tinha sido pacificado quanto ao benefício ao produtor rural. A possibilidade de o produtor ser não contribuinte trouxe a discussão sobre não cumulatividade, pois ele está no meio da cadeia. A solução foi, apenas para esse caso específico, conceder crédito presumido para o comprador. Ou seja, é um novo crédito que tem função única de eliminar a cumulatividade. Algo fundamental para não gerar custo na cadeia, levando a aumento de preços. A solução encontrada foi correta. O conceito da reforma sempre foi que ela não vai aumentar a carga tributária total na economia brasileira. O agro, dado seu ganho de produtividade e crescimento nas exportações, reivindicou para si essa determinação, ou seja, a alíquota incidente sobre as cadeias, do insumo ao produto na prateleira do varejo, não poderia resultar em aumento de carga, nem aumento de preços aos consumidores.

Para isso foi negociada redução de 60% na alíquota base. Se haverá maior incidência de tributos sobre os produtores, ou se ela vai ficar neutra, depende da alíquota base a ser negociada futuramente. Há um componente de incerteza futura, mas o porcentual de redução negociado foi um ganho para o agro. A carga tributária deverá aumentar de qualquer forma por conta do fim dos incentivos fiscais, mas é preciso reconhecer que eles acabariam de qualquer forma em 2032, mesmo sem a reforma tributária aprovada. Há pontos positivos para os biocombustíveis. Todos os combustíveis terão arrecadação monofásica (na verdade, já é assim desde abril de 2023), ou seja, apenas o produtor do combustível vai pagar o IVA, de uma vez, e com alíquota padronizada. Isso é fundamental porque o setor tem muita informalidade, sobretudo na distribuição e no varejo. Daí porque a responsabilidade fica atribuída ao produtor.

Mas, biocombustíveis terão alíquota monofásica inferior à dos combustíveis fósseis. Além de ser positivo ao consumidor, essa decisão estimula maior substituição de fósseis por biocombustíveis, o que é positivo para a economia brasileira. Outro ponto relevante para os combustíveis, nesse caso sem distinção entre fósseis e bio, é o reconhecimento da não cumulatividade. Atualmente, por decisão de convênio do Confaz, o aproveitamento de créditos de ICMS na entrada não é permitido a combustíveis com base no argumento da monofasia. O assunto é objeto, inclusive, de ação de inconstitucionalidade no STF. O texto da Câmara corrige isso afirmando que a não cumulatividade se aplica sobre os combustíveis. Caso contrário, os créditos dos insumos utilizados para produzir combustíveis se transformariam em custo e seriam repassados nos preços. A decisão, portanto, é positiva ao consumidor.

Houve reconhecimento da necessidade de endereçar os créditos de ICMS existentes no momento do fim da transição para o IBS, que é a provisão de devolução dos créditos atuais em 240 meses, a partir de 2033, corrigidos pelo IPCA. Por fim, foi criada a possibilidade de alíquota zero para uma cesta básica nacional, a ser definida. Esse ponto tem um lado positivo e um negativo, no meu entendimento. É positivo no sentido de que não onera a etapa final para o consumidor, o que não pressiona por aumento do preço dado que não haverá recolhimento de IVA. Mas é negativo porque resulta em acúmulo de crédito na etapa final, dado que nas etapas anteriores haverá incidência de IVA. O agente que vender ao consumidor final vai receber créditos de IVA mas não poderá utilizá-los, pois será forçado a vender o produto da cesta básica com IVA igual a zero.

A decisão, portanto, de ser ou não classificado como cesta básica deveria ser opcional, e não obrigatória. O segundo ponto negativo é a grande insegurança na devolução dos créditos. Foi mantida a possibilidade de a obrigação do contribuinte do IVA realizar a comprovação do recolhimento do tributo pelo fornecedor, excepcionada a exigência quando o adquirente promover o recolhimento ou quando este ocorrer na liquidação financeira. Também poderá o Conselho Federativo criar obrigações acessórias para viabilizar o ressarcimento dos créditos. As duas preocupações têm relação com a devolução dos créditos aos contribuintes do IVA, pois a demora no ressarcimento impactará o fluxo de caixa das empresas. Havendo dificuldade para os contribuintes utilizarem seus créditos, ou para os exportadores serem ressarcidos financeiramente, todo o benefício da reforma será perdido.

O terceiro ponto são os fundos estaduais. A substituição dos atuais fundos estaduais pela possibilidade de o Estado e o Distrito Federal instituírem contribuição sobre produtos primários e semielaborados, produzidos nos respectivos territórios, para investimento em obras de infraestrutura e habitação, com vigência até 2043, implicará, de modo reflexo, na tributação das operações de exportação, bem como em aumento de custo para os contribuintes. Não há qualquer justificativa plausível para uma reforma tributária que muda estruturalmente o sistema aceitar a instituição de um novo tributo que tem fundamentos no modelo anterior, mesmo após o término do período de transição. Se há fundos estaduais em vigência, que eles sejam extintos, assim como ICMS e ISS, ao final de 2032. Nosso pedido é que o Senado resolva os dois pontos negativos mencionados: eliminar a insegurança na devolução dos créditos e colocar prazo final para extinção dos fundos estaduais. Fonte: André Nassar. Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove). Broadcast Agro.