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23/Jun/2023

COP28: transição agrícola e de sistemas alimentares

A Conferência de Mudanças Climáticas de Bonn, que terminou no último dia 15 de junho, na Alemanha, passou mensagens não muito otimistas quanto ao real engajamento dos países na adoção de suas metas climáticas. Quando se pretende avançar com as regras do mercado de carbono, a nova meta global de financiamento, o mecanismo de perdas e danos e não há consenso sobre como tratar das metas que os países deveriam ter implementado até 2020, escancaram-se as facetas do multilateralismo onde todos concordam com a crise climática, a despeito de que suas ações são tímidas. No jargão das negociações da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (UNFCCC) e do Acordo de Paris, se tornou comum falar em transição energética, transição da agricultura e dos sistemas alimentares, transição da economia, assumindo que é preciso mudar os modelos atuais de desenvolvimento para alcançar os desafios climáticos que afetam a todos.

Transição é o mantra de quem navega na agenda climática. A 28ª Conferência das Partes (COP28) da UNFCCC será nos Emirados Árabes, entre 30 de novembro e 12 de dezembro de 2023, o que coloca no centro da discussão a produção e consumo de petróleo e derivados, que representam a maior causa do aquecimento global. Curiosamente, as reuniões em Bonn permitiram consolidar a visão de que os Emirados Árabes deverão ressaltar, na COP28, os desafios para promover a transição da agricultura e dos sistemas alimentares, dada sua dependência da importação de alimentos. Em Bonn, as negociações para estruturar o Grupo de Sharm El-Sheikh, que deve aprofundar a integração das chamadas ações climáticas de agricultura e segurança alimentar, fracassaram em função das discordâncias sobre a necessidade de se criar um comitê para guiar este processo, sobre como qualificar a agricultura de baixo carbono e sob a demanda de incluir os pequenos agricultores e questões de gênero.

Isso sugere que na COP28 a agenda de agricultura voltará com ênfase. O afã de rotular uma COP como a conferência da energia, da agricultura, das florestas, dos povos indígenas e comunidades locais prejudica a compreensão de que todos os setores e atores estão intrinsecamente envolvidos e precisam agir. Se há um possível rótulo para uma COP realizada nos Emirados é como destravar financiamento para a transição energética e a redução no consumo de petróleo! É válido refletir o que pode significar transição da agricultura diante dos desafios do Acordo de Paris. É imperioso ponderar se existe um caminho a ser seguido por todos os países, quando se trata de produzir alimentos, das culturas associadas ao ato de cozinhar e comer, da disponibilidade de alimentos e, mais flagrantemente, da possibilidade de ter acesso aos alimentos, o que perpassa graus de desenvolvimento, renda, políticas públicas, dentre inúmeros outros fatores.

Em Bonn foi possível ouvir que a agroecologia e a agricultura de pequena escala são a base da agricultura de baixo carbono e resiliente. Também, que a produção pecuária representa ao menos 60% das emissões globais, razão pela qual o veganismo é uma solução que permite atacar a maior fonte dos problemas do aquecimento global! É natural, em um tratado multilateral que engloba quase 200 países, que existam visões antagônicas sobre o que pode ser a transição da agricultura. Ainda mais se considerar o papel da sociedade civil e do setor privado como atores necessários para alcançar os ambiciosos compromissos climáticos. Ao ampliar o debate sobre a transição dos sistemas alimentares, os argumentos ficam ainda mais calorosos, visto que é preciso sair do campo e chegar no prato de consumidores que possuem relações extremamente distintas com os alimentos, as cadeias produtivas e um conjunto de fatores necessários para permitir alcançar segurança alimentar, segurança dos alimentos e produção sustentável.

Ao mirar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, é imperioso tratar das ações climáticas de agricultura sob a ótica proposta pela Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) para qualificar o que é a agricultura de baixo carbono ou agricultura climaticamente inteligente: i) aumentar a produtividade; ii) aprimorar a adaptação e resiliência dos sistemas produtivos; iii) reduzir emissões de GEEs. Não há que se falar em um modelo ou sistema produtivo que deva ser adotado por todos os países. Isso contraria condições climáticas, ocupação histórica da terra, colonização, culturas, evolução tecnológica, acesso a financiamento, dentre outros fatores. Em outras palavras, não é razoável tratar da agricultura sustentável e resiliente apenas pelo prisma climático (ODS 13). É necessário fortalecer a eficiência na produção visando maximizar os produtos e minimizar emissões, uso de insumos, degradação dos solos, uso de água, dentre outros fatores.

É preciso discutir, sim, como produzir carne de baixa emissão, que ajuda a capturar carbono no solo, como o uso de bioinsumos pode ajudar a aumentar a produtividade e manejar pragas, de que forma capacitar e financiar a adoção de tecnologias para todos os sistemas produtivos, especialmente para pequenos e médios produtores, visando fortalecer um cabedal de opções de adaptação. Fazer uma transição não é o mesmo que dar um salto! O iminente Plano Safra 2023/2024 tenderá a incrementar a política de financiamento da agropecuária tropical, de sistemas integrados, intensivos a sistemas agroflorestais, pautada pela clareza quanto a importância de fomentar sistemas produtivos resilientes. A presidência da COP28 potencialmente buscará engajar key players na produção de alimentos a fim de aprovar uma decisão que amplie o papel da agricultura como parte das soluções para o aquecimento global.

Conectar financiamento como alavanca da transição da agricultura e dos sistemas alimentares é crucial e, sem isso, países com potencial para incrementar sua produção de alimentos e minimizar perdas pelos impactos do aquecimento global podem ficar à deriva. A aprovação da COP30 em Belém (PA), em 2025, faz com que os olhares do mundo se voltem para o Brasil, que terá em mãos uma oportunidade fabulosa para fortalecer a visão de que a almejada transição da agricultura e dos sistemas alimentares perpassa uma gama de elementos que compõem a agropecuária de baixo carbono, resiliente e pautada por inovação, independente do sistema produtivo e de quem produz. É preciso construir essa visão desde já, passando pela COP28, para que o Brasil se consolide como uma liderança que produz, conserva e contribui com as chamadas ações climáticas de agricultura e segurança alimentar. Fonte: Rodrigo C. A. Lima. Broadcast Agro.