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17/Abr/2023

Brasil e China: entrevista Marcos Caramuru (Cebri)

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que encerrou na sexta-feira (14/04), uma viagem de três dias à China, buscou passar uma mensagem a agentes econômicos do país asiático de que o Brasil é um país "amigo" e seguro em termos de investimentos, afirma o ex-embaixador em Pequim e conselheiro internacional do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), Marcos Caramuru. Isso tem um impacto sobre a visão dos investidores. Lula restabelece ambiente de confiança, algo perdido durante o governo de Jair Bolsonaro. Segue a entrevista:

Xi Jinping é visto como um presidente que adota uma diplomacia mais ambiciosa do que os antecessores. Como a relação diplomática com a China evoluiu com a chegada do atual líder chinês e com as transições de governo no Brasil?

Marcos Caramuru: Não houve um clima de confiança na relação Brasil China no tempo do governo Bolsonaro, mas também não houve um dano visível. No final do governo chegaram a aprovar planos de trabalho de curto e longo prazo. A diferença que o Lula faz é estabelecer esse ambiente de confiança. Seja porque ele já tem um histórico de relação com os chineses, seja porque é de um partido de esquerda, seja porque exista agora de fato um interesse de colaborar com a China e ampliar as relações.

O que se esperar como resultado do diálogo entre Lula e Xi Jinping?

Marcos Caramuru: O que eu espero é fortalecer a confiança mútua. Conversar além de comércio de proteínas, de soja. Isso já existe e não vai deixar de acontecer. Que os países possam trocar impressões sobre como veem a ordem internacional. Vou prestar muita atenção no que vai sair sobre construção de economia de baixo carbono, mudanças climáticas e novos projetos ambientais. E no que vai ter de novo em matéria de ciência e tecnologia.

A viagem de Lula à China ocorre em meio à tensão entre Washington e Pequim. Lula esteve com o presidente americano Joe Biden e agora, na China, questiona o uso do dólar como lastro para exportações. Quais mensagens a visita do presidente passa em relação à política externa de seu governo?

Marcos Caramuru: Na relação com a China é importante passar mensagens para os agentes econômicos chineses. A primeira mensagem que ele passa é que o Brasil é um país amigo da China. Isso tem um impacto sobre a visão dos investidores. A segunda é que tem muitas perspectivas novas no relacionamento, como a construção da economia de baixo carbono, a cooperação ambiental. O Brasil tem biodiversidade, a China tem tecnologia. Em terceiro lugar, tenho percebido o interesse do Brasil de ampliar a cooperação tecnológica. A quarta, que Lula está dizendo, (é de abrir) novas alternativas de comércio bilateral, o uso de moedas nacionais. Estão se abrindo portas.

Tem se falado sobre as chances de Lula aderir ao cinturão chinês, uma iniciativa de cooperação econômica, política e cultural. O que significaria a adesão do Brasil nesse projeto e quais contrapartidas a China pode oferecer?

Marcos Caramuru: O fluxo mais geral de investimentos do Brasil e a estrutura de relações não vão mudar. Mas para as empresas, sobretudo as que operam em projetos subnacionais, essa adesão é mais fácil para operar quando busca financiamento e relação com o setor financeiro chinês. Dentro da China isso tem mensagem positiva e pode facilitar muito a ação com empresas em áreas de infraestrutura. Na realidade federal a China já investe muito, mas não porque assina acordos, mas porque participa de licitações. Quando você diz que o país é parte do Belt and Road (cinturão chinês), isso abre portas.

A visita de Lula à China e os sinais que faz ao país asiático afetam a relação com os Estados Unidos?

Marcos Caramuru: Não creio. Os Estados Unidos estão em tal situação que estão muito sensíveis aos mínimos movimentos em relação à China. Mas o Brasil não vai deixar de fazer aproximação com a China. As nossas relações são muito fortes, é o maior parceiro comercial, tem um fluxo expressivo de investimentos. A sociedade brasileira - formadores de opinião e empresários - tem posição genericamente positiva em relação à China. É um país que alcançou resultados bons nos últimos anos. É natural que uma economia como a do Brasil se relacione com essa realidade.

Os discursos de Lula já no primeiro dia de visita mostram que tem interesse de posicionar o Brasil como líder dessas economias emergentes. Essa é uma postura parecida com Lula 1 e 2 cuja política externa apostava em um mundo multipolar e priorizava o pragmatismo? O Brasil consegue liderar esse processo hoje?

Marcos Caramuru: O Brasil terá esse poder se conseguir ter uma posição expressiva de liderança na América Latina e, se mantiver a casa em ordem, se internamente as coisas estiverem sob controle. Esses são os fatores essenciais. O mundo está se reorganizando no momento. O Brasil é uma economia grande, tem histórico de relacionamento mundial. É natural que desempenhe um papel. Se é semelhante a Lula 1 e 2, é menos relevante do que o fato que o mundo não é mais o mesmo e o Brasil tem que se inserir de uma outra forma. Não necessariamente se chamando de líder, mas se chamando como sempre a diplomacia brasileira quis ser chamada: um país que constrói pontes.

Qual o peso do Brasil no bloco diplomático liderado pela China para oferecer uma diplomacia alternativa na questão da guerra na Ucrânia? Esse bloco tem as mesmas chances de sucesso com o Brasil?

Marcos Caramuru: O Brasil tem um papel limitado, mas está procurando estender ao máximo apresentando-se como um país que tem tradição na paz. É isso que o Brasil pode significar. Que não acredita que a persistência desse conflito seja de interesse para os países de renda média porque tem um impacto no comércio internacional. Em particular para o Brasil o fato de que a Rússia e a China são parte dos Brics. Isso cria situações complexas como você ter que parar o financiamento de novos projetos e o fluxo de recursos para países membros. Pode ter um impacto sobre o banco como um todo. Tem uma legitimidade do Brasil de querer envolver-se nesse problema e de querer uma economia internacional sem sobressalto.

Fonte: Broadcast Agro.