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23/Mar/2023

Análises sobre a crise no sistema bancário global

A turbulência desencadeada pela quebra do Silicon Valley Bank eliminou grande parte do que o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano), líderes políticos e investidores pensavam ter aprendido com a crise financeira global de 2007-2009. Acreditava-se que títulos complexos, bancos "grandes demais para quebrar" e instituições financeiras informais e pouco regulamentadas eram os elos fracos do sistema. No entanto, os elos fracos eram as partes triviais e altamente seguras: títulos do governo, bancos menores e contas de depósito. Talvez tudo isso passe sem deixar grandes consequências para a economia em geral. Mas, caso contrário, surgem dois caminhos nada apetitosos. Bancos menores e regionais, recentemente expostos como frágeis, podem enfrentar dificuldades para sobreviver por conta própria; ou a rede de segurança federal se expandirá, criando novos riscos no futuro.

A crise financeira global se originou com os chamados "bancos paralelos" (instituições financeiras com pouca regulamentação, corretoras de valores mobiliários e veículos de crédito fora do balanço - em alguns casos, subsidiárias de holdings de bancos). Essas instituições investiram em hipotecas subprime e seus derivativos, financiados com recursos de atacado ariscos: commercial papers lastreados em ativos, contas de clientes de corretagem de primeira linha e recompras. Por sua vez, o SVB buscava ser o suprassumo de um sistema bancário seguro e enfadonho: receber depósitos, que geralmente são mais rígidos do que o financiamento por atacado, e investir em títulos do Tesouro e títulos hipotecários garantidos pelo governo federal. Esses títulos não têm risco de inadimplência, ao contrário de mercados emergentes, financiamento a imóveis comerciais e empréstimos subprime que impulsionaram as crises anteriores.

O problema é que financiadores tendem a apostar em uma estratégia segura até que ela se torne insegura. Entre 2007 e 2022, os bancos aumentaram participações em títulos do Tesouro dos Estados Unidos e títulos hipotecários lastreados pelo governo federal para 20%, de 12% do total de ativos, enquanto a parcela não segurada de depósitos domésticos aumentou de 38% para 45%. O SVB e o Signature Bank foram ao extremo, com depósitos não segurados em 94% e 90%, respectivamente, segundo a S&P Global Market Intelligence. Os títulos do governo podem não ter risco de inadimplência, mas têm risco de taxa de juros: o valor de mercado cai quando as taxas sobem, ainda mais quando sobem de níveis mínimos. Isso, obviamente, é o que vem acontecendo. O índice de títulos Bloomberg U.S. Aggregate caiu 13% no ano passado, seu pior desempenho desde os anos 1970. Para os bancos, isso só representaria um problema se precisassem vender os títulos para fazer frente a depósitos, exatamente o que aconteceu com o SVB.

O Signature dependia mais de empréstimos, mas também foi alvo de uma corrida em seus depósitos não garantidos. De fato, a alta dos juros normalmente força os bancos a aumentar as taxas de depósito ou perder recursos para alternativas como fundos de money market. Os bancos tradicionais devem ser mais seguros do que os bancos paralelos por serem rigidamente regulamentados. Mas então, como o Fed, que compartilhava a supervisão do SVB com os reguladores da Califórnia, permitiu que isso acontecesse? A situação não era inédita. Um descompasso entre empréstimos de longo prazo e depósitos de curto prazo derrubou muitas instituições de poupança e empréstimo quando as taxas de juros dispararam no final dos anos 1970 e início dos anos 1980. A dependência de depósitos não segurados precipitou o colapso da Continental Illinois em 1984 e do Bank of New England em 1991. É compreensível que os reguladores do Fed, assim como seus colegas da política monetária, tenham sido pegos de surpresa pelo tamanho da alta dos juros devido à inflação.

Tal cenário não estava nos testes de estresse feitos com os bancos globais sistemicamente importantes (conhecidos como GSIBs), muito maiores. Ainda assim, os bancos deveriam ter testado esse cenário por conta própria. Os supervisores do Fed também pensaram, erroneamente, que os depósitos não garantidos eram uma forma segura de financiamento. A vasta experiência ensinou aos supervisores e reguladores que os depósitos não garantidos dos clientes, em oposição aos depósitos intermediados ou ao financiamento de curto prazo no atacado, são bastante estáveis. Essa suposição precisa ser repensada. Reguladores e legisladores acreditaram que a crise financeira global mostrava que bancos pequenos e regionais eram naturalmente mais seguros do que os GSIBs. Menores, mais simples e menos interligados, não derrubariam outras instituições, se quebrassem. Essa lógica levou o Congresso a aumentar o limite do tamanho de ativos em que as exigências mais rígidas de capital e liquidez passariam a valer, de US$ 50 bilhões em 2018, para US$ 250 bilhões.

Não se sabe se essa mudança teria feito diferença. Regulamentações só importam se aplicadas, e os supervisores ainda tinham muito poder para disciplinar instituições menores. Embora os examinadores do Fed tenham feito alertas à administração do SVB já em 2019, ao que parece, não tomaram medidas mais severas, como forçar o banco a recusar depósitos ou captar mais recursos. Isso apesar de vários sinais vermelhos, como rápido crescimento, alta dependência de depósitos não garantidos de setores concentrados, grandes depósitos vinculados a negócios de capital de risco, além da ausência de um diretor de risco. O SVB e o Signature podem ter sido pontos fora da curva, caso em que sua quebra não deveria ter provocado efeitos em cascata. Mas, muitos bancos compartilhavam uma semelhança em que clientes nervosos começaram a retirar depósitos. Essa é a essência de uma corrida aos bancos. Efeitos psicológicos podem transformar um banco saudável, líquido e solvente em uma instituição não saudável, sem liquidez e insolvente de uma semana para outra.

Temendo tal resultado, o Fed se ofereceu para emprestar aos bancos em troca de garantias de títulos avaliadas ao par, em vez de valor de mercado muito mais baixos, e a FDIC, invocando uma exceção para crises sistêmicas, garantiu todos os depósitos do SVB e do Signature. Se isso foi uma reação exagerada, é impossível saber agora; o fato de as ações dos bancos terem caído ainda mais sugere que não. Então, como essa nova fonte de fragilidade pode ser eliminada? Segundo o MIT Golub Center for Finance and Policy Depositantes, os não segurados parecem não disciplinar o comportamento dos bancos. Bancos menores poderiam ser obrigados a emitir dívida subordinada. Essa dívida poderia ser convertida em patrimônio ou eliminada para salvar um banco quebrado, como os reguladores suíços fizeram ao forçar o Credit Suisse Group a se fundir com o UBS Group. Mas, as autoridades suíças ainda precisavam conter as perdas do UBS e garantir liquidez adicional.

Sem apoio governamental, os bancos comunitários e regionais dos Estados Unidos podem perder depósitos e clientes para grandes bancos já considerados grandes demais para quebrar. Como reação, os bancos de médio porte pedem ao governo dos Estados Unidos que garanta todos os depósitos bancários por dois anos. A secretária do Tesouro, Janet Yellen, disse que mais depósitos bancários poderiam ser protegidos. Uma garantia geral de depósito certamente estabilizaria os bancos, mas teria um custo. Poderia retirar recursos de investimentos semelhantes, como fundos de money market que não possuem essa garantia. Também poderia transformar todos os bancos em uma empresa patrocinada pelo governo, como já foram a Fannie Mae e a Freddie Mac. No processo, um dos principais objetivos do impulso regulatório pós-crise desapareceria: que o público jamais tivesse que arcar com perdas provocadas por riscos privados. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.