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09/Mar/2023

Entrevista com Pedro Lupion – presidente da FPA

O presidente da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), Pedro Lupion (PP-PR), disse que as invasões de terras produtivas pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) nos últimos dias causaram “ruído” na tentativa de aproximação do agronegócio com o governo Lula. Em entrevista, o deputado federal afirmou não concordar com a postura de mediação do conflito adotada pelo Executivo, mas reconheceu que houve uma mudança de tom de alguns ministros, que passaram a condenar os movimentos.

A bancada ruralista vai tentar aprovar no Congresso medidas para enquadrar a invasão de terras produtivas como “terrorismo”, além de endurecer as penas para quem pratica esses atos, classificados por ele como “criminosos”. À frente da maior bancada do Congresso Nacional, com 344 parlamentares, Lupion defendeu a necessidade de haver mínimas condições de diálogo da FPA com o governo, para a construção de políticas públicas para a agropecuária, apesar das diferenças ideológicas com o PT, partido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

É preciso ter condição mínima de diálogo e isso tem sido feito por intermédio do Ministério da Agricultura. Lupion planeja não abrir mão de prioridades da bancada como o retorno das áreas de abastecimento, agricultura familiar e gestão do Cadastro Ambiental Rural (CAR) para o Ministério da Agricultura. Esses órgãos foram transferidos pelo governo para o Ministério do Desenvolvimento Agrário. O deputado defendeu, ainda, o PL dos Defensivos Agrícolas, o da Regularização Fundiária e o do Licenciamento Ambiental, que tramitam no Senado. Além disso, criticou a oneração da cesta básica na reforma tributária e disse que a taxação de exportações preocupa o agro. Segue a entrevista:

Estamos em meio a episódios de invasões de terra pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). O ministro do Desenvolvimento Agrário, Paulo Teixeira, chamou a Suzano e o MST para fazer uma mediação. A resposta do governo às invasões tem sido efetiva para a resolução do conflito?

Pedro Lupion: O governo começou a agir. Os posicionamentos tanto do ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, quanto do ministro Paulo Teixeira começaram a condenar as invasões a propriedades produtivas. Isso é crime. O direito à propriedade está previsto na Constituição. Todos juramos defender a Constituição, além de cumpri-la. Precisa haver uma reação tanto do governo federal quanto dos governos estaduais, nesse caso, mais especificamente da Bahia, que precisa cumprir as reintegrações de posse. Duas áreas já foram desocupadas e ainda faltam outras duas. Eu não faria reunião de entendimento em áreas invadidas. Acho que isso não é justificável. Quem está errando tem de primeiro 'desinvadir' para depois conversar. Este tipo de pressão não funciona. Não há cabimento em pleno 2023 vermos esbulho possessório de propriedades produtivas no País. Há de ser condenado veementemente. Acho que o governo começou a fazer isso.

O senhor já disse que o agro estava tentando construir pontes com o governo apesar das diferenças ideológicas. No setor, essas invasões do MST, que eram justamente o que o setor temia, freiam essa tentativa de aproximação?

Pedro Lupion: Cria um ruído. Esse ruído é ruim para a aproximação, mas independentemente disso os atores responsáveis no governo, de certa forma, têm feito sua parte. Precisamos entender que o agro é maior que qualquer ideologia política ou partido político. Na frente parlamentar da agropecuária, não podemos ter lado. Nosso lado é o produtor rural. Precisamos ter as mínimas condições de diálogo com aqueles que fazem as políticas públicas de agropecuária para avançarmos em questões importantes, como o Plano Safra que precisamos começar a calcular, apresentar, e o seguro, que precisamos resolver. Precisamos cumprir o entendimento dos produtores rurais em relação aos juros subsidiados do Plano Safra e também avançar na pauta legislativa. É óbvio que ninguém consegue atropelar o governo. Precisamos ter condição mínima de diálogo e isso tem sido feito por meio do Ministério da Agricultura. Acho que é o papel do ministério lidar com a bancada e temos bom acesso aos integrantes da pasta. Vamos tentar sempre manter essas pontes, mas declarações desastrosas como as anteriores em relação às invasões prejudicam e declarações mais positivas agora facilitam nossa aproximação.

Se o governo não conseguir frear as invasões e elas continuarem ocorrendo, quais medidas a FPA vai tomar?

Pedro Lupion: O governo começou a se posicionar. Trabalhamos vários pontos dentro do Congresso Nacional e na articulação com o governo. Temos preocupação em relação à legislação que é dúbia e frágil sobre o esbulho possessório. As punições são muito brandas e precisam ser mais severas. Precisamos ver as ordens judiciais serem cumpridas. Já existem dois mandatos de reintegração de posse na Bahia, além de diversos outros no País que não foram cumpridos. Cabe aos governos estaduais, incluindo o da Bahia, cumprirem o mandato de reintegração de posse. Inclusive, não cumprir mandato de reintegração de posse é crime de responsabilidade passível de intervenção federal. Quanto à legislação, existem os projetos de lei 8262/2017 e 8149/2003 que estão na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e há preocupação de melhorarmos a legislação neste sentido. Infelizmente, essa onda de invasões de terra que acontecem no Brasil é por causa da certeza de impunidade porque não acontece absolutamente nada com quem invade ou 'desinvade'. O José Rainha (líder da Frente Nacional de Luta que invadiu terras em São Paulo e no Paraná no carnaval) foi por extorsão, não por invasão de terra. Precisamos ter clareza que invasão de propriedade e esbulho possessório é crime.

O que seria esse melhoramento da legislação quanto às invasões?

Pedro Lupion: Vamos trabalhar para aumentar a pena para esbulho possessório e para tornar invasão de terra produtiva terrorismo. Existem também propostas de fiscalização e controle para saber quem está financiando essas invasões e pedidos de partidos de abertura de CPI sobre o MST. São três ondas de invasão no País: no Vale do Paranapanema com o José Rainha, no extremo sul da Bahia e nas áreas da Suzano, na Bahia. São três linhas de ação desses movimentos criminosos que precisam ser contidas e só conseguimos conter sabendo que a legislação é punitiva.

Ainda no tema de terras, o ministro Paulo Teixeira concedeu recentemente duas declarações que desagradaram ao setor. Uma delas foi de que os títulos agrícolas concedidos no governo Bolsonaro têm valor de papel de pão. A outra de que o Incra vai estudar a destinação de áreas de grandes devedores da União para a reforma agrária. Como a bancada avalia isso?

Pedro Lupion: Foi uma fala completamente fora de contexto em relação aos mais de 400 mil títulos que foram distribuídos aos assentados e, com isso, se tornaram produtores rurais de fato podendo acessar crédito, fazer arrendamento ou venda. É um avanço importante em se tratando de mais de 1 milhão de pessoas. Certamente, o ministro estava mal orientado quando fez essa fala, tanto que nunca mais a repetiu. Existe uma preocupação grande desse governo com a reforma agrária. Há mais de 90 milhões de hectares que estão na mão do Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) e mais de 120 milhões de hectares de área da União que poder ser feitos os assentamentos. É terra suficiente para fazer reforma agrária. Se há interesse em fazer efetivamente reforma agrária neste governo e não só movimento político, o Incra deverá continuar fazendo distribuição de títulos e fazendo com que as áreas desocupadas possam ser alvo de novos assentamentos. Depende muito do interesse político também. Sobre a destinação de propriedades de grandes devedores, repito que o direito à propriedade está na Constituição. Temos que cumprir a lei.

A Frente lançou mão de emendas e projetos de decretos legislativos para o retorno da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), da agricultura familiar e da gestão do Cadastro Ambiental Rural (CAR) para o Ministério da Agricultura, áreas remanejadas na reestruturação do governo. Reaver essas áreas se mantém como uma prioridade da bancada?

Pedro Lupion: Continuamos com a iniciativa e trabalhando muito nisso. Inclusive, começamos as negociações com o PT para que isso se torne realidade. Está mais avançado na questão da Conab e do CAR. Vamos trabalhar bastante para que isso aconteça.

Há possibilidade de a frente abrir mão ou ceder em alguns destes temas para avançar na reforma tributária?

Pedro Lupion: Quem tem que ceder é quem não tem voto. Nós temos votos para não ceder em absolutamente nada. Vamos trabalhar conforme a força que temos no plenário.

A MP dos Combustíveis prevê imposto sobre exportação de óleo cru e o senhor disse que isso preocupa o agro. Há o temor de que na reforma tributária também possa haver algo no sentido de imposto de exportação ou isso está pacificado com o governo?

Pedro Lupion: Supostamente, isso está pacificado. Há palavras inclusive do relator de que não haveria taxação sobre exportação de produtos primários. Porém, essa taxação de exportação de óleo cru nos causou uma preocupação porque abre o precedente por ser produto primário e taxar produtor primário. Nos gera preocupação o governo falar uma coisa e fazer outra. Não permitiremos, em hipótese alguma, a taxação das exportações do agro. É isso que nos dá competitividade e faz com que tenhamos 52% das exportações, com o que o agro proporcione praticamente 25% dos empregos e ter um terço do PIB. É nossa responsabilidade com produtores rurais conseguir manter essa condição de competitividade que o nosso agro tem com nossos maiores concorrentes. Além disso, existem outros pontos diversos na reforma tributária que estamos questionando.

Quais são eles?

Pedro Lupion: É uma cadeia muito grande e temos particularidades em cada um dos produtos que representamos aqui. O maior ponto de preocupação hoje é o fim da diferenciação de alíquotas dentro da cadeia produtiva. Isso precisa ser mantido. Precisamos buscar entendimento com relator e grupo de trabalho para conseguirmos manter minimamente a diferenciação dos diversos produtos que existem. Não podemos tratar de um imposto que vai lá frente taxar todo mundo igual, porque perdemos toda nossa competitividade.

A Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) defende, como principal ponto na reforma tributária, justamente o tratamento diferenciado dentro do IVA, com uma alíquota diferenciada para o agro. Por quê? É questão de segurança alimentar? Ou valorização do agro sobre os outros setores?

Pedro Lupion: Primeiro, segurança alimentar. Somos responsáveis pela produção de alimentos, somos o maior produtor de alimentos do mundo. É óbvio que, quando a gente tiver aumento do custo de produção, esse custo é repassado ao consumidor. Estamos falando de um País em que as pessoas não têm uma renda per capita alta, existe dificuldade na manutenção dos valores, principalmente da cesta básica. Repassar isso ao consumidor vai exatamente contra aquilo tudo que esse governo diz defender, que é o social, a possibilidade de ter alimento barato e, principalmente, conter a inflação. A partir do momento que se tem aumento do custo de produção, tem aumento de custo para o consumidor. Isso faz com que a gente se preocupe bastante.

Como avalia o cashback a pessoas de baixa renda para compensar a oneração da cesta básica?

Pedro Lupion: A ideia do cashback da cesta básica é uma ideia ótima, funciona bem na Escandinávia, aqui no Brasil é difícil. Existe muita informalidade, muito produto sem nota, muita compra direta do consumidor lá na vendinha do interior que não vai pegar cashback de cesta básica. Então, isso significa ter produto caro na gôndola do mercado, aumento de inflação, aumento de preço, de custo, diminuição do valor de salário. Isso tudo é preocupante até para a economia do País.

O cashback foi uma ideia que veio do próprio governo. Qual é o espaço para negociação?

Pedro Lupion:

Pedro Lupion: Tomamos a decisão de convidar o professor Bernard Appy (secretário extraordinário para Reforma Tributária no Ministério da Fazenda) para vir aqui na FPA conversar conosco. Vamos colocar os nossos técnicos também para debater. Entre toda a cadeia produtiva são mais de 50 entidades aqui dentro que representam o agro como um todo, seja produtor, seja indústria. É tudo muito cru ainda, são apresentações ainda prematuras. À primeira vista, a meu ver, parece que essa questão de cashback seria uma oneração desnecessária na cesta básica e aumentaria um custo grande para o produtor e, principalmente, para o consumidor. Vamos ver, às vezes a gente pode estar enganado. Se houver uma explicação plausível, vamos ouvir e tomar uma decisão. Nosso interesse como bancada é reformar e simplificar o sistema tributário brasileiro. O que a gente não pode aceitar de jeito nenhum é aumento de preço de alimentos e do custo de produção. Essa conta tem que ser dividida entre indústria, serviços, produtor para que a gente consiga ter uma reforma justa.

O que avançou em relação à semana passada, quando a Frente teve uma primeira reunião com o relator da reforma tributária na Câmara, Aguinaldo Ribeiro (PP-PB), e com o coordenador do grupo de trabalho, Reginaldo Lopes (PT-MG)?

Pedro Lupion: As narrativas melhoraram muito. As falas, inclusive, do deputado Baleia Rossi, do deputado Aguinaldo Ribeiro, do próprio Reginaldo Lopes. Ficou claro para o governo que precisarão sentar conosco para tratar de uma reforma, para buscar convergências num projeto de reforma. Colocamos claramente nossa posição de buscar o entendimento técnico e sugestões técnicas para que o projeto melhore e a gente consiga avançar na votação.

A Frente já colocou como prioridades no Congresso o projeto de lei dos defensivos agrícolas, a regularização fundiária e o licenciamento ambiental, que estão no Senado. Essas pautas vão avançar ou o foco será somente a reforma tributária?

Pedro Lupion: Nós fomos muito bem na Câmara na última legislatura e tivemos um pouco mais de dificuldade no Senado [com os projetos]. O cenário mudou bastante. Hoje nós temos uma bancada grande no Senado. Então, temos uma expectativa muito grande em relação ao Senado. Esses três projetos são prioridade, obviamente. São questões primordiais para o agro. A regularização fundiária é avanço para o País, possibilidade de atrair investimento. Licenciamento ambiental é simplificação do sistema, é possibilidade de conseguirmos gerar emprego, trazer investimentos. A questão de defensivos agrícolas é mais uma guerra de narrativas do que uma questão técnica. Queremos simplificação do sistema de registro de produtos para conseguirmos ter moléculas mais modernas, mais atuais, menos danosas para saúde e o ambiente.

Há outros projetos prioritários?

Pedro Lupion: Além das duas questões de direito de propriedade, temos a questão da demarcação de terras indígenas. Há um julgamento em andamento no STF que trata daquela questão de Santa Catarina, que terá repercussão geral e que pode acabar com o marco temporal. Nós precisamos deixar claro a questão do marco temporal, estamos sujeitos a perder 20% do território brasileiro em áreas de produção para demarcação indígenas. Precisamos conversar sobre isso com todo cuidado, responsabilidade.

Fonte: Broadcast Agro.