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22/Dez/2022

Agenda para a agropecuária para a próxima década

De acordo com o “OECD-FAO Agricultural Outlook 2022-2031”, para que seja possível acabar com a fome e alcançar a segurança alimentar global, a produtividade agrícola global média precisa aumentar em 28% nos próximos 10 anos. Isso é mais do que o triplo do aumento da última década. Em paralelo, o relatório “O estado da segurança alimentar e nutricional no mundo em 2022”, da Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO), aponta que aproximadamente 12% da população global (928 milhões de pessoas) viveu em situação de grave insegurança alimentar em 2020, o que é uma realidade devastadora para a humanidade. Não é necessário ressaltar a fabulosa evolução da produção de alimentos nas últimas quatro décadas, que permitiu ao Brasil deixar de ser um importador de alimentos e passar a exportar alimentos para mais de 175 países. O desenvolvimento do País está diretamente atrelado a essa evolução. No entanto, em tempos de guerra, crise econômica, pandemia, fome e de crise do multilateralismo é essencial ponderar uma série de desafios para que a agropecuária se fortaleça e transforme o Brasil no mais importante produtor de alimentos saudáveis e sustentáveis do mundo.

O primeiro desafio é reduzir drasticamente o abismo que separa a produção integrada às cadeias produtivas e mercados, organizada em cooperativas e entidades de produtores da produção de subsistência, de baixa produtividade, que tem restrições a crédito, serviços e tecnologias. Há aproximadamente 3,9 milhões de pequenos produtores e integrá-los a sistemas produtivos eficientes é um obstáculo que precisa ser superado para fortalecer o desenvolvimento do País. A visão de que existe uma agropecuária que produz alimentos saudáveis e a outra que produz alimentos envenenados, ou o agronegócio que se contrapõe à agricultura familiar é míope e prejudicará o combate à fome, o crescimento das exportações e a redução substancial da pobreza no campo. Para que seja possível promover uma profunda transformação na agropecuária, que ainda precisa de suporte em todos os cantos do País, é crucial tratar de inovação, capacitação e treinamento como elementos intrínsecos dessa evolução.

A agricultura produtiva e resiliente depende de maquinários, equipamentos, energia, insumos, pessoal capacitado e crédito. Sem inovação permanente corre-se o risco de coroar uma agricultura pujante que convive com uma agricultura primária. A agricultura regenerativa com integração de diversas culturas e sistemas agroflorestais, a produção de biometano com dejetos agropecuários, a produção integrada de aves, a agricultura que usa drones e aplicativos de ponta para irrigação, a produção de duas a três safras por ano, que gere algodão, grãos, carnes, peixes, etanol de cana e de milho, DDG para alimentação animal, bioeletricidade, flores, frutas, castanhas, dentre outros produtos, dependem de inovação constante e pessoal treinado e capacitado para os novos serviços gerados pelo agro. Há um vazio de mão de obra qualificada que precisa ser enfrentado. Para que o acesso contínuo a tecnologias e serviços chegue a todos os rincões do País, é preciso aprimorar o financiamento da agropecuária.

A política agrícola, tradicionalmente ancorada nos Planos Safra anuais, que hoje inclui o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), é o principal instrumento de política pública que merece ser aperfeiçoado. É prudente reconhecer que os recursos públicos devem ser cada vez mais voltados para pequenos e médios produtores, que mais precisam dos subsídios que permitem reduzir os custos de produção e a adoção de novas tecnologias e práticas. Isso enseja além de repensar a política agrícola, estimular o mercado financeiro a fomentar a produção de todos os sistemas produtivos com taxas de juros mais atrativas e melhores condições de contratação, inclusive no seguro rural. A implementação da agenda BC# Sustentabilidade é fundamental para diferenciar as condições de financiamento aos empreendimentos que já estão na trilha de sustentabilidade e identificar aqueles que precisam implementar práticas e tecnologias sustentáveis. A recuperação de áreas degradadas é outra agenda que merece atenção.

O Plano ABC+ propõe recuperar 30 milhões de hectares de áreas para pecuária e agricultura. Isso representa uma fabulosa oportunidade para expandir a produção de alimentos e energias, fortalecer a segurança alimentar aliada à conservação dos recursos naturais e à adaptação dos sistemas produtivos. A adequação do agro ao Código Florestal é outra agenda central para os próximos anos. O Cadastro Ambiental Rural (CAR) precisa se tornar o passaporte verde do produtor rural. De um lado, porque permitirá comprovar que cumpre os requisitos de conservação ou está em processo de restauração ou compensação dos passivos, de outro, porque passará ao longo da cadeia produtiva uma informação sobre não existência de desmatamento ilegal e do quanto o agro conserva. O CAR é uma ferramenta de gestão das áreas produtivas, incluindo assentamentos, que precisa ser utilizada pelos órgãos públicos, bancos, produtores, traders e outros atores na cadeia de valor. Desperdiçar essa oportunidade será tremendamente prejudicial para agregar ativos de sustentabilidade ao agro e estampar que os produtos se baseiam em um enfoque de produção e conservação.

Sem transparência sobre uso da terra e desmatamento, o agro se enfraquece. Junto com o Código Florestal e o controle severo do desmatamento ilegal e da promoção de incentivos que permitam pagar pelo desmatamento legal evitado, a agenda de regularização fundiária é outro óbice urgente que precisa ser enfrentado. A extensão de terras devolutas, o ímpeto de grilagem de terras e a precariedade dos órgãos públicos salta aos olhos. Essa pauta deve ser uma agenda de estado e pensada estrategicamente, com orçamento substancialmente fortalecido. Outro desafio central trata do comércio internacional e do acesso a mercados. É essencial retomar uma agenda ambiciosa que favoreça a integração das cadeias produtivas no comércio internacional, potencializando novos produtos, de cadeias menores e inovadoras e abrir mercado para bens com maior valor agregado. O exemplo das exportações de frutas e castanhas nos últimos anos ilustra com clareza esses potenciais. Na agenda de comércio internacional é essencial promover o fortalecimento da Organização Mundial do Comércio como entidade que cria e rege as regras multilaterais.

O Brasil sempre teve um papel de liderança na Organização Mundial do Comércio (OMC). É preciso agora, engajar o país na negociação de acordos regionais com países que serão cada vez mais relevantes no mercado internacional, como China e países do sudeste asiático. Vale, nessa agenda, apontar que a ratificação do Acordo UE Mercosul pode servir como o primeiro desafio a ser alcançado, e tem nas questões ambientais um ponto central. Esses são alguns desafios que precisam ser estrategicamente trabalhados para que seja possível transformar a agropecuária brasileira, acabar com a fome, gerar riquezas e desenvolvimento socioeconômico. Em momento de transição de governo, onde se discute e tenta repensar várias agendas para o país é válido refletir como potencializar o desenvolvimento da agropecuária integrando todos os sistemas produtivos como vetor do desenvolvimento do Brasil. Autor: Rodrigo C. A. Lima é sócio-diretor da Agroicone. Advogado, Doutor em Direito das Relações Econômicas Internacionais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), possui 18 anos de experiência em comércio internacional e desenvolvimento sustentável no setor agropecuário e de energias renováveis. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.