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25/Nov/2022

Biodiversidade e agenda climática estão conectadas

Os resultados da 27ª Conferência das Partes da Convenção Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças do Clima (COP-27), que terminou em Sharm El-Sheikh, no Egito, evidenciam que, apesar dos avanços para limitar o aquecimento global em no máximo 1,5ºC, é preciso aprofundar as ações que permitam descarbonizar a economia. Estima-se que, se todas as metas submetidas ao Acordo de Paris forem cumpridas, o aumento de temperatura deverá chegar a 2,9º C, trazendo uma infinidade de impactos, especialmente para países e populações mais vulneráveis. O acordo para estabelecer um fundo de financiamento para perdas e danos causados pelo aquecimento global bem como a continuidade das discussões sobre aumentar os recursos para financiamento climático ilustram, com veemência, que, sem recursos, a almejada transição para uma economia de baixo carbono não sairá do papel. O Plano de Implementação de Sharm El-Sheikh sugere que, para permitir uma transformação global em direção às metas do Acordo de Paris, são necessários investimentos na casa de US$ 4 a 6 trilhões por ano.

Vários compromissos e acordos paralelos à agenda formal da COP-27 foram anunciados, como a como a Forest and Climate Leaders' Partnership (FCLP) e o Acordo entre Brasil, Indonésia e a República Democrática do Congo para criar um mecanismo de financiamento voltado para a conservação das florestas. Enquanto se busca compreender os resultados práticos da COP-27, vale destacar que, em dezembro, ocorre a 15ª Conferência das Partes (COP-15) da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), em Montreal. Junto com a agenda de mudanças do clima, a pauta da biodiversidade tenderá a ganhar, progressivamente, um amplo espaço no plano multilateral, demandando a mobilização de esforços e a ação de todos os atores (stakeholders) da sociedade, incluindo organizações intergovernamentais, empresas, instituições financeiras, comunidade científica, jovens e mulheres, povos indígenas e comunidades locais, dentre autoridades subnacionais.

Solidifica-se a mensagem, no âmbito da CDB, de que todos os atores da sociedade como um todo serão os responsáveis pelo alcance dos compromissos globais de biodiversidade, e não apenas os governos nacionais. A COP-15 tem como objetivo principal aprovar o Marco Global para a Biodiversidade Pós-2020, considerado como um "pacote de compromissos" que, em seu cerne, contém 22 metas globais para ação, a serem alcançadas até 2030. Espera-se que tais metas permitam conter e reverter a tendência global de perda da biodiversidade, viabilizar a implementação de medidas efetivas de conservação e de restauração, estimular o uso sustentável dos recursos naturais, conhecer e explorar os recursos genéticos, bem como repartir, de forma justa e equitativa, os benefícios oriundos da utilização destes recursos genéticos e do conhecimento tradicional associado a tais recursos. O Marco Global será, na prática, um "acordo vivo" que orientará as ações dos países, do setor privado e da sociedade, visando ao cumprimento da Visão 2050 de "Viver em harmonia com a natureza".

De acordo com tal Visão, a biodiversidade deve ser valorizada, conservada, restaurada e utilizada com sabedoria, mantendo os serviços ecossistêmicos, sustentando um planeta saudável e oferecendo benefícios essenciais para todas as pessoas. Espera-se colocar a agenda de biodiversidade no mesmo patamar de importância que a agenda climática. É essencial conter a perda de biodiversidade, o que envolve reduzir drasticamente a perda de vegetação nativa e de espécies da fauna e da flora. É urgente que todos os países busquem recuperar sua biodiversidade, adotando restauração de áreas terrestres e marinhas e favorecendo a conectividade de áreas. De forma mais ampla, será fundamental construir soluções para estimular uso sustentável da diversidade biológica em todos os setores produtivos.

Reduzir a poluição, integrar o setor privado na adoção de medidas que reduzam impactos negativos e potencializem os positivos para a biodiversidade, explorar os benefícios da biotecnologia e das novas tecnologias, a exemplo da edição gênica, são desafios que potencializarão os cobenefícios ligados ao uso da biodiversidade. No mesmo sentido, a agenda de recursos genéticos integra a pauta da COP-15, levando-se em conta a importância de um sistema geral de acesso e repartição de benefícios mais simples, exequível e que proporcione segurança jurídica a todos os atores interessados. A COP-27 e a COP-15 são espaços para aprofundar, na perspectiva multilateral, a reflexão sobre como endereçar as crises climática e de perda de biodiversidade, apontadas pela United Nations Environment Programme.

No entanto, essas crises se conectam a uma crise maior do multilateralismo, que assiste ao crescimento da insegurança alimentar e energética, da pobreza, da crise econômica e da credibilidade para a construção conjunta de soluções para os desafios da humanidade. As conexões entre clima e biodiversidade mostram uma intrínseca relação do que se pode denominar, no jargão das relações internacionais, bens públicos globais. A capacidade global de proteger e incrementar esses bens públicos, necessários para manter a qualidade de vida e, em certos casos, permitir que a vida exista, está nas mãos dos países, do setor privado, do mercado financeiro, das populações locais e indígenas e da sociedade civil, entre outros atores. O Brasil tem um papel central tanto na agenda climática quanto na agenda de biodiversidade.

A urgência e a oportunidade de eliminar o desmatamento ilegal permitirá não apenas reduzir drasticamente as emissões de GEE, mas fortalecer ganhos para a biodiversidade e os beneficiários dos seus serviços. E essa pauta é inerente ao desenvolvimento do País. Associado a isso, está a habilidade de se criarem soluções para a bioeconomia, para as populações que vivem da e na floresta, a possibilidade de conhecer e explorar os recursos genéticos da biodiversidade e gerar renda e benefícios voltados para a conservação e uso sustentável. O Brasil será fundamental na oferta de alimentos, o que deve envolver todos os sistemas produtivos, fortalecendo a oferta interna de alimentos e as exportações, incluindo a agricultura familiar, sistemas agroflorestais e agroecologia, especialmente voltados para frutas, hortaliças e outros produtos.

Inovação no campo significará uma agricultura resiliente, mais produtiva, regenerativa, que recupera áreas degradadas, fortalece a fertilidade dos solos e que reduz a intensidade de emissões. Ampliar a produção de energias renováveis é uma questão de estimular os investimentos e expandir as fontes renováveis, de acordo com os potenciais de cada país. Fomentar a mineração sustentável é outro aspecto inerente ao uso sustentável dos recursos naturais. É razoável dizer que o Brasil é o centro das atenções quando se vislumbra o potencial de sua riquíssima biodiversidade e a apreensão quanto à perda dos recursos naturais. Como na agenda de clima, financiamento será um tema deveras relevante na COP-15. Espera-se evoluir com a criação de um novo fundo dedicado a apoiar os países na implementação do Marco Global de Biodiversidade.

É evidente, contudo, que há uma flagrante dificuldade de se mobilizar recursos vultosos, o que exigirá de maneira efetiva, o maior envolvimento do setor privado, do mercado financeiro e de outros atores que permitam contribuir com a implementação das ações. Promover transformações diante das futuras metas de biodiversidade exigirá cooperação profunda no plano multilateral. Exigirá também entender as diferenças e dialogar a fim de se construírem soluções para os desafios comuns da humanidade. O Brasil pode ser uma ponte para ganhos climáticos, de biodiversidade e do multilateralismo, elementos intrínsecos de uma sociedade comprometida com o desenvolvimento sustentável para todos. Fonte. Rodrigo C. A. Lima. Broadcast Agro.