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23/Ago/2022

BC inicia regulação de impacto climático a bancos

Em dezembro, os bancos brasileiros entram numa nova era sobre como medir os riscos implícitos à sua atividade e que possam contaminar o sistema financeiro tendo como foco os impactos das mudanças climáticas para seus negócios. Na América Latina, o Brasil está na vanguarda desse processo, que começou a ser tateado pelas principais economias do globo e, em outubro, o Banco Central deve apresentar no Relatório de Estabilidade Financeira (REF) algumas referências a serem seguidas pelas instituições na elaboração de suas estimativas. A autarquia começou a editar novas normas que consideram riscos climáticos há um ano. No fim de 2022, o órgão começará a cobrar dos bancos, além da exigência de uma política de responsabilidade social, ambiental e climática e de um relatório anual com informações padronizadas sobre o tema, a inclusão desses critérios na estrutura de gerenciamento de risco e capital.

O próprio Banco Central admite que o início do processo será de ensaio e erro, modo como também outras autoridades monetárias e reguladores pelo mundo vêm tratando a questão. O assunto é novo para todos e, por isso, metodologias e técnicas de testes de estresse, que já evoluem constantemente, podem passar por mais mudanças do que o normal ao longo do caminho. Existem várias lacunas a serem preenchidas, informações a serem geradas, coletas de dados a realizar, técnicas a serem desenvolvidas. O desafio é significativo, considera a instituição. No documento de outubro, devem vir, por exemplo, detalhes sobre como as instituições terão de calcular reflexos de uma seca extrema sobre seus serviços e ativos, além de um estudo sobre riscos de transição. Como se trata ainda de um aprendizado para todos, o BC promete que não será tão exigente no início desses trabalhos.

Já avisou que não necessariamente os bancos devem seguir esse modelo, embora vá monitorar os preparativos para cumprir as novas normas em sua agenda de supervisão para o semestre. Em geral, visões agregadas apresentam simplificações, pois é necessário adequar o estudo à disponibilidade de dados e informações de diferentes tipos de instituição. Se o risco for relevante para uma dada instituição, essa deve desenvolver uma técnica mais aprimorada para avaliar o risco. O Banco da Inglaterra (BoE), referência para o BC brasileiro pelo menos desde a implantação do sistema de metas de inflação no Brasil, começou a editar normas em 2019 para garantir que o sistema fosse resiliente aos riscos financeiros relacionados ao clima. Naquele ano, algumas regulamentações foram divulgadas com um prazo até o fim de 2021 para que as instituições passassem a incorporá-las.

Paralelamente, lançou um exercício bienal (conhecido pela sigla CBES) para avaliar a resiliência dos principais bancos, seguradoras e do sistema financeiro do Reino Unido a diferentes cenários climáticos, dimensionando as exposições financeiras, identificando desafios aos modelos de negócios das empresas e melhorando as empresas de gerenciamento de riscos. Neste ano, o BoE acrescentou questões de risco climático para as instituições no seu papel de supervisão, considerando as expectativas de progresso individualmente para as diferentes casas. Agora, essas empresas que estão sob o guarda-chuva do BoE já começam a ter de apresentar determinados montantes de capital contra riscos climáticos materiais e a expectativa é a de que, até o fim deste ano, o Banco da Inglaterra apresente novas etapas sobre o uso de capital com objetivos micro e macroprudenciais.

Em julho, o Banco Central Europeu (BCE) avaliou que, apesar dos avanços vistos desde 2020 nessa área, os bancos ainda não incorporaram o risco climático em suas estruturas e modelos de teste de estresse de forma significativa. A previsão é a de que esta fase até agora, vista como uma espécie de teste para todo o setor, ganhe musculatura a partir do ano que vem, já que é aguardada uma revisão temática ainda este ano sobre como os bancos vêm incorporando suas informações em seus balanços. Nos Estados Unidos, o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) prometeu progressos nessa área ainda neste segundo semestre do ano. Em audiência no Congresso em janeiro, o presidente do Fed, Jerome Powell, avaliou que os testes de risco de estresse, incorporando as questões climáticas, serão uma importante ferramenta para que os bancos centrais possam trabalhar daqui em diante.

Por enquanto, segundo ele, trata-se realmente de garantir que as grandes instituições financeiras compreendam todos os riscos que estão assumindo, incluindo os riscos que podem ser inerentes a seus modelos de negócios em relação às mudanças climáticas ao longo do tempo. Wall Street espera que o Fed conduza seu primeiro exercício desse tipo e divulgue os resultados até 2023. Sem um padrão definido pelo Banco Central sobre como contabilizar em seus balanços os riscos climáticos, as instituições financeiras no Brasil buscam apoio de especialistas para poderem atender a novas regras do regulador, que devem ser conhecidas em dois meses. Consultorias têm sido procuradas para tirar dúvidas sobre o tema e a tendência é que todos "entreguem a prova", mas algumas casas devem se aprofundar mais no tema e serem muito mais agressivas que outras. Vão ter instituições financeiras mais avançadas do que outras, destacou a Organização das Nações Unidas (ONU).

As maiores acabam ficando na vanguarda, pois índices e investidores externos geram pressão. Não está todo mundo na mesma página. Mas, a regulação trouxe a urgência do tema, não é mais uma questão voluntária, completa. O Banco Central destaca que não há metodologia ou técnica de elaboração prescrita para os testes de estresse, a partir das estabelecidas pela regulação: análise de sensibilidade; análise de cenários; e teste de estresse reverso. A escolha de qual metodologia e a complexidade da técnica aplicada deve ser adequada ao risco incorrido em cada instituição, argumenta o BC, reforçando que vem se posicionado sobre o tema no Relatório de Estabilidade Financeira (REF). No mercado, a Federação Brasileira de Bancos (Febraban) afirma que, apesar de o BC não ter definido uma metodologia ou cenários específicos para os testes de estresse, criou requisitos importantes, como a análise temporal, geográfica, setorial e o alinhamento a aspectos já considerados no gerenciamento de risco.

Há um diálogo respeitoso e construtivo com o BC, que tem expectativa de agenda evolutiva. Não é para ter punição, é para avançar como setor bancário. A Febraban já desenvolveu, em parceria com a Coppe/UFRJ e a empresa WayCarbon, cenários climáticos "tropicalizados" para setores-chave da economia brasileira, que podem ser subsídios para análises e testes de estresse dos bancos. Segundo relatório publicado em 2021, com base em dados do Banco Central e em uma taxonomia desenvolvida pela Febraban, a exposição da carteira de crédito para empresas ao risco ambiental era de 43,60% no fim de 2020. Já a exposição moderada ou alta às mudanças climáticas era de 53,29%. Além disso, a Febraban criou um grupo específico para implementar as novas regras do BC, com encontros mensais para tirar dúvidas e orientar sobre bases de dados e procedimentos.

Os associados, que já seguem uma autorregulação sobre o tema desde 2014, estão trabalhando para estar de acordo com as novas regras em dezembro. Uma das grandes dificuldades dos bancos para mapear a exposição de suas carteiras aos riscos climáticos e de transição é a falta ou mesmo a disparidade de informações, além dos desafios de adaptação das rotinas e capacitação. Um estudo recente da consultoria Oliver Wyman mostra que os ratings ESG variam bastante entre as agências de classificação de risco, ao contrário dos ratings de crédito, que convergem. Além disso, as bases de dados têm muita informação sobre a Europa, mas, no Brasil, a cobertura é baixa. Para além das obrigações com o BC, alguns bancos com operação no País já aderiram ao compromisso de neutralidade de emissões de carbono em 2050 da ONU.

Dentre os locais, estão Bradesco, Itaú e BTG Pactual. A agenda da ONU dá um passo além ante o regulador do sistema financeiro nacional, que busca mapear riscos e oportunidades, estabelecendo também que as instituições devem definir metas de descarbonização. A régua é alta e o objetivo é que os bancos alinhem seus portfólios ao Acordo de Paris, ajudando os clientes nessa transição. A taxonomia é um dos grandes pontos de interrogação do setor. Como não há um padrão internacional até o momento e muitos acreditam que dificilmente será feito um, algumas instituições financeiras, como o Itaú, por exemplo, passaram a criar seus próprios requisitos básicos para poderem avançar em serviços e transparência sobre o tema.

O que o mundo todo se pergunta é: como ajustar um só padrão para todos os tipos de itens e negociações que faça sentido para um mercado específico e ao mesmo tempo sirva de referência para operações com outros agentes e países? Da mesma forma que não se pretende engessar demasiadamente um mercado que está apenas engatinhando, temem-se os riscos que possam vir dele, principalmente o chamado greenwashing, que é a prática de classificar ativos como verdes quando, na realidade, não são. Para se ter uma ideia, as três maiores agências de classificação de risco do mundo também criaram suas próprias referências e, apesar de serem do mesmo setor e buscarem o mesmo objetivo de medir a saúde financeira de um papel, empresa ou governo, têm réguas distintas para as variáveis relacionadas às questões climáticas. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.