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03/Jun/2022

Brasil: inação do governo e agravamento da fome

Com a pandemia, a desigualdade, a pobreza e a fome aumentaram no Brasil. Também aumentaram no mundo, e foram agravadas pela guerra da Rússia e pelas ações criminosas de Vladimir Putin, como o bloqueio naval do Mar Negro, o confisco de grãos e maquinários ucranianos e a retenção de estoques na Rússia. A Organização das Nações Unidas alerta para um "furacão da fome". O paralelo pode servir de desculpa para a resignação e, pior, de pretexto para a inação do poder público brasileiro. Afinal, o Brasil não existe no vácuo e é impotente para alterar o curso das grandes engrenagens planetárias. Mas, dados cotejados do Gallup World Poll pela FGV Social, comprovam que o problema é bem maior no Brasil. Ele antecede a pandemia, e os efeitos dela no País foram mais profundos. Entre 2019 e 2021, a parcela de brasileiros a quem, no curso de 12 meses, faltou dinheiro para alimentar a si ou a família subiu de 30% para 36%. Durante a pandemia, a insegurança alimentar no Brasil subiu 4,48% a mais do que no resto do mundo.

Mas, a pandemia só acentuou um mal que se alastrava. Entre 2004 e 2013, a proporção de famílias em insegurança alimentar caiu 35,2%. Em 2014, o Brasil saiu oficialmente do Mapa da Fome. Mas, no mesmo ano, com o fim do superciclo das commodities e, sobretudo, com os desmandos da gestão Dilma Rousseff, a economia entrou na pior recessão da história recente. Entre 2013 e 2018, as famílias em insegurança aumentaram 62,3%. Assim, se em 2014 o Brasil estava com níveis de insegurança inferiores a 75% dos 141 países pesquisados pelo Gallup, em 2021 atingiu um nível menor que 52% deles e passou, pela primeira vez na série histórica iniciada em 2006, a ter níveis piores que a média global. Tudo somado, em 7 anos a fome no Brasil dobrou. Mas, além das medianas, o choque foi brutalmente desproporcional entre ricos e pobres.

Entre 2014 e 2021, a insegurança alimentar entre os 20% mais pobres cresceu quase 40% (de 36% para 75%), ultrapassando a média global (48%) e chegando a um nível próximo a países com maior insegurança, como o Zimbábue (80%). Enquanto isso, entre os 20% mais ricos a insegurança caiu 3% (de 10% para 7%), ficando um pouco abaixo do país com menos insegurança alimentar no mundo, a Suécia (5%). Os dados revelam ainda uma "feminização da fome" na pandemia. Entre 2019 e 2021, enquanto a insegurança alimentar caía 1% entre os homens (de 27% para 26%), ela aumentava 14% entre as mulheres (de 33% para 47%), possivelmente porque as mulheres foram mais afetadas no mercado de trabalho, sendo mais demandadas em casa durante o isolamento social e o fechamento das escolas. A diferença entre gêneros no Brasil é hoje 6 vezes maior do que a média global. A combinação dessas mazelas é catastrófica. A insegurança alimentar está mais concentrada em indivíduos de meia-idade, mulheres e pobres, que moram em domicílios com maior número de crianças. A fome é um sofrimento infernal para adultos e crianças. Mas, a subnutrição infantil deixa sequelas físicas e mentais por toda a vida.

A desgraça é, antes de tudo, humanitária, mas também socioeconômica. Entre outros efeitos, os problemas de alimentação brasileiros estão associados à prevalência de doenças crônicas, baixo desempenho escolar e baixa produtividade no trabalho. A fome no presente depaupera o futuro. A guerra deve agravar a inflação e a escassez de alimentos no mundo nos próximos meses. Mais uma vez, o problema tende a ser magnificado pelas precariedades econômicas peculiares do Brasil. A inflação de 12 meses chega a 12%, e para a classe mais baixa está 1,9% acima da mais alta. Os juros sobem e o desemprego persiste nos dois dígitos. A estagflação foi pior para os mais pobres e tende a piorar. A tragédia é ainda mais chocante quando se considera que se passa no "Celeiro do Mundo". Ou seja: não falta comida no Brasil. Faltam renda, emprego, programas emergenciais e solidariedade. Se há uma pauta primordial para as eleições, é a fome. Fonte: Broadcast Agro. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.