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13/Dez/2021

Green Bonds: oportunidades para o agronegócio

A América Latina registrou neste ano um total de US$ 11,34 bilhões em emissões de green bonds, sendo destes US$ 4,25 bilhões no Brasil. Em 2021, os lançamentos destes títulos verdes no País subiram 41% ante 2020. Segundo Isabelle Frederique Braly-Cartillier, especialista sênior em Mercados de Capitais do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), dado o contexto internacional e o dinamismo do mercado local, esta tendência permanecerá nos próximos anos. O BID é responsável por 30% da estruturação de emissões de green bonds na América Latina desde 2016.

A COP-26 incentivará países e empresas a adotar medidas que permitam ficar alinhadas com os princípios do Acordo de Paris para 2050. As companhias precisarão comunicar quais são suas estratégias para a descarbonização, mas para isso precisarão investir em iniciativas que tornem estas metas realidade. Os green bonds são uma boa maneira de financiar estes investimentos. Na avaliação da especialista do BID, os setores de energia e transporte são os dois maiores do mercado de green bonds na América Latina e deverão continuar desta forma por vários anos, especialmente por causa da demanda na região por novos projetos de infraestrutura.

No caso de transporte, a expansão será "exponencial" devido à busca da emissão zero de carbono, pois todos os países precisarão fazer imensos investimentos para ter veículos elétricos. Por outro lado, os investidores também estão muito interessados em aplicar recursos nos segmentos de mobilidade e de energias renováveis. No Brasil, além daqueles dois setores, ela acredita que a agricultura será o próximo segmento produtivo que vai se desenvolver com rapidez na emissão de green bonds. Segue a entrevista:

Como a senhora avalia o ritmo de expansão do mercado internacional de green bonds, especialmente no Brasil e América Latina?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: O mercado mundial de green bonds atingiu a marca recorde próxima de US$ 500 bilhões neste ano, pois voltou a se expandir depois de ficar estável em 2020 devido à pandemia da Covid-19. Em 2021, a América Latina registrou um total de US$ 11,34 bilhões em emissões, sendo destes US$ 4,25 bilhões no Brasil. Em 2020, o Brasil teve um aumento de 58% nas emissões em comparação a 2019, e de 41% em 2021 em relação a 2020. Dado o contexto internacional e o dinamismo do mercado local, acreditamos que esta tendência permanecerá nos próximos anos. A COP26 incentivará países e empresas a adotar medidas que permitam ficar alinhadas com os princípios do Acordo de Paris para 2050. As companhias precisarão comunicar quais são suas estratégias para a descarbonização, mas para isso precisarão investir em iniciativas que tornem estas metas realidade. Os green bonds são uma boa maneira de financiar estes investimentos. Por exemplo: o setor de tratamento de água potável é muito engajado em questões ambientais, mas ainda não tem uma atuação expressiva no mercado de green bonds. De certa forma, o mesmo ocorre com outros segmentos, como tratamento de resíduos. Os setores de energia e transporte são os dois maiores do mercado de green bonds na América Latina e deverão continuar assim por vários anos, devido à demanda da região por novos projetos de infraestrutura. No caso de transporte, a expansão será exponencial devido à busca da emissão zero de carbono, pois todos os países precisarão fazer imensos investimentos para ter veículos elétricos. E por outro lado, os investidores também estão muito interessados em aplicar recursos nos segmentos de mobilidade e de energias renováveis. Há um grande portfólio de projetos e existe também alta procura de investidores, portanto o mercado vai crescer.

Haveria um problema de comunicação dos agentes internacionais que promovem os green bonds, pois a maioria das empresas não sabe como podem ter acesso a este mercado global, o que limita sua própria expansão?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: Eu concordo que é necessária maior conscientização sobre os green bonds. Este mercado não começou há muito tempo. Existe grande potencial para a participação de pequenas e médias empresas pelo mundo, mas elas em geral não emitem títulos de dívida. Contudo, os bancos que trabalham com estas companhias lançam títulos e podem emitir green bonds para investir nestas companhias. É uma questão de tempo para que ocorra esta expansão, mas estamos melhorando. Quanto mais empresas de um determinado setor emitirem green bonds, mais seus concorrentes ficarão atentos e poderão também decidir atuar neste mercado.

Qual é a sua avaliação sobre a participação do Brasil no mercado de green bonds?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: No Brasil, o setor privado é muito ativo em green bonds, diferente do que ocorre no Chile, onde grande parte destas emissões são de títulos soberanos. O Brasil tem um mercado muito vibrante com a atuação de companhias de diversos setores produtivos. Tal fato ocorre sobretudo porque as corporações no País têm uma longa história de emissão de títulos no mercado global de dívida, o que tornou mais fácil o acesso a outros instrumentos, como os títulos verdes. Como consequência, companhias que já atuavam com estes ativos começaram a emitir também títulos de sustentabilidade, o que foi um processo natural. Eu acredito que a agricultura será o próximo setor que vai se desenvolver na emissão de green bonds no Brasil, uma vez que há um contínuo desenvolvimento do mercado de títulos verdes para atender a esse setor. Como exemplo, cito as novas regras do Banco Central relativas ao Bureau Verde de Crédito Rural, assim como a recente criação da Cédula do Produtor Rural (CPR) com requisitos ambientalmente sustentáveis, o que pode fomentar novos recebíveis para lastrear a emissão de Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA) verdes e o desenvolvimento do mercado de títulos para atender as necessidades do segmento.

Como as políticas ambientais do governo do presidente Jair Bolsonaro, que causam grande rejeição de investidores internacionais, sobretudo na Europa, prejudicam a atuação do Brasil para a emissão de green bonds?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: Não estou na posição para responder esta pergunta. Mas os green bonds obedecem a padrões internacionais. Estes títulos emitidos em um país da Europa, da América Latina, nos EUA ou China utilizam a mesma taxonomia e os mesmos processos, como as diretrizes do ICMA (International Capital Market Association). É um mercado global que não é dependente de políticas governamentais de países.

Embora seja um mercado mundial, as companhias que operam no Brasil e emitem green bonds estão sujeitas a efeitos negativos de políticas e posições do governo, que depreciam o câmbio e provocam a elevação do CDS do País, como os sinais favoráveis do presidente Bolsonaro a um novo golpe militar.

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: Quando os investidores avaliam os green bonds que uma empresa quer emitir, eles analisam os ativos envolvidos e concordam com os impactos positivos que eles poderão trazer ao meio ambiente. Todo o investidor tem seus próprios parâmetros para realizar aplicações de recursos. Eles sabem onde querem e não querem investir, inclusive porque eles têm as suas próprias medidas de risco. Eles atuam da forma mais apropriada para cumprir o mandato dos seus investimentos.

Como a senhora analisa o potencial de avanço dos green bonds na área de transportes no Brasil, dado que o País ainda está bem distante de implementar uma ampla política de emissão zero de carbono no setor com grande produção de automóveis elétricos?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: Os investimentos em green bonds no Brasil têm grande potencial de expandir no setor de transporte público, pois viabiliza a redução do transporte individual e traz efeitos positivos para o meio ambiente. Por exemplo, as emissões de green bonds ajudaram no financiamento de linhas de metrô no Chile, o que trouxe imensos benefícios ao país.

Qual é a sua avaliação sobre o setor de energias renováveis no Brasil para as emissões de green bonds nos próximos dois ou três anos?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: Os projetos nesta área de energia, como solar e eólica, são perfeitos para a emissão de green bonds.

Quais são os fatores que podem acelerar o desenvolvimento do mercado de green bonds na América Latina e no Brasil no curto prazo?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: O primeiro ponto importante é assegurar que governos e empresas tenham as condições necessárias para emitir green bonds. Instituições financeiras sabem como emitir dívida o que torna muito fácil para lançar títulos verdes. Mas há também muitos segmentos de empresas que não emitem títulos de dívida ou o fizeram há muitos anos de forma esporádica, como companhias de abastecimento de água. É necessário também trabalhar muito para aumentar a transparência, com a divulgação de informações e padrões. Quem emite green bonds compromete-se a utilizar os recursos captados em atividades elegíveis e a comunicar como empregou o dinheiro e os impactos desses investimentos. Ao pensar em todos estes fatores, o BID criou uma plataforma de transparência, na qual estão juntas todas as emissões de green bonds e a comunicação de impactos é padronizada. Desta forma, os emissores de títulos podem informar seus green bonds que querem lançar e os investidores podem avaliar os detalhes destes ativos e assim escolher os mais interessantes para o seu negócio.

Como evitar que a emissão de green bonds não registre um problema sério que ameaça os bons padrões ESG que é o greenwashing?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: Como colaboramos para que um emissor possa atuar com green bonds demandamos o cumprimento de várias regras de alto nível, a fim de garantir que tais operações financeiras obedecerão às mais elevadas normas internacionais. Tal procedimento coíbe quaisquer ações de greenwashing.

Por que os financiamentos na transição da economia marrom para a verde ainda são baixos na América Latina?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: Eu acredito que é uma questão de padrões. Foram necessários muitos anos para que fossem aceitos em termos mundiais quais são os ativos verdes. Da mesma forma, também levará um certo tempo para que haja um consenso sobre o que deve ser considerado como essencial na transição para a economia verde. Demorará um pouco, mas certamente vai acontecer.

Há um certo dilema global em relação ao combate a mudanças climáticas, pois não avança a adoção da taxa internacional para a emissão de toneladas de carbono, que inclusive ainda não foi adotada pelos EUA. Como pensar em expansão expressiva do mercado de green bonds se ainda não existe uma cotação mundial para a emissão de CO2?

Isabelle Frederique Braly-Cartillier: Não é uma questão simples. Existem green bonds porque há investidores que têm mandatos para comprar estes títulos verdes, o que é independente da adoção da taxa sobre a emissão de carbono, pois eles querem encontrar estes ativos para aplicar seus recursos. No entanto, acredito que todas estas iniciativas internacionais caminham juntas e vão para a mesma direção.

Fonte: Agência Estado.