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27/Out/2021

Oportunidades para a transição energética limpa

Dentre as dez maiores economias do mundo, o Brasil se destaca por ter uma das matrizes energéticas mais limpas. Em 2020, as fontes renováveis representaram 48,4% de nossa oferta interna de energia, enquanto a média mundial em 2018 foi de 13,8%, e a dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico ou Económico (OCDE) foi de 11,0%. Este elevado percentual se deve principalmente à participação da biomassa: cana-de-açúcar com 19,1%, lenha e carvão vegetal com 8,9%, lixívia ou licor negro com 3,3%, e biodiesel com 1,8%, e à energia hidráulica, com 12,6%, eólica com 1,7%, e solar fotovoltaica com 0,3%. Portanto, o Brasil parte de um patamar privilegiado para planejar sua estratégia para a transição energética, onde novas tecnologias e potenciais aumentos de produtividade nas atuais representam oportunidades e escolhas a serem feitas. No campo dos não-renováveis, ainda dependemos do petróleo em 33,1%, do gás fóssil em 11,8%, do carvão mineral em 4,9%, e do urânio em 1,3%.

De agora em diante, planejar a transição energética vai requerer uma estratégia de desenvolvimento integrado e uma visão clara sobre os aproveitamentos possíveis, seus custos e prazos de maturação. Em qualquer hipótese será fundamental, além de metas de longo prazo ancoradas na sustentabilidade econômica, ambiental e social, a garantia de previsibilidade para que metas, uma vez definidas, não sejam modificadas por circunstâncias de curto prazo, garantam segurança regulatória e jurídica e induzam investimentos privados. Atualmente o mundo todo discute estratégias para a redução da dependência por energias fósseis. Este será tema central das discussões na próxima reunião do G20, e na COP-26 em Glasgow. No curto prazo, entretanto, como já havia sido alertado por muitos especialistas, alguns países correm o risco de aumentar a sua dependência por energia fóssil, e não o contrário.

É o que vem acontecendo naqueles que, ao abandonarem a energia nuclear, estão sendo obrigados no curto prazo a recorrer a um maior uso de energia térmica a partir do carvão, gás natural, e derivados de petróleo. O Brasil tem uma condição privilegiada em termos geográficos e de disponibilidade de recursos naturais. Ainda temos muito a evoluir no aproveitamento integral e expansão da energia de biomassa. As fontes eólica e solar fotovoltaica, cada vez mais competitivas, são intermitentes e precisam se encaixar num modelo suportado por energias firmes, ou então armazenadas. As baterias são uma forma de armazenamento e sua tecnologia evolui continuamente. Sua fabricação ainda depende de minerais raros, mas felizmente também somos abençoados neste campo. Outra forma de armazenamento é a sua conversão em hidrogênio pela eletrolise da água.

Embora armazenar e distribuir hidrogênio em tanques de alta pressão seja uma proposição de custo ainda elevado e em alguns casos arriscada, o que limita a sua distribuição espacial mais ampla, o seu aproveitamento energético para a produção de amônia, ferro gusa e uma série de outras aplicações industriais em polos de desenvolvimento representa uma enorme oportunidade a ser explorada. Em paralelo, a geração distribuída de hidrogênio pode ser planejada na forma de combustíveis líquidos de alta densidade energética e baixa pegada de carbono, como o etanol e o biometano, que possuem elevado teor de hidrogênio e já dispõem de infraestrutura instalada de distribuição. Em 2016, o centro de pesquisas da Nissan no Japão concluiu que, com o sistema de distribuição de etanol disponível, o Brasil já havia superado o desafio de distribuição do hidrogênio. O Brasil dispõe de condições geográficas privilegiadas para continuar sendo um líder global em energias limpas e renováveis. Isso será crescentemente importante quando se discute a possibilidade de imposição de barreiras e restrições tarifárias ao comércio relacionadas ao impacto ambiental dos produtos.

A energia solar fotovoltaica tem elevada eficiência em regiões próximas ao Equador, e nesse sentido somos privilegiados por dispormos de regiões altamente propícias a esse aproveitamento, principalmente na região Nordeste. Também dispomos de regiões em que a eficiência dos aerogeradores é praticamente o dobro da média mundial, viabilizando mais rapidamente os investimentos em expansão do parque eólico. Podemos continuar avançando nas extraordinárias máquinas biológicas de aproveitamento de energia solar através da biomassa, com combustíveis gerados de forma distribuída como o etanol de cana e milho para substituir gasolina, e o biometano para substituir óleo diesel e complementar a oferta de gás natural fóssil. Recentemente, foi anunciada a intenção de serem destinados recursos da ordem de 20 bilhões de reais para ampliação de usinas térmicas movidas a carvão mineral.

Num ambiente com tantos potenciais disponíveis em energias limpas, esse é um elemento do planejamento energético que deveria ser considerado com uma visão estratégica ampliada. Ainda temos muito a avançar na bioeletricidade gerada de forma firme a partir do eucalipto de reflorestamento, do bagaço e palha de cana-de-açúcar, e a partir de biogás gerado pelo aproveitamento de resíduos agroindustriais e resíduos sólidos urbanos. Podemos continuar avançando rapidamente na geração eólica e solar fotovoltaica, inclusive em áreas de maior declividade próximas de onde hoje se produz biomassa, cana, milho e soja, e sobre espelhos d´água nos reservatórios de nossas hidrelétricas. O Brasil é rico em opções energéticas limpas e modernas que podem ser desenvolvidas com grandes vantagens competitivas em relação a outros países. Cabe ao planejamento energético induzir as escolhas adequadas para que nossos produtos sejam produzidos a custos competitivos, com segurança de suprimento, e valorizados pelo seu baixo conteúdo de carbono. Fonte: Plinio Nastari. Agência Estado.