ANÁLISES

AGRO


SOJA


MILHO


ARROZ


ALGODÃO


TRIGO


FEIJÃO


CANA


CAFÉ


CARNES


FLV


INSUMOS

28/Set/2021

Brasil: fluxo de dólares está abaixo do esperado

Beneficiadas por alguns efeitos da Covid-19 sobre a economia, as exportações brasileiras, com destaque para as vendas de soja e minério de ferro para a China, estão batendo recorde em 2021, mas uma parte dos bilhões de dólares levantados pelos exportadores está ficando no exterior, indicam os dados de fluxo cambial e da balança comercial. As exportações somam US$ 260,6 bilhões no acumulado em 12 meses até agosto na balança comercial, maior valor na série histórica iniciada em 1995. O fluxo cambial em operações de exportação soma US$ 214,4 bilhões, no mesmo período. A diferença, de US$ 46,2 bilhões a mais para o registrado na balança, está no maior nível desde 1995, em recordes que vêm sendo renovados desde abril, mostra uma compilação dos dados do Ministério da Economia e do Banco Central (BC) feita pelo Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV). Os valores da balança comercial são registrados quando os produtos são embarcados para o exterior.

Já o Banco Central registra as operações de câmbio que internalizam no País o pagamento pelas exportações. O fato de os valores vendidos para fora estarem acima dos valores do fluxo cambial sugere que parte dos pagamentos aos exportadores está ficando no exterior. Múltiplos fatores podem estar por trás disso. Alguns são as diferenças de taxas de juros no Brasil e no exterior, as incertezas com a crise política e a política econômica, os rumos da reforma tributária, os efeitos da pandemia sobre a economia global e a estratégia específica de grandes empresas exportadoras, como a Petrobras. As incertezas em relação à política econômica, como o nível de desequilíbrio das contas públicas, e a crise política estão pesando mais. Desde que o Banco Central começou a subir a Selic (a taxa básica de juros, hoje em 6,25% ao ano), o câmbio deveria ter valorizado mais (ou seja, o dólar deveria ter caído). Além do diferencial de juros, há a perspectiva sobre até onde vai a taxa de câmbio.

Se a perspectiva é que o câmbio vai andar mais ainda (ou seja, o dólar vai subir), é a crise política atrapalhando. Quando a diferença entre os valores das exportações na balança comercial e do fluxo cambial começou a chamar a atenção, a Selic estava em 2,75% ao ano, após uma alta de 0,75%, em março de 2021. Mesmo com a elevação, os juros básicos vinham em 2,0% ao ano desde agosto de 2020, nas mínimas históricas. Esses níveis mínimos tornavam os investimentos em títulos de dívida brasileiros menos atrativos. Os juros no Brasil são, tradicionalmente, mais elevados do que no exterior. Assim, o mercado nacional sempre atraiu investidores de fora em busca de títulos com taxas mais rentáveis. Com a queda da Selic, caiu o “diferencial de juros”, como os economistas chamam o tanto a mais que as taxas daqui oferecem na comparação com o exterior. A questão é que, desde que a Selic passou a subir, em março, esse diferencial aumentou, se aproximando do padrão de antes. Só que não bastou para incentivar a entrada dos dólares das exportações no País.

Para o JPMorgan, não é possível explicar a diferença de valores apenas com base em variáveis macroeconômicas, como o desequilíbrio das contas públicas, a taxa de câmbio, o ritmo de crescimento econômico, ou a incerteza. As incertezas podem ajudar, mas as diferenças recordes podem estar ligadas a decisões microeconômicas das empresas. Provavelmente, algumas empresas continuam um ciclo, visto desde 2019, de antecipar pagamento de dívida externa. As empresas exportadoras acabam deixando os recursos no exterior e já fazem um encontro de contas lá fora (pagando dívidas em dólar). A Petrobras é frequentemente citada como exemplo. Em 2020, conforme dados divulgados ao mercado, as exportações líquidas de petróleo e derivados saltaram 95% ante 2019. No segundo trimestre deste ano, a receita com exportações foi de R$ 33,6 bilhões, 47,2% superior ao registrado no primeiro trimestre.

Ao mesmo tempo, para superar a crise financeira deflagrada pela Operação Lava Jato e pelas perdas com o controle dos preços de combustíveis, desde 2016, as gestões da petroleira vêm focando na redução da dívida, com pagamentos antecipados. A meta é chegar a US$ 60 bilhões de dívida bruta. No segundo trimestre, o valor ficou em US$ 63,7 bilhões, US$ 27,5 bilhões abaixo do segundo trimestre de 2020. Segundo a Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), as incertezas em torno da reforma tributária também podem estar levando grandes exportadores a deixar parte dos dólares lá fora. A opção da Câmara dos Deputados em ir adiante com mudanças no Imposto de Renda, deixando de lado propostas de emenda à Constituição (PEC) mais amplas que já tramitavam, não tem sido bem-vista pelo empresariado. Há insegurança, porque a mudança no Imposto de Renda pode tributar o lucro no exterior, o que desestimula o exportador a trazer o dinheiro para o Brasil. Como consequência, a demora na internalização dos dólares das exportações traz uma pressão a mais para a elevação da taxa de câmbio.

Embora a percepção de risco por parte dos agentes do mercado financeiro pese mais, um fluxo maior da moeda norte-americana para o País tenderia a baixar as cotações, trazendo algum alívio para a inflação. Para Pedro Rossi, professor da Unicamp e autor do livro “Taxa de câmbio e política cambial no Brasil” (Ed. FGV), a opção por deixar dólares no exterior pode ter contribuído para o câmbio pressionado, mas não é determinante. O giro financeiro é muito maior e o câmbio segue sendo determinado pelos derivativos (títulos negociados no mercado financeiro que usam a taxa de câmbio como referência), cuja movimentação é muito alta. Então, o exportador tem um peso reduzido na determinação da taxa de câmbio.

Os exportadores podem estar oferecendo mais prazo para seus clientes, ou seja, estão embarcando os produtos, mas aceitando receber mais tarde do que o usual, e podem estar recebendo em contas bancárias no exterior, deixando os dólares um tempo lá fora. Assim, os recursos podem entrar, no fluxo cambial, via conta financeira e não comercial. O Banco Central informou que não houve mudança regulatória recente que pudesse incentivar os exportadores a manter dólares no exterior. Desde 2006, os exportadores brasileiros podem manter os pagamentos recebidos em bancos no exterior. Embora esses recursos possam ser internalizados como operações financeiras, no momento do ingresso no Brasil, é mais vantajoso ao exportador, inclusive considerando aspectos de ordem tributária, que a operação de câmbio seja realizada a título de exportação, observados os prazos regulamentares. Fonte: Agência Estado. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.