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14/Set/2021

Economia e a persistência do clima de incertezas

A crise política impulsionada pelos constantes atritos do presidente Jair Bolsonaro com outros poderes contaminou a economia real de tal maneira que nem a recente trégua sinalizada pelo chefe do Executivo em carta à nação será suficiente para conter o "efeito dominó". Ao fomentar o clima beligerante, o presidente ampliou a desvalorização do Real frente ao dólar, encarecendo produtos como alimentos e combustíveis, e colocou no radar de economistas a perspectiva de juros mais elevados e crescimento mais tímido em 2022. A turbulência política se soma a outras crises: fiscal, sanitária, energética e até de abastecimento, devido à paralisação de caminhoneiros e à falta de alguns insumos provocada pela pandemia de Covid-19. Do lado das soluções, governo e Congresso patinam no marasmo e ainda não apontaram uma solução para viabilizar o Orçamento de 2022, hoje um dos principais focos de incerteza.

Ninguém sabe ainda qual será o real tamanho do Auxílio Brasil, sucessor do Bolsa Família, e quanto da fatura de R$ 89,1 bilhões em dívidas judiciais (precatórios) será paga de fato no ano que vem. Sem ter como "fazer a conta", os investidores colocam na ponta do lápis um "prêmio de risco" para topar colocar seu dinheiro no País, levando a uma alta nos juros futuros. Um juro elevado esfria a economia e prejudica o crédito e a volta do emprego. A incerteza também se reflete na cotação do dólar. Depois das manifestações de 7 de setembro, a moeda norte-americana chegou a valer R$ 5,32 no mercado à vista, mas foi abaixo de R$ 5,20 quando foi divulgada a declaração mais amistosa de Bolsonaro. No entanto, na sexta-feira (10/09), o câmbio voltou a subir e fechou em R$ 5,26, diante das desconfianças sobre a duração da trégua. A subida do dólar, por sua vez, acelera a inflação.

Para a Fundação Getúlio Vargas (FGV), o dólar deveria estar abaixo de R$ 5,00, mas a combinação de crises impede que se rompa essa barreira agora. Acima de R$ 5,00 é incerteza, e quanto mais longe disso, piora a situação. Mesmo a carta, ainda que tenha melhorado o humor da Bolsa, não vai reverter esse clima de incerteza. Porque o próprio eleitorado do Bolsonaro vai fazer pressão, quer que mantenha o discurso. Isso não permite que a incerteza diminua. O impacto da subida do dólar chega muito rapidamente na população, porque o consumo doméstico de alimentos concorre com as exportações. Embora o Brasil seja um dos maiores produtores de soja e carne do mundo, o aumento no preço desses produtos no mercado externo leva os agricultores e pecuaristas a vender para quem paga mais. Também afeta o preço dos combustíveis, que ainda sofrem o impacto do valor do petróleo nos mercados internacionais.

A economia brasileira ainda é muito indexada, isto é, a inflação de hoje serve de referência para corrigir preços nos períodos seguintes. É assim com salários, aluguéis, mensalidades escolares e até reajustes de plano de saúde. Por isso, o movimento observado em 2021 já contamina as expectativas para a inflação do ano que vem, gerando a expectativa de uma atuação mais firme do Banco Central, ou seja, um juro ainda maior. Há também o efeito contaminação. Pelo menos metade da inflação de 2021 está sendo determinada por componentes energéticos: energia elétrica, gás encanado ou em botijão, gasolina, diesel e etanol. Muitos são puxados pelo dólar, mas também, no caso da eletricidade, pela crise hídrica que ameaça o abastecimento e levou o governo, criticado por sua atuação diante do problema, a instituir uma cobrança adicional pelo risco de escassez. Só que esses itens são insumos de outros produtos ou serviços.

Para o Credit Suisse Brasil, o superávit comercial brasileiro e a abundância de recursos nas mãos de investidores internacionais deveriam jogar a favor do País, mas não é o que se observa. A curva de juros continua muito pressionada e o câmbio poderia estar muito melhor pelos fundamentos de balança comercial, pelas commodities (produtos básicos, como alimentos e minério de ferro) e o ambiente global muito líquido. Toda essa incerteza atrapalha também o controle das expectativas, o que tem afetado a própria inflação. Essas tensões que elevam o prêmio de risco do Brasil vão chegar à economia real via crédito, porque a taxa de juros de longo prazo está bastante pressionada, acima de dois dígitos para 2025. Para uma trégua nesse ambiente, seria recomendável a votação da PEC dos precatórios, com parcelamentos das dívidas judiciais, e a definição do novo Bolsa Família, de forma a reduzir as incertezas sobre as contas públicas do País. Mas, nenhum fator de alívio durará muito tempo.

É por isso que não deve haver uma melhora significativa do clima de tensão. Assim, a inflação vai continuar muito pressionada e a atividade econômica tende a ficar muito fraca porque o País está entrando num ano eleitoral muito complicado. Com as seguidas revisões das projeções para um patamar em torno de 1,5%, os economistas já falam até mesmo na possibilidade de queda do Produto Interno Bruto (PIB) em 2022 e aceleram estimativas para inflação, o que pode forçar o Banco Central a pesar a mão nos juros, afetando ainda mais a economia. Um racionamento de energia devido ao agravamento da crise hídrica, por sua vez, pode levar a um resultado negativo de PIB no ano que vem. Para a XP Investimentos, a incerteza fiscal com o que pode sair da votação do Orçamento vai direto para as taxas de juros futuras, afetando as condições de financiamento das empresas e as perspectivas de crescimento da economia.

As empresas naturalmente, quando vai chegando perto do período eleitoral, “pisam no freio”. O problema é que esse movimento chegou bem antes. O que seria de esperar é que essa volatilidade acontecesse quatro, cinco meses e não um ano antes. É tempo demais para um ambiente tensionado. Esse ambiente instável com as declarações do presidente vai continuar. A consequência é percepção de que haverá um longo período de tensionamento que pesa sobre as perspectivas da economia real. Para a Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), uma saída para esse acúmulo de problemas não é trivial porque o ambiente é de "bagunça" com o governo sem conseguir oferecer um plano fiscal. Se existe um consenso entre os economistas é que o governo não consegue oferecer um planejamento. Fica todo mundo apegado ao teto de gastos, que está cada vez menos crível.

Como não estão colocadas na mesa uma mudança na política de preços da Petrobras e nem de estoques reguladores de alimentos, para ajudar no controle da inflação, o Banco Central vai ter que carregar na oferta de leilões de swap cambial (tipo de contrato ligado ao câmbio) para conter a depreciação do Real. É difícil imaginar que a taxa de juros (a alta da Selic) vai fazer tudo sozinha. Na contramão do pessimismo, a Confederação Nacional de Comércio (CNC) acredita que a economia brasileira está robusta, apesar das tensões políticas. A inflação e a taxa Selic estão altas este ano devido à energia e aos preços administrados, mas o IPCA deve cair e a Selic deve ficar ao redor de 8%. São sinais de desaquecimento, mas não quer dizer que a economia vai desandar. A economia continua ancorada em seus resultados favoráveis. Fonte: Agência Estado. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.