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19/Ago/2021

Mudanças climáticas: greenflation será necessária

Expressão "importada" pelo presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, a greenflation (inflação verde em inglês) já está no radar de autoridades financeiras e economistas do Hemisfério Norte há algum tempo. A greenflation seria a consequência do aumento dos preços trazidos por uma nova forma de produção e demanda. Trata-se de uma elevação causada por regulamentação ambiental mais rígida ou de modo de consumo mais consciente e que interfere nos preços de uma gama bem ampla de serviços e bens, desde transporte marítimo e produção de papelão até a troca de vegetais "tradicionais" por orgânicos, geralmente mais caros. O termo foi abordado nas três últimas apresentações do banco Central com gráficos considerados assertivos por analistas do mercado financeiro. Há os casos das cadeias de alumínio e madeira, que, para se tornarem mais sustentáveis, estão sujeitas a uma elevação de custos. A agenda de sustentabilidade tem implicações econômicas.

Recentemente, a gestora de investimentos PIMCO ressaltou que, além das questões mais duras em relação ao meio ambiente, há também um movimento de pressão sobre os preços advindo do fechamento de atividades consideradas ultrapassadas em todo o mundo, com destaque para as fundições chinesas, altamente poluentes. Picos de preço relacionados ao tema já vinham surgindo nos últimos anos, mas com a implantação cada vez mais frequente de ESG (meio ambiente, área social e governança) pelas empresas e a determinação dos investidores de todo o mundo em buscar ativos limpos levam a crer que a greenflation já é uma tendência. Tudo isso ocorre em um ambiente em que a maior parte dos principais bancos centrais do globo, inclusive o brasileiro, insistem que a inflação atual é transitória. Alguns especialistas apontam que a alta atual dos preços está ligada a problemas de oferta e demanda que surgiram como uma consequência da pandemia de coronavírus.

Campos Neto desconfia que não seja bem assim. De qualquer forma, este é um assunto do momento. Analistas do BofA escreveram em um relatório que mediu as referências da palavra "inflação" durante a divulgação do balanço das companhias que compõem os índices americano S&P 500 e europeu STOXX 600: um estrondoso aumento de 1.000% no primeiro caso e de 400%, no segundo. A Panamby Capital Gestora de Recursos ressaltou que não há dúvidas no mercado de que a produção sustentável é mais cara, que existe um custo nessa agenda sustentável, e que a aplicação de ESG pelas empresas está aumentando a demanda nos países mais ricos. Apesar de atrasados no combate às mudanças climáticas, vai demorar para que o efeito sobre inflação se dilua. A convivência com o greenflation vai perdurar por muito tempo. Por exemplo, muitas das metas de redução de carbono pelos países vão até 2040.

A equipe do Morgan Stanley calculou que os preços das licenças de emissão de carbono mais do que dobraram em 2021, o que teria sido a causa do aumento dos preços da eletricidade no varejo na zona do euro em 8% até junho, uma adição de 23 pontos-base para a inflação. Em janeiro, o banco já trazia o assunto para seus clientes. Regras fiscais mais flexíveis ou ação convencional do Banco Central Europeu (BCE) para reflacionar a Europa são menos prováveis, mas há um potencial de 40 pontos-base de uma Alemanha mais verde e do New Deal Verde. São quatro os principais pilares apontados pelo Morgan Stanley para o continente europeu. O primeiro são ajustes na estrutura fiscal para permitir empréstimos adicionais para investir em projetos verdes. O segundo, a ação do BCE para incentivar a atividade verde. O terceiro, uma mudança verde na política da Alemanha, que poderia abrir a porta para um aumento de 1% do Produto Interno Bruto (PIB) do país em investimentos verdes.

Já o quarto seria o uso de garantias governamentais, um mecanismo de financiamento fundamental no Green New Deal, para acelerar a expansão de projetos verdes, agora que as novas energias renováveis são amplamente competitivas em termos de custos com os combustíveis fósseis. Ainda em fase inicial, a transição para um futuro mais verde deve ser mais prolongada do que foram os impactos da pandemia de Covid-19 e dessa forma, a greenflation pode ser vista como um "mal necessário". Principalmente depois do último e alarmante aviso da Organização das Nações Unidas (ONU) de que o aquecimento global está saindo do controle. Do lado positivo, as ações que começam a pressionar a inflação geram investimentos, que, por sua vez, criam riqueza para os países. Outro ponto é que atrasos em ações para tentar mitigar as mudanças climáticas podem sair mais caros, Há seis anos, o Fórum Econômico Mundial de Davos tentou medir o impacto desse adiamento com base em 16 estudos.

De acordo com o trabalho, o custo de atingir uma determinada meta ambiental aumentaria em cerca de 40% por década. Outro ponto indicado foi o de que um atraso que resulta em um aquecimento de 3ºC acima dos níveis pré-industriais, o que poderia aumentar os danos econômicos em aproximadamente 0,9% da produção global anualmente. A inflação pode até ser nova, mas é a antiga a forma com que se dilui na cadeia de produção e consumo: o aumento dos custos vai direto para as planilhas das empresas e, na maioria das vezes, acaba sendo repassado ao consumidor. A Royal London Asset Management lembrou que essa elevação significa prejuízo que recai sobre as margens das empresas ou, quando repassada, inflação ao consumidor. Por isso, há muitos profissionais que acreditam num rearranjo de valor das companhias no mercado de ações. Para a Panamby Capital Gestora de Recursos, independentemente de como ajam, as empresas costumam ser premiadas pela lucratividade.

Uma pressão inflacionária também surge como uma novidade, principalmente para os bancos centrais do Hemisfério Norte, que passaram boa parte das últimas décadas implantando medidas para conter a baixa dos preços. Vale lembrar que, pouco antes da pandemia de coronavírus, o grande debate nas grandes economias era sobre o temor de uma japoneisação disseminada entre os países mais ricos. Lutando para fazer a maior economia do globo reagir, o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) já se mostrou um pouco mais leniente com a alta dos preços, o que foi uma polêmica entre várias correntes de pensadores. Em um editorial, o jornal britânico Financial Times chegou a escrever que é possível que, em um mundo assim, a melhor meta para a inflação seja um pouco mais alta do que é hoje, considerando a chegada da greenflation à economia global. Há algumas semanas, o BCE também migrou para esse novo sistema de busca de uma meta na média, abolindo o arcabouço perseguido até então pelo banco europeu de entregar taxas menores no curto prazo.

Além da política monetária, também têm sido vistas alterações nos gastos públicos. O que está em debate é que o mundo está entrando numa agenda verde, então há uma série de impulsos, e a política fiscal também está com esse foco. O próprio combate à Covid-19 fez alguns governos sentirem a "liberdade" de fazer política fiscal "sem censura". Há pouco mais de um ano, os 27 países da União Europeia aprovaram um pacote de 750 bilhões de euros. Em troca, os membros tiveram que criar empregos, dar incentivo às empresas, investir em energia renovável e em tecnologia. Nos Estados Unidos, Joe Biden lançou a trilionária agenda Build Back Better que vai na mesma direção. Se der certo, é uma ideia fantástica. Não há dúvidas de que o planeta passa por um período de urgência climática. Vai ficar mais caro, mas a situação realmente é drástica, e não há mais tempo. Fonte: Agência Estado. Adaptado por Cogo Inteligência em Agronegócio.