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30/Jul/2021

Plano ABC+ e a relevância do crédito sustentável

No anúncio do Plano Safra 2021/2022, no dia 22 de junho, os recursos para financiamento do Programa para Redução de Emissão de Gases de Efeito Estufa na Agricultura (Programa ABC) saltaram para R$ 5,05 bilhões, um aumento de 102% em relação aos recursos disponibilizados na safra passada. Recursos para os programas Inovagro e Moderagro também foram ampliados, bem como incentivos para irrigação, produção de bioinsumos e práticas conservacionistas, o que indica a priorização pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) com o objetivo de alavancar o desenvolvimento sustentável da agropecuária. Nos últimos 10 anos, a implementação das tecnologias que compõem a política de agropecuária de baixa intensidade de emissões, como é o caso de recuperação de pastagens, integração lavoura, pecuária e florestas (ILPF), plantio direto, tratamento de dejetos, dentre outras, teve papel central para promover inovação no campo.

De acordo com o Ministério da Agricultura e a Universidade Federal de Goiás, somente a recuperação de pastagens alcançou 26,8 milhões de hectares entre 2010 e 2018. De acordo com estimativas da Agroicone, cerca de 45% do financiamento foi feito com recursos do Plano Safra e o restante com recursos dos produtores ou de financiamentos fora da política agrícola. Esse quadro sugere, de um lado, aperfeiçoar o financiamento público e, de outro, estimular o financiamento privado de práticas e tecnologias que gerem externalidades positivas. Nessa linha, no anúncio do Plano Setorial para Adaptação à Mudança do Clima e Baixa Emissão de Carbono na Agropecuária 2021-2030 (ABC+), em abril, a ministra Tereza Cristina mencionou que a adaptação dos sistemas produtivos, integrada à adequação ao Código Florestal, gestão integrada da paisagem e redução da intensidade de emissões serão pilares centrais da nova versão da política.

Em agosto deverá ser lançada consulta pública do ABC+ para aprovação antes da COP26, a Convenção do Clima que acontecerá em novembro de 2021. O Plano Safra continuará a ter papel importante para incentivar a adoção das tecnologias e práticas do ABC+, especialmente para médios produtores (foco do Programa ABC), que demandam investimentos em tecnologias e assistência técnica. No entanto, criar formas de financiar e estimular a implementação das tecnologias e práticas do ABC+ é um dos desafios para potencializar inovação e uma onda de investimentos na agropecuária, alinhada a atributos ambientais cada vez mais relevantes quando se trata da produção sustentável. O financiamento privado poderá ter no Plano ABC+ um conjunto de tecnologias e práticas verdes, que favorecem reduzir a intensidade de emissões de GEE e/ou promovem a adaptação dos sistemas produtivos, temas centrais da agenda climática.

Com a profusão dos investimentos sustentáveis, representados pelo acrônimo ASG (ambiental, social e governança), o mercado financeiro define critérios que podem lastrear a emissão de títulos ou a criação de fundos de investimento que viabilizem negócios sustentáveis. A integração lavoura, pecuária e florestas (ILPF) é um exemplo concreto de prática de baixa intensidade de emissões somada à adaptação, que pode ser impulsionada por meio de finanças sustentáveis. A Sustainable Agriculture Finance Facility (SAFF) oferece cinco linhas de crédito com prazos adaptados para diferentes estágios de implementação da ILPF, que atendem o perfil de risco e fluxo de caixa dos sistemas. O projeto inicial abrange 90 mil hectares e US$ 68 milhões, com previsão de chegar a 500 mil hectares com mais de US$ 380 milhões. São diferenciais desse investimento a definição de critérios específicos para a adoção da ILPF, a avaliação contínua dos resultados e a captação de indicadores que permitem monitorar o alcance dos objetivos propostos, a fim de aumentar a produtividade da pecuária em 3 vezes.

Em 2020, o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG) lançou o "Framework de Emissão de Títulos Sustentáveis", que visa orientar e estimular projetos que reduzam ao menos 20% de emissões ao ano, bem como projetos de irrigação por gotejamento ou agricultura de precisão que permitam reduzir o consumo de água em no mínimo 15%, abrangendo sistema de plantio direto, fixação biológica de nitrogênio, sistemas agroflorestais, ILPF, gestão de resíduos e biodigestores, produção orgânica e manejo florestal sustentável. Uma cooperativa que crie um projeto para recuperar pastagens degradadas, incrementar o sistema de plantio direto, plantar eucalipto como fonte de biomassa e ainda investir em energia fotovoltaica poderá, por exemplo, captar recursos no mercado financeiro tendo a redução de emissões e a adaptação como ativos sustentáveis? Pode agregar a adequação ao Código Florestal como um fator adicional ao projeto, bem como um componente de assistência técnica para levar tecnologia e conhecimento para seus produtores?

Ao promover práticas que entregam mitigação e adaptação na agropecuária, o ABC+ estará em sintonia com os desafios trazidos pelas mudanças do clima e, como consequência, alinhado às demandas ambientais que cada dia mais movimentam o universo das finanças sustentáveis. Em um momento no qual países, fundos de investimentos, instituições financeiras, empresas e o mercado financeiro demandam alocar recursos lastreados em atributos ambientais, a criação do ABC+ pelo Mapa pode sinalizar qual é o direcionamento da política que visa estimular a agropecuária sustentável. Uma política alinhada com grandes objetivos globais como o Acordo de Paris e a promoção de sistemas alimentares que permitam alcançar a segurança alimentar por meio da agropecuária resiliente. O Plano ABC+ deve consolidar-se como uma política estratégica para promover inovações direcionadas à agropecuária resiliente. Associar investimentos sustentáveis à nova fase do ABC pode abrir oportunidades para fomentar financiamentos privados e permitir maior escala para tecnologias e práticas que são fundamentais para o desenvolvimento da agropecuária. Fonte: Rodrigo Lima. Agência Estado.